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Imigração

Antiga na Europa, xenofobia cresceu após onda de terrorismo

Crise econômica dos anos 80 foi o cenário das primeiras manifestações do ódio ao estrangeiro

Franceses contrários a projeto anti-imigração, de 2002: tensão vem crescendo no continente |

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Franceses contrários a projeto anti-imigração, de 2002: tensão vem crescendo no continente

A entrada em vigor neste fim de semana da lei sobre segurança da imigração, do premier Silvio Ber­­lus­­coni, pode levar a crer que o clima anti-imigração vinha crescendo na Europa para só agora explodir em atitudes xenófobas como a italiana, que criminaliza a imigração ilegal e torna obrigatório a fun­­cionários públicos denunciar os sem-registro.

A securitização da imigração – ou a redução do imigrante a ca­­so de polícia – cresce no con­­tinen­­te desde o 11 de setembro, co­­mo salienta o livro de ensaios Imigração, Integração e Segurança: América e Europa em Perspectiva Comparativa, organizado por Ariane Chebel d’Appollonia e Si­­mon Reich.

Mas estudiosos europeanistas salientam que o crescimento da xe­­nofobia remonta à década de 80. Foi quando o desemprego atingiu as primeiras levas de imigrantes, que chegaram nos anos 50 a convite da própria Europa, vindas prin­­cipalmente da África e do Oriente Médio para suprir a falta de mão de obra na reconstrução do pós-guerra. "Eles frequentemente fi­­cavam isolados entre si, nos alojamentos das fábricas. Na época, os europeus eram indiferentes a eles", diz o professor de história contemporânea da Uni­­versidade de Brasília (UnB), Este­­vão de Re­­zen­­de Martins.

Com os anos 70 vieram as duas crises do petróleo e as dificuldades econômicas. A consequência foi o surgimento do discurso xenófobo da extrema direita de que imigrantes roubam emprego, o que começa já nos anos 80. "A discriminação resultante é contra estrangeiros, não contra raça ou religião", explica Martins. Foi quando os imigrantes passaram a formar seus guetos, criando "vários países dentro de um mesmo país".

Com o fim da União Soviética, houve um fator complicador: a chegada de imigrantes do Leste Europeu à Europa Ocidental. Co­­mo nas décadas anteriores, foram em busca de emprego. "A reação é o surgimento de neonazistas", diz a professora de geopolítica do Curso Positivo, Luciana Worms.

Ela lembra que muitos imigrantes chegados nesta época eram muçulmanos (de países co­­mo Casaquistão e Turco­­me­nistão), religião que em séculos anteriores coexistiu com os europeus, mas acabou identificada com o fundamentalismo antiocidental após o 11 de Setembro de 2001.

Essa associação ficou mais crítica com o envio de tropas inglesas, alemãs, dinamarquesas, entre outras, para combater o Taleban no Afeganistão, e com a participação europeia na invasão americana ao Iraque. Surge o discurso de "vocês matam os nossos", cresce o antiamericanismo e a contrariedade a todos os países que apoiam as guerras de George W. Bush. "Muitos árabes e turcos se colocam até mesmo contra os governos de seus países por apoiarem os EUA", diz Luciana.

Revolta teen

Entre 2004 e 2005, quando ocorreram os ataques à bomba aos metrôs de Madri e Londres, respectivamente, esse sentimento de oposição se intensificou. E fi­­cou muito exposto entre 27 de ou­­tubro e 8 de novembro de 2005, quando estudantes de origem es­­trangeira incendiaram carros na periferia de Paris para protestar contra a morte de dois estudantes.

Foi quando ficou claro que o pro­­blema não são os primeiros imigrantes, que estão satisfeitos. "Mes­­mo sabendo que foram discriminados, eles não querem confusão. Mas os filhos de imigrantes clandestinos recentes sim, criam situação de conflito onde fique todo mundo constrangido e o go­­verno se veja forçado a quebrar o galho e conceder documentos", diz Mar­­tins.

A antropóloga da UnB Ana Lúcia Valente fazia um pós-doutorado na Bélgica em 1995 quando a escola do filho de 13 anos sugeriu que ele não teria competência pa­­ra passar de ano. "Ele sofreu preconceito. Dá para entender por que jovens imigrantes reagiram daquela maneira na França, de­­pois de sofrer preconceito por muito tempo", diz.

Outro ponto que alimenta a bola de neve da xenofobia é a cultura incendiária do fundamentalismo islâmico. "Há países árabes, como a Ará­­bia Saudita e parte da Argélia e do Irã que treinam imãs (autoridades religiosas do islamismo xiita) para enviá-los a comunidades europeias. O objetivo é que preguem nas mesquitas para botar fogo no circo. Eles estimulam reações violentas, manifestações brutas e desobediência a leis", diz Martins. Se­­gundo ele, a Europa já vem negando vistos a pessoas com esse perfil.

Mais recentemente, as leis de tom xenófobo colocam mais um ti­­jolo na edificação da complexidade imi­­gratória na Europa. Aparen­­temente, não darão conta de resolver os problemas que ela apresenta.

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Interatividade

As leis anti-imigração que estão surgindo na Europa dificultam a convivência entre diferentes culturas?

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