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Desde a década de 1990, o Catar atua como mediador em conflitos e libertações de prisioneiros, tendo intermediado negociações entre os Estados Unidos e os talibãs e no Líbano, Iêmen, na região de Darfur e no Iraque.
Entretanto, durante um período entre os anos 2010 e o início da atual década, teve sua imagem manchada por ser apoiador do terrorismo, ao abrigar o escritório político do Hamas (a quem também prestou apoio financeiro) e manter laços com outros radicais islâmicos e com o Irã.
Entretanto, desde o início da guerra entre Israel e Hamas na Faixa de Gaza, em outubro de 2023, o Catar vem tentando limpar sua imagem, ao intensificar sua atuação como mediador global.
Além de mediar, ao lado de Estados Unidos e Egito, as conversas entre Israel e os terroristas do Hamas (que levaram a dois cessar-fogo para troca de reféns israelenses por prisioneiros palestinos), o Catar marcou um gol geopolítico na semana passada com a libertação de um cidadão americano que estava detido no Afeganistão há dois anos e três meses.
Em comunicado, o secretário de Estado americano, Marco Rubio, disse que a “firme dedicação e os esforços diplomáticos” do Catar foram essenciais e que o pequeno país árabe “provou mais uma vez ser um parceiro confiável e um mediador de confiança em negociações complexas”.
A sombra do terrorismo sobre o Catar também diminuiu porque no ano passado, após muita pressão dos Estados Unidos, Doha “convidou” os líderes do Hamas que ainda viviam no país a se retirar – embora o escritório do grupo terrorista na capital catariana não tenha sido oficialmente fechado.
O Catar também tem mediado negociações de paz para acabar com o conflito entre o grupo rebelde M23, apoiado por Ruanda, e a República Democrática do Congo (RDC).
Na semana passada, o presidente ruandês, Paul Kagame, e seu homólogo congolês, Felix Tshisekedi, se encontraram com o emir do Catar, xeique Tamim bin Hamad al-Thani, em Doha.
“A clara intenção de Doha de emergir como um grande mediador global, juntamente com seu desejo implícito de expandir sua influência e prestígio, decorre de uma necessidade interna e regional de projetar dissuasão, aumentar a segurança e afirmar independência e soberania na região do Golfo [Pérsico]”, apontou num artigo Giorgio Cella, analista do think tank italiano Fundação Med-Or.
“De fato, as tensões que levaram ao isolamento do Catar (de 2017 a 2021) pela Arábia Saudita, Bahrein, Egito e Emirados Árabes Unidos devido à proximidade de Doha com certos movimentos islâmicos da Irmandade Muçulmana e especialmente com Teerã parecem ter desaparecido”, acrescentou o analista.
Entretanto, é claro que o Catar não está buscando expandir sua atuação como mediador apenas porque busca soft power: também tem interesses econômicos, como apontou Yvon Muya Cimanga, pesquisador da Escola de Estudos de Conflitos da Universidade Saint Paul, em Ottawa, no Canadá, em entrevista à agência alemã DW.
O especialista destacou que, no conflito entre o M23 e a RDC, o Catar está preocupado também porque Doha está interessada nos minerais da região dos Grandes Lagos da África e porque tem vários acordos e memorandos de intenções, que incluem comércio, aviação e agricultura, com Ruanda.
“[A mediação] pode ser explicada pela estreita relação que se acelerou nos últimos anos entre a monarquia e os dois países em conflito”, disse Muya. “A estratégia de Doha na região parece ser investimento; eles estão investindo em projetos de infraestrutura para modernizar aeroportos e portos.”
São esforços coerentes com a meta do Catar de diversificar sua economia além do petróleo e gás natural, mas resta saber se seu papel de mediador não será comprometido pelo histórico condenável de aliado do terror.







