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Assim é a ironia da vida na Faixa de Gaza agora que os militantes do Hamas estão totalmente no controle. A oposição, pró-Ocidente, na Cisjordânia está pagando os salários da maioria dos funcionários públicos de Gaza com a condição de que eles não trabalhem.

O movimento moderado Fatah do presidente palestino Mahmoud Abbas não quer que seu dinheiro suporte o Hamas, que violentamente tomou o controle de Gaza em junho. Mas também não quer punir os 90 mil funcionários públicos de Gaza, na maioria pró-Fatah, cujos salários são a coluna vertebral de uma economia já danificada.

O resultado é muita inatividade. E muitos trabalhadores – temendo por sua segurança no território dominado pelo Hamas – não estão contentes com as férias.

Abu Samer, antigo funcionário da segurança do gabinete do primeiro-ministro, passa seus dias assistindo televisão e navegando na Internet em busca de notícias que possam oferecer alguma esperança de que o governo do Hamas seja de curta duração.

Mustafa, que trabalhava como detetive de polícia antes do controle do Hamas, joga cartas e assiste TV a maior parte do dia e diz que está "muito entediado".

Abu Osama, um oficial de fronteira aliado da Fatah e também fora do trabalho, diz que desde que o Hamas assumiu o controle da região ele passou a fumar dois maços de cigarro por dia em vez de um. Ele às vezes se pega gritando com seus dois filhos.

"Se você está de bom humor, seu humor reflete na família", diz Gazan, de 39 anos.

As praias de Gaza estão lotadas recentemente, especialmente à noite. Muitos dos funcionários civis fora do trabalho passaram a ficar na praia até altas horas da madrugada – e depois dormem até o fim da tarde para evitar o tédio do dia.

O fato de que os trabalhadores parados entrevistados não quererem usar seus nomes completos é uma comprovação de sua ansiedade. O Hamas concedeu a anistia para seus rivais da Fatah logo depois que tomaram o poder, mas prisões, espancamentos e outras formas de tortura estão se tornando comuns.

Abu Nasser, um oficial anti-drogas ligado à Fatah, disse que agentes do Hamas recentemente invadiram sua casa, confiscaram documentos, seu carro e um revólver. Ele ainda recebe seu salário da Fatah, mas fica em casa. Quando o Hamas pediu a ele que partilhasse de seu conhecimento contra os narcóticos, ele recusou.

"Estamos vivendo com terror e medo", disse ele em entrevista.

Distorção

A Palestina buscar de duas cabeças criada após o governo do Hamas – que compreende a Faixa de Gaza controlada pelo Hamas e a Cisjordânia controlada pela Fatah – aumentou uma distorção particularmente surreal: durante um ano, os funcionários públicos de Gaza trabalharam sem ser pagos. Agora a maioria está recebendo sem trabalhar.

Um boicote da ajuda internacional imposto depois que o Hamas ganhou as eleições parlamentares no início do ano passado deixou o governo palestino incapaz de pagar a maior parte de seus 175 mil funcionários, cujos salários sustentam cerca de um terço dos palestinos. Depois que as forças do Hamas em Gaza derrotaram a Fatah em quatro dias de luta em junho, o boicote deixou de valer para o governo não aliado ao Hamas da Cisjordânia, que retomou o pagamento dos salários.

O porta-voz do Hamas Fawzi Barhoum acusou a Fatah de usar os pagamentos para "fazer com que nosso movimento fracasse em Gaza."

Entretanto, o dinheiro têm sido uma salvação para a empobrecido território. Alguns observadores se perguntam se ele não vai, na verdade, prolongar a permanência do Hamas no poder, ao deixar que um pouco do vapor saia da panela de pressão da Faixa de Gaza. Mas Abu Samer prevê que os pagamentos irão "aumentar a lealdade do povo" para com o presidente Abbas.

De forma geral, a economia de Gaza sofre muito sob o governo do Hamas. Israel fechou as fronteiras da Faixa de Gaza para o comércio, autorizando apenas ajuda humanitária.

As instruções da Fatah para que os funcionários públicos não trabalhem dizem respeito a cerca de 50 mil pessoas que compreendem as forças de segurança da Fatah em Gaza, "porque não queremos que eles sejam uma ferramenta nas mãos do Hamas para oprimir e excluir o povo palestino", disse o ministro de gabinete palestino Ashraf Ajrami. Ele disse que as instruções também se aplicam para funcionários da Fatah que foram prejudicados ou torturados pelo Hamas.

Na prática, poucos funcionários públicos fora do setor de saúde estão trabalhando. A demissão e prisão de um médico pró-Fatah no maior hospital de Gaza levantou a possibilidade de participação na "greve" até mesmo funcionários da saúde. As escolas de Gaza estão de férias desde a tomada de poder pelo Hamas, e não está claro se os professores irão retornar ao trabalho quando voltarem as aulas em setembro.

Em má situação econômica, o Hamas paga pelo menos 10 mil funcionários públicos fiéis ao movimento islâmico. Mas poucos habitantes de Gaza confiam nas promessas de que eles podem pagar os salários dos que retornarem ao trabalho.

Jehad Hamad, professor de ciência política na Universidade Quds de Gaza, descreveu o estresse sentido pelos membros da Fatah em Gaza, dando como exemplo um vizinho seu que era comandante de polícia no regime anterior.

"Antes as pessoas tinham de bater em sete portas para encontrá-lo. Agora você pode vê-lo tomando café e fumando na rua... e ninguém diz oi para ele", diz Hamad. "Falei para ele, ‘Esse não é o seu tempo.’"

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