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Steve Bannon, ex-assessor de Donald Trump | JIM WATSON/AFP
Steve Bannon, ex-assessor de Donald Trump| Foto: JIM WATSON/AFP

Alerta de spoiler na Casa Branca. O ex-chefe estrategista da campanha de Donald Trump, Steve Bannon, descreveu o encontro entre o filho do presidente, Donald Jr., e um grupo de russos na Trump Tower em junho de 2016 como “traição”, em depoimento para o livro “Fire and Fury: Inside the Trump White House”, do escritor Michael Wolff, o qual será lançado na próxima semana.  

Segundo resenha do The Guardian, Bannon alertou que a investigação sobre o suposto conluio com o Kremlin vai focar em lavagem de dinheiro e ainda previu: “Eles vão acabar com Don Junior em rede nacional”. 

O livro reúne mais de 200 entrevistas com o presidente, seus aliados mais próximos e peças importantes da administração. É o livro sobre política mais esperado do ano, do qual Bannon é figura central do drama, com muitos comentários ácidos. O controverso ex-estrategista-chefe de Trump, demitido em agosto, ainda comparou a investigação do FBI sobre a influência russa na eleição de 2016 a um "furacão de categoria cinco". 

Bannon é uma espécie de guru da extrema direita americana e editor do site de notícias Breitbart, de inclinação conservadora. Ele foi um dos principais nomes da campanha de Trump e permaneceu na Casa Branca por sete meses, até ser demitido em decorrência do incômodo crescente com seus comentários sobre as manifestações supremacistas em Charlottesville, na Virgínia. 

Poucas pessoas, mesmo em Washington, haviam ouvido falar de Bannon antes dele se juntar à campanha de Trump. E porque ele gostava de manter uma imagem de si mesmo como um Svengali obscuro e nacionalista – uma imagem que a maior parte da mídia aceitou – surgiu uma série de mitos sobre Bannon e suas ideias. Aqui estão cinco deles. 

Donald Trump e seu filho Donald Trump Jr.Jabin BotsfordThe Washington Post

Mito Nº 1: Bannon odeia muçulmanos

Apesar de ter uma longa história de fazer comentários inflamatórios sobre o que ele chama de “fascismo islâmico”, e ter sido um dos arquitetos da proibição da entrada nos EUA de viajantes de seis países de maioria muçulmana, Bannon não é reflexivamente antimuçulmano. A sua filosofia nacionalista é construída com base em ideias retiradas de uma espécie de guru pessoal, René Guénon, um metafísico francês do começo do século 20 que foi criado como católico romano, adepto do ocultismo e da maçonaria, e que mais tarde se converteu muçulmano sufista e passou a seguir a charia, a legislação islâmica. Guénon é o padrinho intelectual de um movimento conhecido como Tradicionalismo, do qual muitos seguidores se converteram ao islã porque acreditavam que seria o caminho para o conhecimento esotérico perdido no ocidente (apesar de admirar Guénon, Bannon é católico tridentino). 

A filosofia de Guénon é construída com base na crença de que o mundo está em declínio desde o Iluminismo e que agora vivemos uma “idade das trevas” – um tema que Bannon reverberou e direcionou para as políticas e discursos de Trump. Como Guénon escreveu em 1924, ele desejava “restaurar no ocidente uma civilização tradicional apropriada”. Os tweets de Trump dizendo que pessoas transgênero não poderiam prestar serviço militar foram um movimento nessa direção – e um movimento apoiado por Bannon. 

Mito Nº 2: Bannon é nacionalista 

A imagem política de Bannon, assim como a de seu chefe, é algo que ele chama de nacionalismo “América em primeiro lugar” – uma espécie de populismo reforçado de extrema direita que considera a si mesmo uma oposição ao que Bannon chama de “globalismo”. Globalistas, de acordo com ele, são membros da “classe Davos”, que subordina os interesses do seu próprio país aos da elite financeira internacional. “Eu sou um nacionalista”, disse Bannon ao Hollywood Reporter pouco depois de Trump vencer as eleições. “Eu sou um nacionalista econômico. Os globalistas destruíram a classe trabalhadora americana e criaram uma classe média na Ásia. A questão agora é que os americanos devem se preocupar em não se f****em.” 

Mas Bannon é um globalista no sentido de que ele considera que a ascensão de Trump é a culminação americana de um levante populista de direita que inclui o Brexit e a ascendência de políticos e partidos nacionalistas na França, Itália e Polônia, entre outros. Claro, a filosofia tradicionalista de Bannon também inclina em uma direção globalista. Apesar do seu foco na Casa Branca ser os Estados Unidos, ele pensa em termos muito mais amplos e globais. 

Mito Nº 3: Bannon é o Rasputin de Trump 

Depois da vitória de Trump, Bannon entrou no imaginário popular como uma espécie de ventríloquo por trás de Trump, alguém que usou as suas armas de sedução para levar o presidente a realizar os seus planos. Essa ideia foi popularizada pelo meme #PresidentBannon e por uma capa da revista Times em fevereiro que mostrava a imagem de Bannon acima do título “O Grande Manipulador”. 

Mas a influência de Bannon oscilou – e ele nunca esteve totalmente no controle. Nenhum dos assessores de Trump consegue manter a mensagem do presidente por muito tempo ou impedi-lo de atacar outras pessoas no Twitter. Com certeza, Bannon não conseguiu. 

Trump se irrita com o retrato do ventríloquo e de tempos em tempos toma ações para demonstrar que Bannon não tem nem uma parcela da influência atribuída a ele. Por exemplo, em abril, Trump removeu o estrategista da Segurança Nacional e criticou-o em uma série de entrevistas. “Eu gosto de Steve, mas é necessário lembrar que ele só se envolveu na minha campanha no final”, disse Trump ao New York Post. “Eu já havia vencido todos os senadores e governadores, e eu nem conhecia Steve.” Isso não é verdade – Trump conhece Bannon há anos – mas o presidente deixou o seu argumento claro. 

Bannon conseguiu se destacar e voltar para uma posição de poder. Mas a indicação recente de Anthony Scaramucci como diretor de comunicação da Casa Branca mostra as limitações da sua influência: Bannon era contra a decisão e foi ignorado. 

Mito Nº 4: ‘Seinfield’ deixou Bannon fabulosamente rico

Quando eu fiz o primeiro perfil de Bannon para a Bloomberg Businessweek em 2015, incluí um detalhe pitoresco que ele me contou sobre a sua época em Hollywood: ele era dono de uma porcentagem da série de sucesso “Seinfield”. De acordo com a história de Bannon, ele era dono de uma firma de investimentos e ajudou a negociar a venda da Castle Rock Entertainment (que detinha os direitos de “Seinfield”) para Ted Turner. Em vez da sua taxa de consultoria, ele aceitou ações de cinco séries de TV. Uma delas era “Seinfield”. “Nós calculamos o que ganharíamos se chegasse a sindicação”, Bannon contou. “Nós erramos por um fator de cinco.” 

Depois que a história foi publicada, começaram especulações sobre o quanto mais rico Bannon teria ficado com a série, que ganhou mais de US$ 3,1 bilhões em sindicação. Como o site de notícias Wrap apontou em novembro, se Bannon tivesse 1% da série, ele teria ganhado US$ 31 milhões. Mas em um perfil de Bannon publicado em maio, Connie Bruck, do New Yorker, buscou evidências dos seus ganhos residuais de “Seinfield” e não achou nada, apontando que “nem a CBS, nem a Castle Rock ou a Warner Bros. tem qualquer registro de pagamentos a Bannon, se esses registros forem como os descritos a mim”. Bruck parecia questionar se a alegação de Bannon sequer seria verdadeira. 

Para descobrir isso, eu fui atrás de Kim Fennebresque, que era executivo chefe da SG Cowen, subsidiária do banco francês Société Générale, que comprou a firma de Bannon e passou a ser seu empregador. “Eu sei que ele tinha uma parcela de ‘Seinfield’”, contou Fennebresque. “Steve me contou isso em uma noite de 1998 ou 1999 enquanto estávamos no metrô a caminho de um jogo do Yankees.” 

Uma fonte envolvida na negociação me contou que os direitos de “Seinfield” foram passados para o Société Générale quando Bannon vendeu a sua firma, mas que ele e seu sócio ainda recebem pagamentos. O relatório de transparência de Bannon na Casa Branca mostra um rendimento do Société Générale entre US$ 50 mil e US$ 100 mil no ano passado. Outra fonte disse que era mais próximo de US$ 100 mil. Se passaram 20 anos desde a negociação, o que significa que Bannon provavelmente recebeu algo em torno de US$ 2 milhões. Isso não é pouco, mas também significa que “Seinfield” teve pouco impacto no patrimônio de Bannon, que pode ser de US$ 48 milhões, de acordo com os relatórios de transparência. 

Mito Nº 5: Bannon sabe o que está fazendo 

Depois de Bannon ter criado caos com a primeira restrição de entrada no país, David Atkins, do Washington Monthly, questionou o que ele estaria planejando e observou: “As suas ações raramente são por acaso e sempre são deliberadas”. Quando um visitante na Casa Branca tweetou uma foto de Bannon na frente de um quadro branco mostrando uma lista de tarefas da gestão, um jornalista do Guardian disse: “Seria ingênuo pensa que a grande revelação do quadro branco de Bannon foi uma gafe”. A ideia é que cada erro aparente pode ser explicado por uma grande estratégia. 

Mas para todo o seu sucesso como investidor, produtor de cinema, editor conservador e chefe de campanha, Bannon – que não tinha nenhuma experiência no governo – teve muito mais dificuldade para ter sucesso na Casa Grande. Apesar de ele receber crédito como um gênio tático em conjunturas críticas da campanha, ajudando Trump a se recuperar de crises como o vazamento das fitas de “Access Hollywood”, Bannon não mostrou essa mesma facilidade para manipular a máquina do governo. 

A restrição de entrada nos EUA que ele apoiou foi bloqueada pelos tribunais (apesar de uma versão revisada ter sido permitida parcialmente). Parece improvável que ele conseguirá o “imposto de ajuste da fronteira” que ele esperava que fosse um componente chave na reforma tributária. Nos últimos dias, o presidente da Câmara de Deputados dos EUA, Paul Ryan, e líderes do Partido Republicano anunciaram que estariam abandonando essa ideia. A estratégia de Bannon de transformar a mídia em inimigo pode estar mantendo alguns apoiadores de Trump do seu lado, mas isso não contribuiu em nada para o avanço da agenda legislativa de Trump – uma mancha na imagem do estrategista como um Maquiavel.

Redação com Reportagem de Joshua Green, especial para o Washington Post

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