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Máquina corta aço em uma fábrica italiana | GIOVANNI CIPRIANO/
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Máquina corta aço em uma fábrica italiana| Foto: GIOVANNI CIPRIANO/ NYT

De sua sede na Calábria, a região mais pobre e menos desenvolvida da Itália, o Gruppo Ventura examinou o mundo e descobriu uma oportunidade de crescimento com potencial lucrativo: o Irã. 

A empresa familiar instala trilhos de trem. A economia italiana estava lenta, enquanto o Irã estava prestes a se desenvolver rapidamente, tendo prometido desistir das armas nucleares em troca do alívio das sanções internacionais incapacitantes. 

O negócio que o Gruppo Ventura fechou no ano passado com um parceiro iraniano era modesto, mas as possibilidades pareciam grandes. Então, o presidente Donald Trump retirou os Estados Unidos do acordo nuclear, um golpe para empresas em toda a Europa; algumas semanas depois, não só impôs tarifas sobre o aço e o alumínio, provocando indignação entre seus aliados europeus, como ameaçou aumentar o preço do primeiro. 

No processo, o sistema político italiano garantiu o tipo de drama que gera inquietação, algo pelo qual é legitimamente famoso, gerando temores de que Europa estivesse possivelmente vulnerável a uma nova crise. 

É aí que acaba a sorte europeia... a expansão internacional do Gruppo Ventura. 

"Estávamos torcendo pela expansão do Irã, queríamos construir trilhos. Não estamos mais esperando por isso", disse o diretor financeiro do Gruppo Ventura, Alessandro Ventura. 

Do otimismo à preocupação 

Em toda a Europa, e especialmente na Itália, os últimos tempos produziram uma série de eventos desconcertantes e potencialmente dispendiosos que conspiraram para substituir o espírito de otimismo pela preocupação profunda. 

Apenas alguns meses atrás, o continente era o principal exemplo do vigor que a economia global estava ganhando após o trauma de uma recessão mundial. Mesmo a Itália, a tradicional criança problemática da Europa, estava crescendo. 

Mas a decisão de Trump de se afastar do acordo nuclear iraniano ameaça custar bilhões de dólares em vendas perdidas às empresas europeias, com alemães, italianos e franceses especialmente expostos. A volta das sanções ao Irã deve limitar o fluxo de seu petróleo aos mercados mundiais. Essa perspectiva elevou os preços dos combustíveis, impondo pressões às economias europeias. 

Em junho, Trump se recusou a poupar a Europa de suas tarifas sobre o aço e o alumínio, e então utilizou o encontro anual das grandes democracias para ampliar seu confronto com os aliados, aumentando o temor de um conflito comercial. 

O Gruppo Ventura pode ser visto como relativamente isolado contra tais choques, uma vez que o governo italiano paga por seus trilhos do serviço ferroviário, atividade essa que deve continuar. Mesmo assim, os executivos da empresa temem que o custo das vias ferroviárias suba junto com o preço do aço. 

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"Tudo ficou um pouco mais complicado", disse a presidente do Gruppo Ventura, Maria Antonietta Ventura. 

Tudo isso pesou no mais recente drama político italiano, quando o poder foi para as mãos de dois partidos populistas, o Movimento Cinco Estrelas e A Liga. Prometeram cortes de impostos e um programa de renda básica – ou seja, subsídios incondicionais para todos – sem um planejamento de como pagá-los, criando novas preocupações sobre a alarmante dívida pública. A hostilidade contra o euro, usado por 19 nações europeias, reforçou a intranquilidade em relação à moeda. 

Este trio de problemas – o petróleo mais caro, as tarifas americanas sobre o aço e a crise de confiança no governo – transformou a Itália na líder de uma mercadoria indesejada, ou seja, a preocupação. 

"Esses três vão ter um grande impacto sobre o ânimo este ano, e provavelmente vão acarretar uma desaceleração. Não é uma combinação muito boa", disse James Nixon, economista-chefe europeu da Oxford Economics, em Londres. 

Duro impacto 

Na tarde que se soube que Trump não isentaria a Europa de suas tarifas sobre os metais, Claudio Capponi dava duro para calcular o impacto. 

Ele é o diretor comercial da IRON, empresa de capital aberto que faz peças industriais. Sua fábrica fica em Assis, na província italiana central da Umbria. Até o momento em que o presidente dos EUA divulgou sua decisão, Capponi estava confiante de que o continente seria poupado. 

"A Europa é uma parceira comercial muito boa para os Estados Unidos para que o presidente Trump faça isso", disse ele. 

Bobinas gigantes de aço enviadas de usinas na França estavam espalhadas por sua fábrica. Com o som do choque do metal ecoando pela fábrica cavernosa, as máquinas cortavam o aço em formas personalizadas – braços para escavadeiras destinadas para os Estados Unidos, silos para turbinas de vento, plataformas de navios de carga. 

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Dado que a IRON é uma compradora de aço, a empresa pode se beneficiar das tarifas dos EUA. O produto europeu que era enviado para os Estados Unidos pode ficar no continente para evitar as tarifas, aumentando a oferta e baixando os preços localmente, mesmo que aumentem em grande parte do mundo. Os produtores chineses que exportam para os EUA podem desviar seu produto para a Europa, amplificando essa tendência. 

Mas Capponi não estava apostando nisso. Mesmo que pague menos pelo aço, seus clientes podem exigir preços mais baixos. De modo mais amplo, as tarifas dos EUA – justificadas pela administração Trump como defesa da segurança nacional – soaram como um golpe contra o comércio mundial. 

"Nós dependemos do acesso a um mercado global. É a incerteza que está nos deixando loucos. Estamos olhando pela janela e vendo o que acontece lá fora. Estamos preocupados com o precedente dessas tarifas, com o fato de que as forças do protecionismo estejam rolando soltas. O cenário está muito incerto", disse Capponi. 

Oportunidade perdida 

Antes da revolução de 1979 no Irã, as empresas da Itália tinham um papel importante lá, construindo um porto em Bandar Abbas, no Golfo Pérsico. Após a revolução, e antes do advento das sanções internacionais, as empresas de energia e construtoras italianas tinham uma presença significativa. 

Quando a administração Obama e os líderes de outras potências mundiais fecharam o acordo nuclear com o Irã, há três anos, a Itália viu uma chance de recuperar sua posição. O Irã era um país de 80 milhões de habitantes que precisava modernizar sua rede elétrica, seus portos, seus sistemas de transporte. 

No ano passado, a Itália exportou mais de 1,7 bilhão de euros (quase US$2 bilhões) em mercadorias para o Irã, contra 1,2 bilhão de euros em 2015, de acordo com a União Europeia. Somente a Alemanha exportou mais, enviando quase 3 bilhões de euros em bens ao Irã. 

As sanções americanas não só impedem as empresas do país de fazer negócios com o Irã, mas também ameaçam as companhias estrangeiras com o congelamento do sistema financeiro americano. Dado que o dólar americano continua a ser o meio dominante de troca global, essa perspectiva interrompeu a maioria das transações. 

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