Pergunte a um jornalista e a um cardeal quais são as prioridades para o próximo papa, os temas que ele terá de enfrentar em seu pontificado, e a resposta pode ser totalmente diferente. Em reportagens, artigos de opinião e enquetes com internautas, a imprensa costuma mencionar questões como a aceitação do homossexualismo, da contracepção artificial e do aborto, a comunhão para divorciados recasados, a ordenação de mulheres e a abolição do celibato sacerdotal como "desafios" do próximo pontífice. Mas essas preocupações não poderiam estar mais distantes da cabeça dos 115 cardeais eleitores, segundo o vaticanista Andrea Tornielli. "Insistir que os cardeais mudem a doutrina católica básica é muito ridículo", afirma.
Um dos argumentos para o isolamento dos cardeais não só no conclave propriamente dito, mas também nos dias prévios, é evitar que sejam influenciados por uma pauta vinda do "mundo exterior" não condizente com a pauta que os próprios cardeais julgam ser mais importante para a Igreja. Foi tendo esse isolamento em mente que foram suspensas a pedido do Vaticano, comenta-se as entrevistas coletivas que os cardeais norte-americanos davam após cada reunião das Congregações Gerais.
Alfonso Bailly-Baillieri, que trabalhou por 18 anos no serviço oficial de informações do Vaticano, afirma que isso ocorre tanto por desconhecimento em relação ao catolicismo quanto por má vontade alguns veículos de comunicação teriam uma agenda própria que desejam impor à Igreja. Ele insiste na necessidade de separar o que é considerado uma doutrina imutável da Igreja (como a condenação ao aborto e aos atos homossexuais, ou a proibição de ordenação das mulheres) daquilo que é opinável ou relativo, ou faz parte da disciplina eclesial, como a idade limite para a aposentadoria do clero ou aspectos da liturgia, como o idioma da celebração da missa.
Tornielli também destaca que a imprensa cumpre seu papel ao examinar em detalhe a vida dos cardeais e a atuação da Cúria Romana. "Isso não significa que o povo deva esperar mudanças nos princípios dogmáticos ou morais, estabelecidos por Jesus Cristo, como o direito à vida e a definição de matrimônio como união entre um homem e uma mulher", acrescenta.
Mas, se os temas de moral sexual, ordenação feminina ou celibato não estão na pauta dos eleitores do conclave, o que está? O ponto mais destacado pelos cardeais dos mais diversos países e demais representantes da Igreja ouvidos pela Gazeta do Povo nos últimos dias é a "nova evangelização", incluindo o domínio da capacidade de comunicação e linguagem, adaptada aos novos tempos, de maneira a sensibilizar a sociedade para o cumprimento do direito entre os povos, a eliminação da pobreza e da injustiça.
Comunicação"Mídia mostra que Igreja é uma instituição global", diz professor de Navarra
Especialistas, representantes do Vaticano, estudiosos e membros do clero reforçam a necessidade de a Igreja comunicar melhor os seus princípios para evitar que os veículos de comunicação acabem informando mal seu público sobre o catolicismo inclusive sobre os temas "imutáveis". "A mídia tem demonstrado que a Igreja é uma instituição global, com grande peso na opinião pública mundial, e o papa é uma referência. Ainda que alguns não gostem daquilo que ele diz, não é possível ignorá-lo", diz Francisco Pérez-Latre, professor de Comunicação da Universidade de Navarra. Mas Andrea Tornielli identifica um excesso de informações a respeito da Igreja, facilitadas pela rapidez tecnológica, mas pouco fundamentadas, quando não totalmente falsas. "Se nós não procuramos informar bem a respeito da Igreja, quem o fará?", indaga o teólogo italiano Giulio Maspero, professor da Pontifícia Universidade da Santa Cruz, que foi entrevistado por vários jornalistas desde a renúncia de Bento XVI.



