
Na madrugada desta terça-feira (2), foi concluída a apuração da votação das primárias de Iowa. No lado republicano, a vitória ficou com Ted Cruz, enquanto entre os democratas Hillary Clinton e Bernie Sanders terminaram em um “empate virtual”. O resultado que mais chamou a atenção, porém, não foi a votação de um candidato em particular, mas a derrota do establishment político americano. Eleitores de ambos os partidos deram uma demonstração clara de que querem uma mudança no perfil do político americano, acima de tudo.
Essa escolha fica mais evidente no lado republicano da moeda. Dos quatro candidatos mais votados, três (Cruz, Donald Trump e Ben Carson) apresentam um perfil bastante diferente do candidato republicano tradicional. Juntos, fizeram 61% dos votos de Iowa. Mesmo Marco Rubio, apesar de ser uma figura mais tradicional, não representa exatamente o que pensa a direção do partido. Por outro lado, o representante mais próximo do establishment do partido, Jeb Bush, fez inofensivos 2,8% dos votos.
No lado democrata, o “empate virtual” mostra que uma parcela significativa do eleitorado democrata quer uma mudança – representada por Sanders, um socialista visto como “radical” por suas críticas ao modelo econômico e social de desenvolvimento nos EUA. Ainda que Hillary seja a candidata mais próxima do establishment americano entre os postulantes mais viáveis, ela própria já alinha seu discurso e revê posições defendidas anteriormente.
Esse fator deve resultar em uma campanha, ao mesmo tempo, imprevisível e fortemente polarizada – com os democratas pendendo cada vez mais à esquerda e os republicanos, à direita. A próxima parada é no estado de New Hampshire, na próxima terça-feira (9). Nas pesquisas, Trump e Sanders lideram com folga em seus respectivos partidos.
No lado republicano, quem venceu as primárias foi Cruz, com 27% dos votos. Entretanto, o grande vencedor foi Rubio. Nas urnas, ele fez quase o dobro de votos do que previam as pesquisas, chegando a 23% dos votos, e se cacifou como um possível elemento de união do partido Republicano. Um bom desempenho em New Hampshire, estado onde vai mal nas pesquisas, pode consolidar essa tendência.
Sua grande diferença para os principais adversários é que ele apela para o eleitorado conservador sem desagradar as alas mais moderadas do partido republicano. Com isso, ele tem potencial tanto para herdar votos de candidatos moderados quanto para “roubar” apoiadores de Cruz e Trump preocupados com a viabilidade eleitoral. Outro fator importante: nas pesquisas contra democratas, ele aparece melhor que seus dois adversários – e isso pode inspirar um “voto útil” do eleitorado republicano.
A grande pedra no sapato é o fato de que parte do eleitorado ultraconservador o considera um moderado comparado com Trump e Cruz. Com uma campanha cada vez mais polarizada, este perfil pode ser mais um problema do que um trunfo.
Já Cruz despontou como candidato a ser batido com essa vitória, e pode consolidar sua posição em New Hampshire. Entretanto, o crescimento de Rubio pode se desenrolar em uma polarização entre os dois. Nesse caso, o senador da Florida pode ser um adversário mais difícil que Trump, uma vez que possui rejeição menor do eleitorado americano.
O grande perdedor foi, justamente, Trump. Na primeira primária do ano, ele precisava mostrar ser um candidato competitivo para seguir forte na disputa. Ainda que 24% esteja longe de ser um desempenho ruim, em números absolutos o bilionário foi muito aquém da expectativa, o que pode gerar desconfiança entre seus apoiadores.
É cedo ainda, porém, para dizer que Trump já era. Nas pesquisas, ele aparece distante na liderança em New Hampshire, próxima primária – onde Cruz e Rubio perdem muitos votos para adversários moderados. Se conseguir confirmar a tendência, volta ao jogo. Se Iowa se repetir, porém, pode ter que se conformar com a derrota.
Quem ganhou?
No campo democrata, o resultado foi um “empate virtual”, como já previam as pesquisas. Hillary venceu em 701 locais de votação e Sanders em 697 – o número de votantes não foi divulgado pelo partido. Na prática, isso significa que Hillary leva 23 delegados e Sanders 21 para a convenção nacional do partido. Em nível nacional, a ex-secretária de Estado aparece na frente nas pesquisas, mas vem perdendo terreno.
Apoiadores dos dois candidatos cantaram vitória com esse resultado – ou, pelo menos, um empate com gol fora de casa. E ambos têm bons motivos. Sanders, por exemplo, começou a campanha sendo taxado de inviável, com menos de 10% das intenções de voto, e mostrou nas primeiras primárias que é um concorrente sério à indicação democrata. Uma provável vitória em New Hampshire, onde é favorito absoluto, pode iniciar uma virada em nível nacional.
Já Hillary venceu por 0,3 pontos percentuais justamente no estado onde sua campanha começou a desandar em 2008, quando disputou a indicação com Barack Obama. O estado era visto também como um possível ponto de virada para Sanders por causa do perfil demográfico do eleitorado democrata. Entretanto, isso não se confirmou.
Os próximos dias devem fornecer respostas mais claras sobre quem saiu ganhando nesse empate. Em New Hampshire, próxima primária, Sanders é franco favorito. Em Nevada e Carolina do Sul, que vem logo em seguida, Hillary aparece na frente nas pesquisas.



