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Dilma (fora de foco) e Obama durante encontro realizado na Casa Branca em abril de 2012 | Brendan Smialowski/AFP
Dilma (fora de foco) e Obama durante encontro realizado na Casa Branca em abril de 2012| Foto: Brendan Smialowski/AFP

Opinião

Recado diplomático do Brasil é de seriedade e profissionalismo

Eduardo Saldanha, coordenador do curso de Direito da FAE.

O cenário das relações Brasil-Estados Unidos e a decisão de cancelar o encontro entre os governantes dos dois países talvez tenha sido uma acertada saída diplomática que pode ter muito mais do chanceler Luiz Alberto Figueiredo do que possa parecer.

A diplomacia exige muita paciência e para ter paciência é preciso estar com a mente e o corpo repousados e saber utilizar o tempo em seu favor, sendo talvez por isso que a prática diplomática por muitas vezes aconselha grandes sestas depois de fartos almoços e jantares, vez que aumenta consideravelmente a capacidade para resistir ao tédio ou à raiva.

O futuro das relações diplomáticas deve sobreviver aos rompantes da indignação por mais crítica que seja a situação.

O novo chanceler brasileiro é conhecido por ser um hábil e experiente negociador, principalmente quando se trata de embates com o governo dos Estados Unidos, sendo reconhecido nos bastidores do Itamaraty por sua paciência, paciência esta que tomou conta da presidente Dilma quando ela decidiu cancelar o encontro com o presidente Obama.

Certamente há um toque de Figueiredo na acertada decisão de cancelar o encontro entre a presidente Dilma e Barack Obama, pois a paciência dá um recado diplomático de seriedade e profissionalismo, sabendo-se que a oportunidade de conversa e esclarecimentos virá em breve e em um local de grande visibilidade, a Organização das Nações Unidas. A acertada decisão parte do pressuposto de que o fim da paciência pode ser a morte da diplomacia.

Reação

Adiamento da viagem ganha repercussão na imprensa internacional

O adiamento da visita que seria feita no próximo mês pela presidente Dilma Roussef aos EUA repercutiu na imprensa internacional. O anúncio foi considerado tanto "uma solução diplomática de Dilma para dar um não" a Barack Obama quanto uma resposta para dar conta da "raiva" sentida após denúncias de espionagem.

O cancelamento também foi visto como uma oportunidade para o fortalecimento da popularidade de Dilma nas eleições do ano que vem. Segundo o jornal americano The Washington Post, "Obama tentou acalmar a líder de centro-esquerda sobre as divulgações em uma conversa por telefone de 20 minutos". As explicações, no entanto, não foram consideradas suficientes.

O jornal diz que a presidente foi pressionada por militantes mais à esquerda do PT para ficar no país. "O cancelamento da viagem de Dilma a Washington é visto como politicamente conveniente, em parte porque a tecnocrata de 65 anos enfrenta uma campanha de reeleição difícil no próximo ano. A atitude renderá dividendos em uma região em que houve irritação quando os documentos [vazados por Edward Snowden] foram tornados públicos primeiramente pelo jornal O Globo, em julho", diz o jornal.

Já o New York Times diz que a "presidente do Brasil adiou sua visita de Estado aos EUA planejada para o próximo mês por causa da raiva provocada pela interceptação da Agência Nacional de Segurança (NSA) das comunicações privadas" de Dilma.

O site americano Huffington Post brincou em uma chamada de sua página de assuntos internacionais: "Adivinha quem não vem para o jantar?", é a pergunta destacada acima de uma grande foto em que Dilma aperta a mão de Obama. Para o El Pais, a atitude de Dilma foi uma solução diplomática encontrada para o governo brasileiro dar um "não" a Obama.

23 de outubro era a data para a qual estava marcada a vista de Dilma Rousseff aos Estados Unidos, cancelada em meio a denúncias de espionagem.

  • Dilma pode ter cancelado visita por influência do chanceler Luiz Alberto Figueiredo

Como os EUA não apresentaram "tempestiva apuração" da espionagem à Presidência do Brasil e à Petrobras e não se comprometeram a "cessar as atividades", Dilma Rousseff cancelou a viagem que faria a Washington em 23 de outubro. Formalmente, a ida está adiada, sem nova data.

As notas sobre o tema emitidas por Brasil e EUA são muito semelhantes e foram combinadas, mas divergem num detalhe crucial, a perspectiva de cooperação em Defesa – uma venda de caças ao Brasil era prioridade americana.

Seria uma viagem de Estado, a mais alta regalia concedida a estrangeiros. A mais recente de um brasileiro ocorreu em 1995, com Fernando Henrique Cardoso.

O cancelamento é uma resposta à revelação de que a Agência de Segurança Nacional dos EUA (NSA, na sigla em inglês) espionava alvos no governo, entre eles a própria Dilma. É a primeira retaliação concreta sofrida pelos EUA desde a revelação do esquema de espionagem pelo ex-agente de segurança Edward Snowden, em junho.

Ainda que o cancelamento tenha partido de Dilma, o texto diz que o adiamento foi tomado de comum acordo com Obama.

Já a nota da Casa Branca ressalta a relação bilateral e reconhece as preocupações do Brasil. O documento diz que Obama ordenou uma revisão nas práticas da inteligência americana, "mas o processo pode levar meses para ser concluído". "Por isso, os presidentes concordaram em adiar a visita de Estado", afirma.

Na leitura comparada dos textos está o recado do Planalto: a versão brasileira cita cooperações entre os países, mas não fala na área de Defesa, como o americano.

Até a eclosão do escândalo, em junho, a Boeing tinha tomado o lugar da francesa Dassault como favorita na bilionária licitação para o fornecimento de 36 caças ao Brasil, com o F-18. Negócio de no mínimo R$ 10 bilhões.

Grande parte do favoritismo decorria do trabalho da empresa e de Washington para melhorar os termos da venda. O recado é indicativo de que o negócio está no ar – seja para um cancelamento definitivo, seja para um adiamento na espera de melhores condições de venda.

Diferenças à parte, o teor diplomático calculado das notas foi combinado. Funcionários do Planalto e da Casa Branca trocaram suas versões dos textos e ensaiaram acordo em três pontos.

O primeiro deles foi o uso do verbo adiar. Segundo, a possibilidade de remarcação. Por fim, ambos falam na disposição de manter "relações estratégicas".

Para oposição, decisão foi "eleitoreira"

A oposição criticou ontem a decisão da presidente Dilma Rousseff de cancelar visita de Estado a Washington, no mês que vem. Lideranças do PSDB e do DEM afirmam que Dilma agiu de forma "eleitoreira" e não preservou os interesses econômicos do país.

Provável adversário da presidente nas eleições de 2014, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) disse que seria mais "adequado" à presidente reclamar diretamente com o presidente Barack Obama dos atos de espionagem. "Essa decisão não me surpreende porque é o marketing que vem governando o Brasil há algum tempo. Era a oportunidade da presidente de ter uma agenda afirmativa em defesa dos interesses do país", afirmou Aécio.

Oposicionistas dizem que Dilma foi aconselhada pelo ex-presidente Lula e pelo marqueteiro João Santana. "Ela não tem nossa solidariedade nesse gesto, inspirado por seus orientadores de marketing político no contexto de uma campanha antecipada", disse o senador Aloysio Nunes Ferreira (SP), líder do PSDB.

Presidente do DEM, o senador José Agripino Maia (RN) afirmou que o cancelamento da viagem pode provocar "ruídos", especialmente nas negociações econômicas entre os dois países.

Paciência O futuro das relações diplomáticas deve sobreviver aos rompantes da indignação por mais crítica que seja a situação.

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