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Disputa

Bolsas de luxo por US$ 50? A ofensiva da propaganda chinesa na guerra comercial com os EUA

O presidente dos EUA, Donald Trump, e o ditador da China, Xi Jinping (Foto: Kent Nishimura/Sergei Bobylev/EFE/EPA/POOL)

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A disputa comercial entre Estados Unidos e China ganhou um novo capítulo neste mês de abril, quando o presidente Donald Trump elevou as tarifas sobre produtos chineses para até 145%. Como reação, Pequim não apenas aumentou suas próprias tarifas sobre produtos americanos para até 125%, mas também lançou uma campanha de propaganda digital coordenada para atacar a política tarifária da Casa Branca. A ofensiva midiática inclui memes gerados por inteligência artificial, promoção de produtos de luxo falsificados se passando por originais a preços baixíssimo e até um vídeo oficial veiculado pelo Ministério das Relações Exteriores da China.

O primeiro conteúdo de propaganda chinesa a ganhar projeção foi um vídeo gerado por inteligência artificial que satiriza a política de reindustrialização defendida pelo presidente Trump. Na peça, americanos caricatos — incluindo trabalhadores obesos e um executivo em prantos diante de uma máquina de costura — são retratados em fábricas precárias. A cena ironiza a ideia de que, sob as tarifas impostas por Trump, os americanos seriam “forçados” a retornar a empregos industriais de baixa remuneração em condições degradantes. Segundo o Yahoo News, o vídeo foi amplamente compartilhado em plataformas chinesas controladas por Pequim e, em seguida, passou a circular em fóruns como Reddit e redes sociais ocidentais, incluindo o X e o Facebook, onde também com diversos compartilhamentos.

O sucesso do vídeo entre o público ocidental, em especial o americano, chamou a atenção de especialistas em comunicação e geopolítica. Para eles, o alcance da peça de propaganda chinesa está diretamente ligado à atual fragmentação política nos Estados Unidos, que está sendo explorada por Pequim. “Acho que os chineses entendem muito bem que a sociedade americana está bastante dividida e, neste estágio particular de polarização política, os americanos realmente não se importam com a origem da propaganda ou de onde vem o meme — estão dispostos a espalhar qualquer coisa, desde que favoreça sua própria mensagem política”, disse à revista Time Mark Cogan, especialista em estudos de paz e conflito na Universidade Kansai Gaidai, no Japão.

Na sequência dos “memes de IA”, a ofensiva chinesa passou a explorar também a insatisfação do consumidor americano, por meio da disseminação de vídeos — especialmente no TikTok, rede social controlada por Pequim — que promovem produtos de luxo claramente falsificados. Segundo apuração do jornal britânico The Independent, dezenas de vídeos mostrando influenciadores e supostos fabricantes chineses oferecendo bolsas de marcas de luxo por valores entre US$ 5 e US$ 50 começaram a circular com bastante frequência no TikTok dos EUA. Em um deles, uma vendedora chinesa chegou a afirmar que seus produtos eram feitos “nas mesmas fábricas que atendem marcas como Louis Vuitton e Hermès”. Segundo analistas ouvidos pela reportagem do The Independent, essa estratégia busca explorar a confusão gerada em torno das tarifas impostas pelo governo Trump, incentivando consumidores americanos a recorrerem a canais paralelos de compra.

As marcas citadas nos vídeos negaram qualquer vínculo com os produtos promovidos. A Louis Vuitton afirmou ao The Independent que não fabrica seus itens na China. Já a especialista Koyaana Redstar, que atua há mais de duas décadas na autenticação de bolsas de luxo, alertou em entrevista à Business Insider sobre as falsificações divulgadas nas redes sociais.

Ao comentar na entrevista sobre uma das bolsas apresentadas como sendo da marca Hermès, Redstar afirmou que “as alças estão com o formato errado, as proporções não batem e o couro é visivelmente falso”. O produto em questão era oferecido por uma vendedora chinesa no TikTok por um preço extremamente reduzido, com a alegação de que seria um produto original da grife francesa. Redstar destacou que a Hermès não fabrica seus produtos na China, mas sim em ateliês próprios na Europa, onde cada peça é confeccionada manualmente por artesãos especializados.

Recentemente, a ofensiva chinesa ganhou contornos institucionais com a divulgação do vídeo Never Kneel Down (“Nunca se ajoelhe”), publicado na terça-feira (29) pelo Ministério das Relações Exteriores da China. Segundo o New York Post, a peça — produzida com auxílio de inteligência artificial e narrada em inglês — acusa os Estados Unidos de praticar “bullying econômico” e conclama a comunidade internacional a resistir à influência americana.

Em tom dramático, a locução afirma que “ajoelhar-se diante de um valentão é como beber veneno para saciar a sede”. O vídeo intercala essa retórica com imagens simbólicas: a Estátua da Liberdade coberta por nuvens escuras, trilhos alagados do metrô de Nova York e, em contraponto, centros urbanos modernos e limpos na China. Em outro trecho, a peça declara: “Quando o resto do mundo se une em solidariedade, os EUA são apenas um pequeno barco encalhado. A China não vai recuar”. A propaganda ainda lança uma crítica direta à infraestrutura americana ao questionar: “Onde está o dinheiro da América?”

Apesar da clara ofensiva digital do regime chinês, o governo Trump tem mantido a defesa da nova política tarifária como instrumento legítimo de proteção à indústria americana e de contenção às práticas comerciais da China, consideradas por Trump como “desleais”. De acordo com a Casa Branca, que vem negociando diretamente suas novas taxas com os países afetados e tem convidado Pequim a fazer o mesmo, a intenção da nova política é estimular a produção nacional, recuperar empregos industriais e limitar a dependência de cadeias produtivas controladas por outras nações.

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