
O frio e o vento em Curitiba têm incentivado vários moradores a fechar um dos principais elementos da fachada de um condomínio: a sacada. Dentro dos prédios as opiniões sobre fechar ou não se dividem, mas conciliar essas decisões não é o único obstáculo dessa ação. O fechamento de sacadas exige autorização da prefeitura, do arquiteto responsável pelo projeto do condomínio, além de uma avaliação estrutural do espaço para ver se a sacada aguenta o peso de novos elementos, como o de uma esquadria.
No condomínio Hyde Park, no bairro Cristo Rei, em Curitiba, menos de dez dos 118 apartamentos do condomínio fecharam as sacadas com vidro. A possibilidade de fechar o espaço surgiu há cerca de sete anos quando alguns condôminos manifestaram a vontade. "Consultamos um engenheiro para averiguar a estrutura das sacadas do prédio e ver se o fechamento traria qualquer prejuízo nesse sentido. Depois, em assembléia, definimos um padrão, que combinasse com a fachada do prédio", lembra a síndica Cláudia Toni Piazza.
Sua irmã, a corretora Helena Piazza, foi uma das primeiras a fechar. "Fechei a minha sacada por causa do frio e também do vento forte, que atrapalha mesmo em dias de verão em Curitiba. Com isso transformei o espaço em um lugar zen, para relaxar."
No Hyde Park não houve nenhuma briga por causa do assunto. Já em outro condomínio do bairro São Lourenço, Conjunto Residencial Nova Primavera II, foi diferente. Segundo a síndica, Maria da Graça Prendin, há quatro anos um dos moradores resolveu cobrir, por conta, toda a sacada. Os outros condôminos não concordaram e pediram para que ele retirasse. "De início ele não quis e fui obrigada a lançar mão da multa administrativa, de meio salário mínimo, prevista na convenção do condomínio para qualquer mudança na fachada não autorizada pelos moradores. A partir daí negociamos e ele acabou retirando o material e deixando a sacada novamente aberta".
Maria da Graça diz que até hoje não há consenso no condomínio sobre a possibilidade de se fechar as sacadas. "Os moradores do bloco dos fundos, onde pega menos sol, querem um padrão transparente. Já os da frente, bastante ensolarados, querem o padrão fumê, o mesmo da fachada original do prédio", explica.
Conflitos
O dono da Batel Administradora de Condomínios, Fábio Luiz Lopes, e o gerente geral da Assiscon, também administradora, Fabiano Pereira, dizem que brigas em condomínio por causa do assunto ocorrem quando um dos condôminos resolve fazer o serviço por conta, sem consultar os outros moradores. "Em pelo menos dois prédios que conheço o conflito exigiu medidas administrativas (um é o Conjunto Residencial Nova Primavera II), e em um deles foi parar na Justiça", conta Pereira.
A advogada do departamento jurídico do Sindicato da Habitação e Condomínios do Paraná (Secovi-PR), Luana do Bomfim Araujo, esclarece que, para qualquer alteração de fachada, é preciso a concordância de 100% do moradores incluindo fechar ou não as sacadas e seguir ou não um padrão. "Qualquer mudança individual acarreta em um prejuízo conjunto, modifica a fachada e desvaloriza o imóvel, e pode ser questionada pelos outros moradores."
Mudança exige alvará da prefeitura
O diretor do Departamento de Controle de Edificações da Secretaria Municipal de Urbanismo de Curitiba, Walter da Silva, informa que, inicialmente, toda reforma deve ter um alvará de licença, inclusive o fechamento de sacadas.
Ele explica, com base nos decretos municipais 212/2007 (Código de Edificações da cidade) e 692/2001, que a sacada é considerada área não computável até seis metros quadrados por apartamento, não fazendo parte do coeficiente de aproveitamento do terreno onde está a construção. "O coeficiente é o fator estabelecido para cada uso nas diversas zonas da cidade e que quando multiplicado pelo tamanho do terreno define a área máxima computável (a ser construída) no local". Para uma área de mil metros quadrados e coeficiente de 2,5, a área máxima computável seria de 2,5 mil metros quadrados.
Se uma sacada excede os seis metros quadrados ou é fechada ela passa a fazer parte da área do apartamento. Ou seja, antes de fazer o fechamento da sacada, o dono do imóvel deveria consultar um engenheiro civil ou arquiteto para que verifique se o coeficiente de aproveitamento permitido para o lote em questão foi todo usado ou não a grande maioria das construtoras já tira o máximo de proveito do coeficiente o que faz com que quase nenhuma sacada pudesse ser fechada em Curitiba.
Pelas regras da prefeitura, se após essa análise do coeficiente o fechamento for possível, o arquiteto deverá fazer um projeto de reforma e submetê-lo, junto a outros documentos, à aprovação na Prefeitura assim como qualquer outra reforma ou construção.
A averiguação de irregularidades em fechamento de sacadas é feita pela prefeitura a partir de uma denúncia. O proprietário do imóvel está sujeito a multas que variam de R$ 200 (quando não apresenta a licença durante a obra) a R$ 1.800 (quando o dono insiste na obra ou já está concluída). A SMU afirma que já houve fiscalizações desse tipo em Curitiba, mas não têm números contabilizados.
Direito autoral
Não só os condôminos devem concordar sobre o fechamento, mas também o arquiteto responsável pelo projeto do condomínio. "A maioria dos síndicos já sabe disso, mas vale ressaltar que qualquer mudança na fachada do prédio é uma alteração no projeto do profissional e, por isso, exige autorização do mesmo", alerta o arquiteto, e urbanista e coordenador da Câmara de Arquitetura do Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do Paraná (Crea-PR), Paulo Ritter. Para ele, o indicado é que o mesmo profissional seja procurado para desenvolver o padrão de fechamento de sacadas.
Caso o profissional não seja procurado para dar essa autorização, ele poderá entrar com uma ação judicial contra o condomínio por violação de seus direitos autorais o que, segundo o arquiteto e urbanista José Luiz Smolka, poderá conflitar com o direito do consumidor de alegar que a mudança é o único jeito de fazer uso do espaço. "Por isso que acredito que o melhor mesmo é que o arquiteto seja consultado antes de qualquer alteração. É uma questão de bom senso, educação", pondera.
Smolka não é totalmente contra o fechamento de sacadas. "É uma prática bastante comum e realmente útil em Curitiba que nos motiva (profissionais) a pensar em um modelo de fechamento já em fase de projeto, nesse caso para alguns empreendimentos de alto padrão, já que pela prefeitura a área fechada é computável, o que aumenta o valor do imóvel."
Hugo Peretti Neto, diretor geral da construtora Hugo Peretti, acredita que a situação atual dos condomínios, de definirem um padrão para quem quer fazer, é a ideal. "Conciliar as opiniões sobre isso é bem difícil. Muitos clientes perguntam sobre a possibilidade na compra ou entrega do imóvel, mas nós (construtora) não poderíamos entregar a sacada fechada por causa da questão da área construída: quando se fecha a sacada ela passa a computar no tamanho do imóvel, o que vai contra tudo o que já foi planejado para o empreendimento com um todo. Por isso acredito que deixar a decisão a cargo do condomínio é mais certa."
A engenheira e diretora de marketing da construtora San Remo, Aline Moritz Perussolo, não é partidária do fechamento, mas, assim como Smolka, já prevê a possibilidade de varandas fechadas (no caso espaços gourmet com vidro retrátil) para o próximo lançamento de altíssimo padrão da empresa.
O arquiteto Marcelo da Matta considera que a flexibilização das regras da prefeitura quanto ao fechamento seria bem vinda. "É uma questão de regularizar algo que já é uma prática e facilitar a elaboração de projetos com essa possibilidade, desde de que a sacada continuasse como tal, sem ser integrada totalmente à sala ou ao quarto."




