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Em vermelho, os núcleos das células; em verde, os neurônios motores se comportando como na doença | Carol Marchetto/Divulgação
Em vermelho, os núcleos das células; em verde, os neurônios motores se comportando como na doença| Foto: Carol Marchetto/Divulgação
  • Físico britânico Stephen Hawking é vítima da doença

Um grupo de cientistas nos EUA, com marcante participação brasileira, está demonstrando o imenso potencial existente nas células-tronco embrionárias para desenvolver tratamentos para doenças hoje incuráveis. E o resultado imediato é uma nova droga - possivelmente a primeira derivada de pesquisas desse tipo - que pode vir a ser esperança para pessoas que sofrem de esclerose lateral amiotrófica.

Trata-se de uma enfermidade degenerativa que mata em pouquíssimo tempo - uns poucos anos. Os que possuem a doença passam por fases crescentes de debilidade motora, conforme o sistema nervoso começa a falhar.

Os que sobrevivem por longos períodos são tidos como casos extremamente atípicos. O maior representante dessa categoria de pessoas é o físico britânico Stephen Hawking, que convive há décadas com a moléstia.

Os pesquisadores liderados por Fred Gage, no Instituto Salk, em La Jolla, na Califórnia, usaram uma estratégia que é menos divulgada, mas talvez seja a mais importante, no esquema dos estudos com células-tronco embrionárias.

O mais costumeiro é pensar nessas células - que são extremamente versáteis, capazes de se transformar em qualquer tecido do corpo - como fontes para a substituição de partes danificadas do organismo. É o conceito de terapia celular, que já começa a amadurecer com o uso de células-tronco adultas, mas ainda encontra algumas barreiras para ser aplicado às pesquisas com células embrionárias.

Mas a turma de Gage foi por um caminho diferente. Eles usaram as células-tronco embrionárias para criar, em laboratório, um modelo para a doença. Com isso, podiam verificar como exatamente a enfermidade se desenvolve, no âmbito das células.

"No nosso modelo, utilizamos as células-tronco embrionárias para fazer neurônios motores humanos. Cultivamos os neurônios juntamente com astrócitos humanos, expressando [ativando] a mutação que causa esclerose lateral amiotrófica, também chamada de ELA", relata ao G1 a brasileira Carol Marchetto, pesquisadora do Instituto Salk e primeira autora do estudo, que está publicado na última edição da revista científica "Cell StemCell".

"Nós observamos a morte de neurônios normais após a cultura em conjunto com os astrócitos mutados e mostramos que os astrócitos com ELA estão produxindo espécies reativas de oxigênio, além de fatores pró-inflamatórios", diz Marchetto. "Acreditamos que esses podem ser fatores que matam os neurônios motores."

Na prática, isso quer dizer que os cientistas conseguiram produzir um modelo de laboratório, com cultura de células, que é bastante compatível com o que acontece às vítimas da doença, dentro do corpo. A partir daí, começa a fase realmente interessante: a tentativa de encontrar drogas que ajudem a combater a doença.

As grandes novidades

Foi a primeira vez que um grupo de pesquisa conseguiu criar um modelo in vitro totalmente humano para a esclerose lateral amiotrófica. "Até então, sempre eram utilizados modelos de roedores - ratos e camundongos - para a triagem de drogas", relata Marchetto.

Essas deficiências do modelo animal atrapalharam até agora o avanço das pesquisas médicas. Muitas drogas funcionaram muito bem em camundongos, mas não tiveram efeito nenhum em testes clínicos humanos. Com isso, a única droga aprovada pela FDA [agência que regula medicamentos nos EUA] até hoje para a doença é muito pouco eficaz para humanos - aumenta a sobrevida em apenas dois meses.

"E ainda assim, é a melhor coisa que já apareceu", diz Marchetto. "O aparecimento de modelos totalmente humanos como o nosso pode vir a auxiliar na triagem de drogas para o tratamento de ELA."

A primeira esperança

Na seqüência do trabalho, os cientistas aplicaram algumas substâncias ao modelo, na tentativa de combater os efeitos da doença. Em uma das combinações escolhidas, verificaram que houve reversão na produção das malévolas espécies reativas de oxigênio. "Quando usamos um desses fatores para tratar astrócitos com ELA e subseqüentemente fazer a cultura em conjunto com os neurônios, os neurônios não morreram mais", diz a pesquisadora brasileira.

A idéia agora é testar essa substância em roedores vivos, para verificar se os efeitos se mantêm dentro do organismo. Por fim, viriam os testes clínicos com humanos. "Quanto aos testes com animais, vamos começar no mês que vem", diz Marchetto.

O fato de que a esclerose lateral amiotrófica é uma doença tão devastadora faz com que iniciar testes clínicos seja mais rápido do que em doenças cuja progressão é menos agressiva. Mesmo assim, se tudo der certo, não existe a expectativa de que o novo medicamento possa chegar ao mercado antes de três a cinco anos.

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