Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
Tendências mundiais

Beleza se mistura com o futebol

 | Fotos: Mauricio Lima para o “The New York Times”
(Foto: Fotos: Mauricio Lima para o “The New York Times”)
Brenda Pontes, à direita, é a atual Rainha do Peladão, um torneio na floresta amazônica que une futebol e concurso de beleza |

1 de 1

Brenda Pontes, à direita, é a atual Rainha do Peladão, um torneio na floresta amazônica que une futebol e concurso de beleza

Na redação de uma emissora televisiva, a recepcionista morena vestindo uma coroa, faixa e um vestido em estampa de leopardo oferecia conselhos sobre como apimentar a Copa do Mundo.

"Rainhas da beleza", declarou a recepcionista, Brenda Pontes.

Na floresta tropical amazônica, porém, existe um torneio que traz, em partes iguais, futebol e concurso de beleza. Trata-se de uma das mais incomuns competições amadoras do mundo, e talvez a única com um reality show. Brenda, de 19 anos, é a rainha reinante.

O torneio é chamado de Peladão. O nome faz referência à pelada, palavra que pode significar uma mulher nua. Mas nesse caso, ela significa o futebol despido do dinheiro e do glamour e revelado em sua essência – partidas jogadas em campos empoeirados, praias ou até mesmo em balsas de aldeias flutuantes.

Cerca de 1.100 times e 23 mil jogadores competem anualmente no Peladão e torneios afiliados. Cada uma das mais de 500 equipes do campo principal inscrevem uma rainha. Competições paralelas ocorrem de setembro a início de janeiro, uma para determinar o time de futebol vencedor – e a outra para escolher a Rainha do Peladão.

Por que misturar um torneio de futebol com um concurso de beleza? É preciso considerar as paixões do Brasil, disse Messias Sampaio, de 69 anos, advogado que fundou o Peladão em 1973. "No Brasil, toda promoção publicitária tem futebol, mulheres lindas e cerveja", explicou ele. "Se você não tem essas coisas, não terá sucesso".

Brenda viajará de helicóptero à cerimônia de abertura, em 13 de setembro, onde as rainhas desfilarão com camisas de futebol e biquínis diante dos jurados. Os organizadores esperam usar a Arena da Amazônia, que recebeu partidas da Copa do Mundo. A final da Copa será em 13 de julho.

As rainhas exercem influência sobre a competição de futebol. Se uma rainha não aparece para a cerimônia de abertura, a equipe dela é desclassificada. Se uma equipe é eliminada mas uma rainha continua avançando, o time entra num torneio satélite com uma chance de retornar ao Peladão.

"É uma enorme responsabilidade", afirmou Pontes, universitária que espera se tornar chefe de polícia.

Existem apenas duas exigências. As rainhas precisam comparecer ao desfile de abertura e devem ser mulheres. "Eles tinham travestis no passado", explicou Kid Mahall, de 45 anos, que coordena o concurso. "Hoje isso é proibido. É uma competição feminina".

Conforme o torneio de futebol prossegue, o campo das concorrentes de beleza é reduzido de 500 para as 12 finalistas. Há alguns anos, um novo toque foi adicionado: um reality show chamado "Peladão Onboard".

As doze finalistas são enviadas num iate pelo Rio Negro, maior afluente do Amazonas. Elas enfrentam desafios como remar num bote, arrumar uma mesa e se vestir em espaços apertados.

Assim que as três finalistas são escolhidas, os telespectadores decidem quem leva o título de Rainha do Peladão. As mulheres têm entre 18 e 28 anos – estudantes, trabalhadoras de fábricas, algumas querendo ser famosas, outras buscando uma breve fuga do cotidiano.

Brenda queria homenagear seu irmão, Sansão Carioca Miranda, que foi assassinado em 2012, aos 24 anos, numa tentativa de assalto. Naquele mesmo ano, no 40o evento do peladão, uma das rainhas era Marcia de Almeida Lobo, uma varredora de ruas de 34 anos e mãe de cinco filhos.

Marcia não tinha ilusões de vencer, declarou ela ao jornal "A Crítica", mas quando criança ela assistia aos desfiles e se permitia sonhar. "A única coisa que conseguia pensar era que, um dia, eu também seria uma rainha do Peladão", disse ela ao "A Crítica".

Histórias como a de Marcia transformam o torneio num "grito de liberdade", afirmou Arnaldo Santos, de 75 anos, radialista e comentarista de futebol que é o principal organizador do Peladão desde 1998.

"Os ricos e os pobres ficam misturados", argumentou Santos. "Algumas pessoas nem mesmo sabem o que vão comer na segunda-feira, mas no domingo estão jogando e aplaudindo".

Mas o reality show deixa o evento sujeito a acusações de elitismo, explicou Sampaio. "Isso vai acabar com o Peladão", afirmou ele. "Não existem moças pobres naquele barco".

Por enquanto, o fascínio de ser escolhida rainha é forte, e as recompensas, generosas. Brenda ganhou um carro, que vendeu para pagar pela faculdade e por moradia. Ela conseguiu um emprego na emissora de televisão do "A Crítica" e fez propaganda de muitos produtos.

Ela espera vencer outros concursos de beleza. E por que não?

Priscilla Meirelles de Almeida, uma ex-Rainha do Peladão, foi escolhida Miss Terra em 2004. Brenda começará com ambições menos globais.

"Algum dia serei Miss Brasil", afirmou ela.

Contribuíram Miriam Wells e Mauricio Lima

Principais Manchetes

Receba nossas notícias NO CELULAR

WhatsappTelegram

WHATSAPP: As regras de privacidade dos grupos são definidas pelo WhatsApp. Ao entrar, seu número pode ser visto por outros integrantes do grupo.