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O candidato libertário à presidência da Argentina, Javier Milei
O candidato libertário à presidência da Argentina, Javier Milei| Foto: EFE/Juan Ignacio Roncoroni

As eleições argentinas estão marcadas para 22 de outubro, e os candidatos à Casa Rosada já apresentaram suas principais propostas de governo.

O vencedor das primárias de agosto, o economista libertário Javier Milei, da coligação A Liberdade Avança, afirmou em diversas entrevistas que suas primeiras medidas, caso eleito, envolverão as áreas da economia e política externa da Argentina.

Entre as ações projetadas pelo libertário, estão a substituição do peso argentino pelo dólar americano, o fim do Banco Central do país e a saída de acordos econômicos com governos de esquerda, com quem Milei já disse que “cortará laços”.

Um deles é a China, uma das maiores economias do mundo e a segunda maior compradora das exportações argentinas, principalmente de carne, soja e cevada.

O governo chinês também é responsável por fornecer uma linha de swap de US$ 18 bilhões (cerca de R$ 87 bilhões, na cotação atual) para o Banco Central argentino, valor que ajuda a quitar a dívida bilionária do país com o Fundo Monetário Internacional (FMI).

À revista The Economist, o presidenciável afirmou que “seu alinhamento político não permite relações com quem não respeita a liberdade, a vida e a democracia”, ao mencionar o porquê de congelar o acordo com o governo do ditador Xi Jinping, caso vença no dia 22 de outubro.

No entanto, Milei disse que não impedirá as negociações do livre mercado, portanto, empresas e produtores argentinos do setor privado continuarão a ter liberdade de fazer negócios com a China e qualquer outro país que considerem importante para seus empreendimentos.

Em entrevista à Gazeta do Povo, a especialista em mercado de commodities Paulina Lescano apresentou o atual cenário do país sul-americano e as projeções com a proposta de Milei.

Como é a relação da economia argentina com a China?

A relação entre os dois países é de cooperação em diversas áreas. Para começar, a China é o segundo maior parceiro comercial da Argentina, sendo um dos principais destinos de nossas exportações, com os 60% da carne argentina que vão para lá, também o sorgo e a cevada.

É um bom negócio, especialmente quando o governo chinês impõe tarifas antidumping à Austrália. Em 2022, o comércio bilateral com a China foi o maior da história e agora aguardamos certificações fitossanitárias para também poder exportar milho e novos produtos.

Além da agricultura, há outras iniciativas de cooperação entre os dois países?

A China tem alguns projetos de infraestrutura em nosso país, desde investimentos em hidrelétricas até a modernização de portos e fábricas do complexo da soja.

Existem ainda acordos de cooperação em tecnologia, telecomunicações e outras áreas correlacionadas. Recentemente, eles [chineses] nos informaram do interesse em financiar algumas obras de infraestrutura estratégica. Também temos um swap cambial financiado pela China, que foi renovado em junho, por um período de três anos. Então, sim, são muitas iniciativas de cooperação entre a Argentina e a China.

A agricultura é um importante setor dessa relação. Qual a atual situação do agronegócio argentino?

Hoje, o agronegócio na Argentina se encontra em uma situação crítica, devido a três questões centrais.

A primeira delas é o problema da seca, que atingiu principalmente a zona núcleo - a mais produtiva da Argentina -, sendo o ciclo de 2022/2023 um dos piores da história. Isso provocou perdas econômicas para muitos produtores.

Além do problema climático, sofremos nos últimos quatro anos uma alta pressão fiscal, que atingiu todos os produtos do setor exportável. O percentual cobrado na exportação da soja, por exemplo, ficou em torno de 31% a 33%, do milho e do trigo, em 12%. Com isso, nos últimos meses, algumas economias regionais foram perdidas ou eliminadas, mas a maior parte continua trabalhando, mesmo com essa pressão fiscal.

Uma terceira questão que prejudica os produtores é a brecha do tipo de câmbio utilizado por cada um. Em resumo, um produtor recebe pela venda de seu produto em um tipo de moeda “oficial”, contudo, a possibilidade de negociação em mais de um câmbio, como o peso e o dólar, torna inviável qualquer sistema produtivo, porque há uma grande disparidade entre seus valores.

As intervenções constantes nos mercados, como, por exemplo, por meio de diferentes cotas de exportação e alterações nas “regras do jogo”, também têm influenciado a fase ruim da agricultura argentina.

O que aconteceria com a agricultura caso as relações com a China fossem cessadas? 

Acredito que não há como rompermos relações com a segunda maior economia do mundo e um dos principais parceiros comerciais que temos. Nem mesmo os EUA conseguiram reduzir o seu comércio com a China, não conseguiram reduzir o seu déficit comercial ou o fizeram de forma limitada e pagando um preço muito elevado por isso, perdendo uma boa quota de exportação da sua soja para o Brasil.

As empresas continuarão procurando vender seus produtos para a China. É fundamental continuar a melhorar este comércio, mas visando reduzir o déficit comercial que temos e a forma de fazê-lo é aumentar ainda mais as nossas exportações, tanto em quantidade de produtos como no seu valor agregado.

O Mercosul é um bom acordo para a Argentina?

Considero que o crescimento da economia brasileira tornou as relações de força/poder entre os países do Mercosul muito díspares.

Na maioria dos casos, o Brasil negocia unilateralmente, uma vez que tem tudo para poder fazê-lo. Também vimos que, em casos de emergência, o governo brasileiro aplica exceções e importa sem tarifas de países fora do Mercosul, como quando a Argentina, como resultado de más políticas, ficou sem trigo para exportar.

Hoje, o Mercosul tem muito o que trabalhar para avançar, mas atualmente perdeu a força de bloco.

Há algum lado positivo nessa proposta de Milei de não incentivar as relações que envolvem a China?

Na decisão do Milei de não negociar com a China? Não. Qualquer proposta que fale em “limitar” e “desencorajar” essa relação comercial parece ruim, principalmente para um país como a Argentina, que deve crescer e desenvolver-se economicamente, mas que produz mais do que consome e deve exportar esses excedentes.

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