
Nova Délhi e Mumbai - Impossível escapar das favelas em Mumbai. Elas são a primeira coisa que o visitante vê no momento em que o avião se prepara para pousar no aeroporto internacional: o mar de casebres da maior favela da Ásia. Dharavi é tão famosa que hoje se transformou em sinônimo de favela na Índia, símbolo da pobreza, mas também da criatividade e do jeitinho indiano de sobreviver. As cerca de 100 mil fábricas de fundo de quintal que funcionam lá dentro geram mais de meio milhão de dólares por ano, e algumas chegam até a exportar seus produtos para países vizinhos. Não foi à toa que Quem quer ser um milionário? (Slumdog millionaire), vencedor de oito Oscars, foi filmado em Dharavi.
Vijay Shankar, 46 anos, faxineiro do governo municipal por 25 anos, é um dos oito milhões de favelados de Mumbai. Vijay mora espremido com 12 pessoas da família em um casebre de um cômodo, em um corredor escuro e imundo no meio da favela. Vijay explica o malabarismo que sua família faz para sobreviver em condições tão precárias: "Aqui é sempre escuro, fedido e sujo. Com tanta gente vivendo junta, não há privacidade. Temos de deixar sempre a porta da casa aberta porque senão não dá para respirar. Quando dormimos, sempre alguém da nossa família tem de ficar acordado para ficar de olho nas ratazanas, para evitar que nos mordam, ataquem a comida ou estraguem as nossas coisas", diz Vijay, que gasta metade dos US$ 100 que ganha por mês em remédios e médicos porque sempre alguém da família está doente.
Dharavi é uma verdadeira cidade no meio da maior metrópole indiana. Mumbai tem 16 milhões de habitantes, metade dos quais vive nas numerosas favelas espalhadas pela cidade, como Garibnagar, no bairro de Bandra vizinha da gigante Dharavi. É lá em Garibnagar que vivem as duas crianças estrelas do filme: a menina Rubina Ali, 9 anos, e o garoto Azharuddin Mohammed Ismail, 10 anos. Os números variam, mas estima-se que quase 1 milhão de pessoas vivem e trabalham em Dharavi, com seus 175 hectares.
Dharavi é o que os indianos chamam de masala (mistura): é possível achar lá todo tipo de gente. São migrantes de toda a Índia, que falam várias línguas e dialetos, indianos de todas as castas e de diversas religiões. Daí a coexistência de pequenos templos hindus com mesquitas islâmicas no meio do aglomerado de casas.
Essa mistura religiosa é o ingrediente mais explosivo de Dharavi e das favelas indianas no geral: volta e meia há violência comunal, especialmente com ataques em massa de hindus contra muçulmanos. Há criminalidade e tráfico de drogas, mas nada que se compare ao nível gritante das favelas brasileiras.
A geografia da favela não é só dividida por religiões, mas também por comunidades profissionais. Raj Singh, 38 anos, é da terceira geração de uma família de artesãos de cerâmica que veio do estado do Guajarat para Mumbai há cem anos para tentar sair da miséria rural. Ele consegue tirar US$ 140 por mês com a venda dos objetos de cerâmica. A comunidade dos artesãos de cerâmicas é uma das mais tradicionais de Dharavi, mas há também a comunidade dos costureiros, dos lavadeiros e outros. "A vida é dura aqui. Não temos banheiros, sofremos com falta de água. Mas, apesar disso, prefiro ficar aqui a ir para um subúrbio distante", conta Raj, que é contra o projeto de redesenvolvimento de Dharavi.
Antes mesmo da fama que ganhou por ter sido palco da filmagem de Quem quer ser um milionário?, Dharavi já atraía a atenção de turistas estrangeiros. A moda do turismo de favelas chegou a Mumbai há dois anos, e Dharavi é hoje um dos ramos explorados pelas agências turísticas locais. Depois do Oscar, aumentou o número de turistas que querem checar a "Índia real".



