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O verdadeiro desafio está em transformar dados em conhecimento útil, e conhecimento em ação pedagógica com começo, meio e fim.

Educação baseada em Evidências

Young woman analysing charts on laptop in start up business meeting room. Multiethnic coworkers breefing team diverse people leadership. African employee listening senior manager. (Foto: Photographer: Dragos Condrea)

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Nos últimos anos, a expressão educação baseada em evidências passou a ocupar espaço em documentos oficiais, formações e painéis de gestão. Na prática, porém, ainda se confunde com o simples acúmulo de planilhas e relatórios. O verdadeiro desafio está em transformar dados em conhecimento útil, e conhecimento em ação pedagógica com começo, meio e fim.

Educar com base em evidências não é apenas medir resultados, mas interpretá-los à luz de hipóteses pedagógicas e agir sobre eles. É o oposto do improviso ou do achismo: é investigar o que realmente funciona no ensino e na aprendizagem. Avaliações e diagnósticos contínuos deixam de ser instrumentos de controle e passam a ser ferramentas de retroalimentação da prática docente.

Em uma escola orientada por evidências, os dados não vivem isolados. O diagnóstico inicial revela onde cada turma está; o acompanhamento mostra se as intervenções surtiram efeito; e as avaliações externas validam se a trajetória local caminha em direção ao desenvolvimento esperado. O que antes eram números dispersos forma uma linha narrativa coerente, que conecta decisões de sala de aula, coordenação e gestão.

Um exemplo: se o painel de BI indica baixo desempenho em “interpretação de gráficos”, é possível cruzar a informação com o histórico de habilidades correlatas, como leitura de tabelas, e planejar, junto à equipe docente, uma sequência de recomposição com atividades direcionadas e avaliações formativas. Nesse ciclo, a análise é apenas o ponto de partida; o essencial é a intervenção pedagógica que se segue.

Essa lógica se apoia em princípios consagrados por John Hattie, autor de Visible Learning (2008), cuja metanálise com mais de 800 estudos mostra que o impacto mais duradouro ocorre quando professores utilizam evidências para ajustar sua prática em tempo real, tornando o ensino um processo visível, monitorável e intencional.

Mas adotar esse modelo exige uma mudança cultural. Cada um na escola deve ter clareza sobre seu nível de leitura dos dados: gestores enxergam o panorama e as metas; coordenadores traduzem indicadores em planos de ação; professores transformam as evidências em experiências de aprendizagem. O painel de BI, nesse contexto, não é um arquivo morto, é um roteiro vivo, que orienta decisões e dá sentido ao trabalho coletivo.

Avaliações em larga escala e o valor das evidências reais

As avaliações em larga escala têm papel decisivo na consolidação dessa cultura orientada por evidências. No Brasil, o Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB), criado em 1993, monitora o desempenho dos estudantes e os fatores associados aos resultados, representando um dos maiores esforços nacionais de coleta e análise de dados educacionais.

Entre suas avaliações, destaca-se a Prova Brasil, que, segundo Bonamino e Souza (2012), buscou retratar as realidades municipais e induzir políticas de melhoria do ensino. Os autores, contudo, alertam para o risco de uma leitura reducionista quando o Ideb, indicador derivado do SAEB, é usado como única métrica de qualidade, sem considerar os contextos socioeconômicos e institucionais que afetam o desempenho dos estudantes.

Essa crítica permanece atual: dados não transformam a realidade por si sós. É preciso articulá-los às avaliações internas, permitindo que cada escola traduza as evidências nacionais em diagnósticos locais e planos de ação efetivos.

Na Rede SESI de Educação, essa articulação ocorre por meio do Programa PASSE (Programa de Avaliação Sistêmica SESI de Educação), que combina avaliações formativas e somativas para apoiar o desenvolvimento integral dos estudantes. O Avalia SESI, por exemplo, aplica avaliações em todas as etapas da educação básica, duas vezes ao ano, possibilitando um acompanhamento contínuo do progresso dos estudantes e uma análise comparativa com parâmetros nacionais.

Os Simulados SAEB, aplicados nos 2º, 5º e 9º anos do ensino fundamental, e o Simulado ENEM, voltado à 3ª série do ensino médio, fornecem dados sobre o desempenho em relação às competências exigidas nos exames nacionais. Já a Avaliação Diagnóstica, aplicada no início de ciclos, como o 6º ano do fundamental e a 1ª série do médio, mapeia potencialidades e lacunas de aprendizagem, orientando estratégias de recomposição e personalização do ensino.

Mais do que medir resultados, essas iniciativas refletem o princípio da educação orientada por evidências: compreender os dados, transformá-los em conhecimento e agir com intencionalidade pedagógica. A prática avaliativa, quando integrada a processos reflexivos e colaborativos, é capaz de abrir caminhos para a aprendizagem dos estudantes.

Por fim, é fundamental reconhecer que as evidências não substituem a sensibilidade pedagógica, elas a potencializam. O olhar atento ao estudante, aliado à leitura crítica dos indicadores, é o que transforma números em narrativas de aprendizagem e resultados em oportunidades de crescimento. Em tempos de abundância de informações e escassez de foco, essa é talvez a diferença entre ensinar para medir e medir para ensinar melhor.

Referências:

BONAMINA, A; SOUZA, S. K. Três gerações de avaliação da educação básica no Brasil: interfaces com o currículo da/na escola. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 38, n. 2, p. 373-388, abr./jun. 2012.

HATTIE, J. A. C. Visible Learning: a synthesis of over 800 meta-analyses relating to achievement. London: Routledge, 2009.

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