O Vaticano divulgou ontem a primeira encíclica do Papa Bento XVI, "Deus Caritas Est" (Deus É Amor). Com o subtítulo "sobre o amor cristão", o texto começa explicando que a própria palavra "amor" foi subvertida, especialmente quando se refere ao sentimento entre homem e mulher, justamente o amor que "sobressai como o arquétipo do amor por excelência, de tal modo que, comparados com ele, à primeira vista todos os demais tipos de amor se ofuscam".
Para o presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) cardeal-arcebispo dom Geraldo Majella Agnelo, o documento leva o homem de hoje, "egoísta e consumista", a refletir como deve ser "o seu relacionamento com o próximo". Para o cardeal, a encíclica passará a ser discutida a partir de agora nas dioceses e paróquias católicas de todo o mundo, buscando aproximar o homem do conceito de amor propagado por Cristo, que é o de fazer o bem, ajudando o semelhante sem buscar compensação
O bispo auxiliar de Curitiba, dom Ladislau Biernaski, considera o tema relevante, pois o amor é uma questão fundamental da existência humana. "Basta ver que, mesmo nas sociedades desenvolvidas, que têm suas necessidades materiais satisfeitas, ainda existe uma inquietude, pois falta justamente o amor", descreve o bispo.
Bento XVI contesta as opiniões segundo as quais a Igreja se tornou adversária do amor humano, mostrando que, na verdade, ela o valorizou. Para dom Ladislau, o documento mostra otimismo em relação a um mundo caracterizado pela degradação moral. "Assim como o meio ambiente nasceu puro, foi poluído e agora há tentativas de trazê-lo de volta à pureza original, o Papa acredita que o mesmo deve acontecer com o amor humano, que hoje é deturpado e mal-usado", compara o bispo, que vê neste trecho uma continuidade em relação à preocupação de João Paulo II com as questões morais.
Caridade
Depois das reflexões filosóficas e teológicas sobre as diferenças entre os vários tipos de amor, Bento XVI parte para a prática, mostrando como o amor de Deus deve se refletir no mundo por meio da Igreja. Nesse aspecto, a caridade é fundamental, e dom Ladislau acredita que nestas diretrizes estão alguns dos trechos mais significativos da encíclica.
Bento XVI ressalta que a caridade cristã não deve estar a serviço de nenhuma ideologia, embora os cristãos possam e devam se servir da política para que esta caridade atinja a todos. "A política é um instrumento para que haja mais justiça social, mas é algo para os leigos. Padres e bispos têm outro tipo de trabalho", argumenta dom Ladislau.
Apesar de falar com entusiasmo da encíclica, o bispo auxiliar de Curitiba admite que certos trechos não são muito acessíveis para o católico leigo, sem conhecimentos filosóficos ou teológicos. "É um texto muito rico, mas que os padres e bispos deverão estudar para transmitir aos fiéis. E isso não será feito em uma homilia de missa, é algo que merece mais tempo", acredita.
Seguindo a tradição de que a primeira encíclica de um Papa dá uma idéia de seu "plano de governo", dom Ladislau acredita que os sinais mandados com a "Deus Caritas Est" são muito positivos, a começar pela data de divulgação do texto 25 de janeiro é a festa da conversão de São Paulo, o apóstolo que levou a mensagem cristã aos pagãos. "A questão do amor não interessa apenas aos católicos, mas a todo o mundo. Na Europa, celebra-se também o dia de oração pela unidade dos cristãos, e percebe-se nisso a preocupação ecumênica do Papa", explica o bispo, para quem a luta contra a pobreza, orientada pela Doutrina Social da Igreja, também é uma prioridade do pontífice.



