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Dazia lamenta a perda de seu filho Kalden, em meio às inundações do Kalden | Ricky Carioti/Washington Post
Dazia lamenta a perda de seu filho Kalden, em meio às inundações do Kalden| Foto: Ricky Carioti/Washington Post

Quando Dazia Lee tenta trazer ordem à desordem daquela noite, o que a ajuda é pensar em números. Pensa nos horários exatos de cada decisão tomada, cada telefonema, cada notícia ruim. São pontos de referência que levam até o último momento, quando, às 10h20 da segunda-feira, ela recebeu uma ligação de um detetive do condado dizendo que o corpo do filho dela, Kaiden, de um ano, foi encontrado a 5 metros de profundidade.

A história de como tudo isto aconteceu começou na noite anterior, no domingo, às 19h02 

Durante todo o fim de semana, Lee tinha visto como a força impressionante do furacão Florence rasgava a região, matando pessoas e desencadeando chuvas devastadoras, ventos e inundações por toda a Carolina do Norte. Mas, às 19h02, tudo isto lhe pareceu excessivo. Mal chegava a chover em seu bairro no Noroeste de Charlotte, onde morava com os pais e o filho. E planejava visitar sua avó, a quem ela sentira a falta de visitar naquele final de semana, em sua casa em Wadesboro, a mais de uma hora de distância. 

Então, ela pegou seu filho e passou pela rotina de semre para se certificar de que ele estava seguro e confortável. Ela afivelou-o em um assento próprio na parte de trás de seu Hyundai Elantra. Ela colocou a garrafa de água por perto. Puxou sua camisa branca e calça azul. E ligou o ar condicionado. 

Ela saiu, indo em direção ao sul. As estradas pareciam boas e havia muitos carros nelas. Sentindo que não poderia haver nada mais normal do que isso, ela entrou nas estradas do interior e entrou no condado de Union. 

Pouco tempo depois, encontrou vários barris de laranja ao longo da rodovia 218, perto de Richardson Creek, nos subúrbios de New Salem. Os barris não bloqueavam a estrada, mas estavam em ambos os lados dela. Ela parou e pensou por um momento. Notícias diziam que algumas das estradas poderiam ser perigosas, "sem precedentes", como o Serviço Nacional de Meteorologia descrevia algumas das inundações. Até aquele momento, tudo estava bem. 

Pensando nisso, ela viu vários carros indo na direção oposta. Eles dirigiram através dos barris e passaram por ela. Deve estar tudo bem se eles conseguiram passar, ela pensou. Ela ligou o carro e verificou a hora. 

19h52 

Ela dirigiu entre os barris, descendo a colina e ao redor da curva. Foi quando ouviu o barulho da água. 

Se havia algo que Lee queria era ser uma boa mãe. Nunca esperou que fosse tão cedo. Ela estava no último ano do ensino médio quando descobriu que estava grávida e, embora soubesse que algumas pessoas poderiam ter aconselhado um aborto ou uma adoção, quis ter seu filho. 

 Assim que terminou o ensino médio, obteve seu diploma. Logo deu à luz e começou a trabalhar imediatamente. Primeiro veio um trabalho em um Dunkin 'Donuts. Então, em um depósito da FedEx. E mais tarde em um centro de distribuição da Amazon.com, onde trabalhava tanto que outros colegas de trabalho comentaram o quão forte ela era. Lee trabalhava em turnos de horas extras, sentindo-se bem por ser poder comprar as fraldas e mamadeiras de Kaiden, criando-o como mãe solteira. 

Todas as noites, voltava para casa, e levava-o em passeios ao entardecer pelo bairro, impressionando sua irmã com o tipo de mãe que tinha se se tornado. "A única coisa que ela sempre quis foi protegê-lo", disse Kaila. 

"Assim que ele saiu do útero. Cada vez que ele chorava, ela sempre era a primeira a ir. Minha mãe ou eu íamos para ver como ele estava. Ela sempre estava lá, alimentando-o.” 

"Eu o protegi de tudo e de todos", disse Lee. 

Então, no domingo, quando ela colocou Kaiden no assento do carro e saiu para as ruas que tinham acabado de ser atingidas por 150 a 200 mm de chuva, ninguém em sua família se preocupou. Lee estava lá. E ela manteria Kaiden a salvo. 

Estava quase completamente escuro quando o Elantra bateu na água e começou a aquaplanar. O carro girou várias vezes, em direção à esquerda com os pneus levantados da estrada. Por um momento, Lee não pôde pensar, seu único sentimento era medo. 

Eles estavam afundando. A água começava a entrar no carro. Ela começou a gritar: "Oh, Deus, oh meu Deus, não assim, não assim", lembrou-se ao dizer repetidas vezes. 

Sem se soltar, voltou-se para Kaiden, que não parecia apavorado nem preocupado. Seu rosto redondo mostrava apenas confusão. Ela soltou-o e começou a recolher suas coisas, mas, percebendo que não havia tempo, deixou as coisas para trás. Ela o pegou em seus braços e percebeu que as janelas já estavam quebradas. 

Então, percebeu que ainda estava com o cinto de segurança. De repente, estava lutando com a mais básica das tarefas. A água continuou a entrar no carro. Ela finalmente soltou o cinto e começou a sair, carregando Kaiden. Mas seu pé ficou preso no cinto de segurança, e ela sentiu-se mergulhar na água. 

Era algo artificial - quase como água de piscina - mas era lama e sujeira espessa e não se sabe o que mais. Ela tentou se endireitar, mas não conseguiu. Galhos de árvores estavam no rosto dela. Sua boca estava se enchendo de água. Ela não conseguia ver nada. 

Estava segurando Kaiden em seu peito. Mas agora ela estava apenas segurando seu antebraço. As águas tinham uma força surpreendente, afastando-o. Ela só segurava o pulso dele. Depois, a mão. Depois, os dedos. Então, foi embora. 

12h23 

Ela estava recebendo alta do hospital, para onde foi por causa de seus ferimentos, que eram mínimos. Um transeunte, cujo nome ela não pegou, viu o carro girar e ajudou a resgatá-la. Seus pais e irmã estavam agora com ela. Todos estavam voltando para a rodovia 218. 

Kaila ainda tinha alguma esperança. Talvez o menino tivesse sido empurrado para o lado do riacho. Talvez tivesse ficado inconsciente, e foi por isso que ele não gritou ou ouviu outros gritando por ele. Essa esperança, no entanto minúscula, desapareceu quando ela viu a inundação. 

"Tudo o que você podia ouvir era uma cachoeira", disse ela. Eles chamaram Kaiden mas não ouviram nada. Havia apenas água e escuridão. 

"Fiz tudo o que pude", disse Lee ao repórter, enxugando as lágrimas enquanto a luz do operador da câmera brilhava em seu rosto. "Desde o momento em que fiquei grávida até o momento em que o perdi. Fiz tudo o que pude para salvá-lo e protegê-lo." 

Agora só queria encontrar o corpo dele. 

Eles procuraram o corpo até às 5 da manhã, em meio às ervas daninhas e à umidade do que furacão Florence havia deixado para trás. Não conseguindo encontrar o bebê, e não sabendo mais o que fazer, ela foi ao gabinete do Xerife do condado de Union. Ela e Kaila viram as notícias da perda de Kaiden, e o que as pessoas estavam dizendo. Era muito desagradável. 

"A mãe tomou uma decisão ruim", disse um internauta no Facebook. 

"Sinto por essa criança, não pela mãe", disse outro. 

"Negligência", afirmou outro. 

Isto tornou tudo muito pior. As pessoas não sabem o quanto ela amava aquela criança e como as estradas pareciam seguras? 

Ela não conseguiu pensar em mais nada, porque o telefone estava tocando. A voz do outro lado estava dizendo: "ele se foi”. Olhou para o relógio: eram 10h20.

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