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Fotografia cedida pela assessoria de imprensa da vice-presidente da Argentina, Cristina Fernández, na qual ela aparece em seu gabinete, durante seu pronunciamento perante a Justiça Federal, em Buenos Aires
Fotografia cedida pela assessoria de imprensa da vice-presidente da Argentina, Cristina Fernández, na qual ela aparece em seu gabinete, durante seu pronunciamento perante a Justiça Federal, em Buenos Aires| Foto: Divulgação/EFE

Na semana passada, dois acontecimentos expuseram a crise que vive a esquerda na América Latina. Cristina Kirchner, importante nome do peronismo, ex-presidente e vice-presidente da Argentina, foi condenada a seis anos de prisão e inabilitação para cargos públicos pelo crime de administração fraudulenta de fundos públicos. No Peru, o socialista Pedro Castillo foi destituído do cargo de presidente após tentar dar um golpe de Estado. Além disso, ele é alvo de seis investigações e acusado de liderar uma organização criminosa.

A vitória de Luiz Inácio Lula da Silva ampliou a pintura de vermelho do mapa da América Latina, que se tornará em janeiro uma região tomada quase que inteiramente por governos de esquerda, com exceção apenas de Haiti, Guatemala, El Salvador, Equador, Paraguai e Uruguai. A onda que começou em 2018, no México, com a eleição de Andrés Manuel López Obrador, expoente da velha guarda esquerdista, foi descendo pelos países das Américas Central e do Sul.

Em meados de novembro, representantes do Foro de São Paulo se reuniram em Caracas, na Venezuela, para falar sobre a mudança de equilíbrio de poder na região. Participaram do encontro representantes de Brasil, Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia, Cuba, Equador, El Salvador, Espanha, Palestina, Estados Unidos, Guatemala, Honduras, Itália, México, Nicarágua, Panamá, Paraguai, Peru, Porto Rico, República Dominicana e Uruguai.

Em sua conta no Twitter, o ditador venezuelano, Nicolás Maduro, expressou que o fórum representou "a esperança e a maior trincheira de luta das forças, movimentos, grupos e partidos políticos da América Latina, do Caribe e do mundo”. O Foro de São Paulo é um mecanismo de concentração dos movimentos e partidos sociais de esquerda e progressistas da América Latina e Caribe.

Apesar de ainda marcar o mapa regional, a chamada "Onda Rosa" tem sido freada por diversos acontecimentos desfavoráveis aos governos nos países socialistas, especialmente na Argentina, no Chile, na Colômbia e no Peru. Na Nicarágua. em Cuba e na Venezuela, comandadas por ditaduras, por exemplo, apesar dos escândalos divulgados por todo o mundo e de fortes cobranças por democracia dentro do país, a censura e as prisões calam os movimentos contrários a Daniel Ortega. Miguel Díaz-Canel e Nicolás Maduro.

Abaixo das expectativas

Para o economista e doutor em relações internacionais Igor Lucena, o fortalecimento da "Onda Rosa" na América Latina se deu, principalmente, no contexto da pandemia de Covid-19, em que os eleitores, de forma geral, buscaram mudanças. Os representantes eleitos, no entanto, não conseguiram dar respostas rapidamente.

"Eu tenho a visão de que essas eleições da esquerda na América Latina não se deram exatamente por uma questão ideológica. Independente de quem estivesse no poder anteriormente, a população ficaria saturada politicamente", avaliou.

Lucena ainda observou que grande parte dessa esquerda que ascendeu ao poder durante ou após a pandemia apresentou o objetivo de "resolver todos os problemas de forma imediata", o que naturalmente não aconteceu, criando uma forte desaprovação popular. No Chile, na Colômbia e no Peru, todos os presidentes atuais foram eleitos no contexto da pandemia ou pouco depois - o argentino Alberto Fernández saiu vitorioso das urnas um pouco antes, em 2019.

Argentina

A condenação de Cristina Kirchner sela a crise política e econômica pela qual passa o país. Com previsão de acabar o ano com 100% de inflação - a segunda maior do mundo desde que ultrapassou os 75% - sob o comando do peronista Fernández, a Argentina vive uma desvalorização da moeda local resultante da falta de controle fiscal e a insatisfação social começa a despontar com mais força pelo país.

Antes da condenação da ex-presidente, o promotor argentino Diego Luciani apontou que Néstor (marido falecido de Cristina e ex-presidente do país) e Cristina Kirchner criaram um "autêntico sistema de corrupção", que em muito teria contribuído para a crise econômica pela qual passa o país.

Chile

No Chile, o presidente Gabriel Boric viu uma proposta progressista de nova Constituição (elaborada por uma constituinte eleita antes dele, mas cujo texto ele apoiou) rejeitada por 61,8% da população em referendo em setembro.

Em outubro, Boric chegou aos piores números de aprovação e desaprovação desde que assumiu o cargo, em março. Segundo pesquisa do instituto Cadem, 68% desaprovavam seu trabalho à frente do Executivo chileno e apenas 26% aprovavam sua gestão.

Naquele mês, a aprovação de Boric caiu nove pontos percentuais e a reprovação cresceu oito. O Cadem apontou ainda que 71% dos chilenos consideravam que o país estava no caminho errado. Com uma inflação de 13,7% no acumulado em 12 meses, 92% achavam que a economia chilena estava estagnada ou em declínio.

 O presidente chileno, Gabriel Boric, cumprimenta o presidente colombiano, Gustavo Petro. Foto: EFE
O presidente chileno, Gabriel Boric, cumprimenta o presidente colombiano, Gustavo Petro. Foto: EFE| (EPA) EFE

Colômbia

Já o primeiro presidente de esquerda da história da Colômbia, Gustavo Petro, que tomou posse em 7 de agosto, não demorou para encarar manifestações populares contra sua gestão. Protestos contra o presidente foram realizados em mais de 20 cidades colombianas e nos Estados Unidos, México, Panamá e Suíça.

Entre os pontos que despertaram críticas da população, estavam uma reforma do Código Eleitoral, recém-aprovada no Congresso e que os organizadores das manifestações alegam que poderá servir de base para perseguição a partidos e movimentos políticos, a substituição de dezenas de militares de alta patente e a retomada das relações com a Venezuela.

Além disso, existe a desconfiança histórica que os colombianos têm da esquerda, devido à guerra civil iniciada nos anos 1960 pela atuação de grupos armados: Petro é ex-guerrilheiro.

O ex-presidente argentino Mauricio Macri (2015-2019) orientou Gustavo Petro que não se baseie em políticas populistas implementadas há décadas na Argentina porque, segundo ele, levam à pobreza. "Esperamos que Petro compreenda que as ideias (populistas) argentinas trarão muita pobreza aos colombianos", disse Macri em entrevista coletiva em Miami.

Peru

Antes do presidente destituído Pedro Castillo tentar um golpe de Estado no Peru e ser preso, ele já era alvo de seis investigações sobre o uso presidência para se beneficiar e havia sobrevivido a duas tentativas de impeachment.

Castillo foi acusado de ser aliado de membros da polêmica organização Movadef, indicada pela polícia como braço político do grupo de guerrilha peruano.

O esquerdista (agora destituído) assumiu como presidente do Peru em julho de 2021. Antes disso, foi líder sindical, ganhando destaque nacional em 2017 após liderar uma greve de professores por aumento salarial que durou quase três meses. Castillo se definiu durante sua campanha como um lutador social e disse nas eleições que terminaria os conflitos sociais. O secretário-geral do Peru Livre havia dito anteriormente que ele representava a posição mais antiga da esquerda peruana.



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