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A Autoridade de Antiguidades de Israel (IAA) anunciou a descoberta de um fragmento de cerâmica que contém uma inscrição com um aviso de imposto, em Jerusalém, no mês passado, próximo ao Monte do Templo. A rara evidência tem uma importância histórica imensurável, e os especialistas acreditam que ela tenha sido escrita durante o reinado do rei da Assíria e endereçado ao rei de Judá, há mais de 2.600 anos.
O objeto, escrito em acadiana – antiga língua semítica, falada na Mesopotâmia por assírios e babilônios –, foi encontrado durante escavações na área do Muro das Lamentações, no Parque Arqueológico de Davidson. O objeto é considerado a primeira inscrição assíria já encontrada na cidade.
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Fragmento da cobrança de imposto é citado na Bíblia
No achado, o texto menciona o atraso no pagamento de um tributo, citando o “primeiro dia do mês de Av” – referência do calendário da Mesopotamia, ainda usado atualmente no calendário hebraico. No calendário judaico, usado em Israel, o mês de Av cai, normalmente, entre julho e agosto.
Na inscrição também consta o título de um oficial assírio alcunhado de “portador das rédeas”, cargo de alta patente dado ao responsável pela comunicação entre a corte do Império e os reinos subordinados.
Ao jornal The Israel Times, Peter Zilberg, assiriólogo da Universidade Bar-Ilan, confirmou as suspeitas iniciais de que “o artefato é provavelmente um aviso de imposto enviado do imperador assírio ao rei de Judá”.
Segundo os especialistas, o objeto é datado entre o final do século 8 a.C. e meados do século 7 a.C., época turbulenta, marcada pela revolta do rei Ezequias contra o domínio do rei assírio Senaqueribe.
O episódio chegou a ser citado na Bíblia, no segundo Livro dos Reis (18:13-14), narrando um pagamento forçado após a invasão assíria de Judá.
“Então Ezequias, rei de Judá, enviou ao rei da Assíria, a Laquis, dizendo: Pequei; retira-te de mim; tudo o que me impuseres suportarei. Então o rei da Assíria impôs a Ezequias, rei de Judá, trezentos talentos de prata e trinta talentos de ouro.”
Mesmo que o achado não contenha um nome de destinatário, as evidências cronológicas apontam para os reinados de Ezequias, Manassés ou Josias.
“Este pequeno fragmento abre uma janela inédita para as relações diplomáticas e fiscais entre Jerusalém e o império mais poderoso de seu tempo”, pontuou a arqueóloga Ayala Silberstein, diretora da escavação pela IAA.
Fragmento da cobrança foi descoberto sem querer
O objeto histórico, encontrado por Moria Cohen, responsável pelas escavações no Parque Nacional Emek Tzurim, foi descoberto de maneira inesperada.
“Eu estava peneirando a terra quando vi um pedaço de cerâmica com um padrão estranho. Ao perceber que era escrita cuneiforme, comecei a gritar de empolgação. Saber que fui a primeira pessoa a tocar esse fragmento em 2.700 anos é indescritível”.
O solo que estava sendo analisado era de uma estrutura colapsada do Período do Primeiro Templo (séculos 8 a.C. e 7 a.C.), antes de ser coberta pelas construções do Segundo Templo. Essa é uma das localizações mais próximas já escavadas do Monte do Templo – e reforça a oficialidade do achado.

“Isso confirma que a mensagem foi enviada de uma capital assíria, e não produzida em Jerusalém”, explicou a especialista, após exames constatarem que o fragmento de cerâmica não é de origem local.
O objeto provém da bacia do rio Tigre, região onde ficavam localizados os centros da Assíria, como Nínive, Assur e Nimrud.
“Estamos diante de um documento oficial que viajou centenas de quilômetros, possivelmente contendo ordens fiscais diretas do palácio imperial”, completou Cohen.
A equipe responsável por achar o objeto de mais de 2 mil anos atrás reforça que este é, até o momento, o único registro assírio da época do Primeiro Templo encontrado em Jerusalém.
“Sabíamos, por textos descobertos na Assíria, que emissários de Judá visitavam a corte imperial. Mas esta é a primeira prova concreta de comunicação no sentido inverso, da Assíria para Jerusalém”, disse Zilberg.
O fragmento reforça o caráter político e internacional de Jerusalém no século 7 a.C, cidade que, não à toa, abrigava um centro de altos funcionários e ministros na encosta perto do Templo.
O artefato é “uma lanterna na névoa da história”, segundo Zilberg. “Essas inscrições lançam uma luz precisa sobre um ponto quase invisível do passado. É um momento emocionante para a arqueologia bíblica e para o estudo do antigo Oriente Próximo”, completou.



