
Começou oficialmente na última sexta-feira a renegociação do preço da energia de Itaipu. Em encontro em Assunção, o presidente eleito do Paraguai, Fernando Lugo, entregou nas mãos do assessor especial do presidente Lula, Marco Aurélio Garcia, a pauta de reivindicações de seu governo sobre a revisão do tratado da hidrelétrica binacional. Durante a campanha eleitoral, Lugo insistiu num aumento do preço da energia vendida ao Brasil e no direito de o Paraguai vender energia a terceiros o que o tratado proíbe. Segundo a imprensa paraguaia, ambas as demandas foram apresentadas no encontro de sexta-feira.
O time que irá liderar as negociações do lado paraguaio será comandado pelo ex-embaixador do país no Líbano, Alejandro Hamed Franco, nomeado Ministro das Relações Exteriores. Sua indicação foi alvo de diversas críticas. Logo após o anúncio de seu nome, a imprensa paraguaia divulgou que Hamed Franco estava sendo investigado pela Justiça do país pela concessão irregular de vistos para libaneses durante o conflito entre Israel e Hezbollah, em 2006.
Vieram a público também informações de que Franco faria parte de uma lista de "indesejáveis" do governo norte-americano, por causa de sua suposta ligação com grupos terroristas. A embaixada dos EUA no Paraguai negou a existência da lista e se recusou a informar se Franco teve ou não seu visto negado pelo país.
Uma fonte do Itamaraty afirma que o chanceler "já deu vários sinais de apreço e agradecimento ao Brasil pela ajuda na crise do Líbano (à época, o Brasil cooperou na retirada de paraguaios do país). Mas, mesmo na política interna do Paraguai, ele é muito pouco conhecido. Não é uma figura de muita fama. É um professor universitário, moderado, especialista em Oriente Médio. Ele mesmo disse que terá que passar por uma fase de aprendizado sobre o Mercosul e a política regional."
Mas por que Lugo, que fez da renegociação do Tratado de Itaipu sua maior bandeira, escolheu para um cargo tão estratégico um homem que nada ou pouco sabe sobre o assunto? Há várias teorias na praça. Uma diz que Lugo buscou alguém com afinidade ideológica, mais de esquerda, para se contrapor aos ministros do Partido Liberal, agremiação mais à direita que dá sustenção à sua coligação, a Aliança Patriótica para a Mudança (APC, em espanhol).
Outra explicação seria de que a escolha foi apenas uma decisão apressada. Para tentar abafar sua primeira crise de governo a renúncia da historiadora Milda Rivarola do cargo de chanceler por incompatibilidade com a escolha de Carlos Mateo Balmelli para a direção-geral da parte paraguaia de Itaipu , o futuro presidente teria acatado o nome de Hamed Franco sem analisar a fundo seu histórico.
Revisão
Para o diplomata brasileiro aposentado Luiz Augusto Souto Maior, o grande desafio para o Itamaraty será convencer o governo paraguaio a rever suas demandas, hoje concentradas na revisão do preço da energia vendida ao Brasil. "Focalizar tudo no preço da energia de Itaipu coloca falsamente o Brasil na posição de explorador do Paraguai. Fazer desse problema o eixo das relações bilaterais, isso é equivocado. O esforço teria de ser para ampliar a discussão. Ver de que maneira o Paraguai poderia se beneficiar adicionalmente de uma integração de modo geral com o Brasil, não apenas pela energia de Itaipu, mas também com a ajuda para o financiamento de linhas de transmissão e outras obras deste tipo no Paraguai."
Em sua primeira entrevista coletiva após a indicação, Hamed Franco lembrou que sua experiência na guerra do Líbano o ajudará a negociar com o Brasil. Com a entrega da pauta de reivindicações na última sexta-feira, a primeira bomba já caiu em solo brasileiro. Segundo Marco Aurélio Garcia, "não é prudente divulgar o teor do texto antes da análise do governo brasileiro".
Logo mais, portanto, virá a retaliação ou a bandeira branca.



