O vazamento de uma minuta que mostra a opinião majoritária da Suprema Corte dos Estados Unidos derrubando a decisão do caso Roe vs. Wade (que legalizou o aborto no país, em 1973) provocou uma reação violenta entre a esquerda americana pró-aborto, na terça-feira (3). Protestos de abortistas furiosos foram registrados ao longo do dia, enquanto o presidente do país, Joe Biden, prometeu uma "resposta" ao que chamou de “ataque contínuo ao aborto e aos direitos reprodutivos”. No Senado, os democratas anunciaram que forçarão uma votação para que os legisladores se posicionem publicamente sobre o tema. A proposta é aprovar uma lei que proteja o aborto em todo o país, extinguindo a dependência de decisões judiciais.
Mesmo sem a maioria suficiente para levar a medida adiante, o líder dos democratas no Senado, Chuck Schumer, prometeu, durante um pronunciamento, colocar a legislação em votação, ainda que simbólica. "Votaremos para proteger o direito de escolha das mulheres, e cada cidadão americano verá de que lado cada senador está", declarou o senador de Nova York.
Os democratas contam com uma maioria ínfima no Senado (metade dos senadores e o voto da vice-presidente, Kamala Harris, para resoluções em caso de empate), e a aprovação de uma legislação com essas características exigiria uma maioria mais ampla, de 60 votos.
“O Congresso deve aprovar legislação que codifica Roe vs. Wade como a lei da terra neste país AGORA. E se não houver 60 votos no Senado para fazê-lo, e não há, devemos acabar com a obstrução para aprovar com 50 votos”, defendeu pelo Twitter o senador independente Bernie Sanders.
O presidente dos Estados Unidos também convocou os cidadãos a irem às urnas nas eleições legislativas de novembro e votarem em candidatos a favor do direito ao aborto, a fim de fazer avançar no Congresso uma legislação federal que proteja essa questão da atuação dos tribunais.
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Em discurso durante uma conferência, na terça-feira, a vice-presidente norte-americana prometeu “lutar com tudo o que temos" para que o aborto não seja derrubado no país. “Como eles ousam tentar negar às mulheres seus direitos e suas liberdades?”, reagiu Harris, em depoimento reproduzido pela Associated Press.
Protestos
Em Nova York, mais de mil pessoas protestaram contra a possível anulação do direito ao aborto nos Estados Unidos pela Suprema Corte. A manifestação, liderada pela procuradora estadual, Letitia James, foi convocada por várias organizações pró-aborto e promovida nas redes sociais pela ex-secretária de Estado democrata Hilary Clinton.
A multidão carregava faixas pedindo “aborto sob demanda e sem desculpas”, além de placas caseiras, que diziam “Nunca mais”, “Aborto é saúde” e “Tire seus vetos de nossos corpos."
Na ocasião, James revelou que “entrou orgulhosamente na Planned Parenthood” e fez um aborto, quando trabalhava na prefeitura. Ela clamou contra o juiz Samuel Alito, autor da minuta vazada: "Não vou permitir que ele dite a mim ou a ninguém como usar meu corpo”.
Outras cerca de mil pessoas se reuniram em frente à Suprema Corte, em Washington, exigindo do Congresso a codificação da lei do aborto, para eliminar a dependência de jurisprudência. A senadora Elizabeth Warren, candidata às primárias democratas em 2020, fez um apaixonado discurso surpresa pela manhã diante dos manifestantes, em que lamentou pelas mulheres pobres que não poderão "pagar uma passagem de avião para os estados onde o aborto é permitido".
Na parte da tarde, discussões acaloradas e cenas tensas foram registradas, como a de várias meninas que insultaram e cobriram com seus cartazes uma idosa antiaborto, que subia correndo os degraus gritando “Não matem as crianças”.
De acordo com a Associated Press, um policial ficou ferido em Los Angeles, em uma confusão durante protestos de um grupo pró-aborto. Autoridades locais informaram que aproximadamente 250 pessoas marchavam na cidade, quando alguns manifestantes jogaram pedras e garrafas em um agente da polícia.
O chefe da polícia de Los Angeles, Michel Moore, contou que um oficial foi atingido com um bastão. Não houve notícia de prisões. Um alerta tático da polícia foi declarado em toda a cidade, após confronto na noite da terça-feira perto da Pershing Square, no centro.
“Santuário” do aborto
O governador da Califórnia, Gavin Newsom, prometeu “proteger” o direito ao aborto na Constituição estadual, antecipando-se a uma possível decisão da Suprema Corte dos Estados Unidos em sentido contrário na esfera federal. A intenção de Newson e de boa parte dos legisladores da Califórnia, um estado de maioria democrata, é aproveitar as eleições de meio de mandato, em novembro, para incluir na votação uma emenda constitucional que proteja o aborto em seu território.
"A Califórnia não ficará de braços cruzados enquanto as mulheres em toda a América são despojadas de seus direitos e o progresso pelo qual tantas lutaram é apagado", declarou Newsom, em comunicado também assinado pelos líderes da Câmara e do Senado do estado. Os progressistas têm maioria suficiente em ambas as câmaras para introduzir a questão da emenda nas eleições de 8 de novembro.
A Califórnia, o território mais populoso dos EUA com 39 milhões de habitantes, é um dos estados mais permissivos em relação ao aborto, embora não esteja diretamente protegido em sua Constituição e seu regulamento esteja enquadrado em uma emenda à privacidade pessoal, introduzida em 1972. Muitas mulheres viajam ao estado para interromper a gravidez de outros territórios do país, onde foram aprovadas leis restritivas, como no Texas e no Mississippi.
Newsom já propôs outras pautas sobre o aborto em dezembro do ano passado, com o objetivo de transformar a Califórnia em um “santuário” para mulheres nos Estados Unidos que não podem ter acesso em seus estados.
(Com Agência EFE)
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