Por algum tempo, parecia que a maré havia se voltado contra a tradição do sigilo de Zurique, a maravilhosa cidade alpina que se converteu no centro bancário mundial.
A Suíça se uniu a 60 países na assinatura de um tratado cujo propósito é desmascarar clientes muito ricos. E este mês, espera-se que os bancos suíços revelem centenas de nomes de seus funcionários para o Departamento de Justiça dos EUA, em troca de livrar o nome dos bancos nos processos.
Porém, a impressão de mudança é enganosa, afirmam banqueiros e reguladores da cidade. A realidade, segundo eles, é mais parecida com os negócios de sempre.
As leis validas desde 1934 fazem com que violar a confidencialidade dos clientes seja um crime. Os banqueiros que cooperarem com as autoridades estrangeiras e violarem seu "dever de silêncio absoluto", como é conhecido aqui, podem ter suas casas invadidas pela polícia, pagar multas por violação de sigilo bancário ou por espionagem industrial, além de sofrer o ostracismo de colegas e amigos.
No mínimo, uma reação está se constituindo para proteger a antiga tradição do sigilo que sustenta um dos pilares essenciais da economia suíça. O Partido do Povo Suíço, de direita, está reunindo assinaturas para um referendo com o objetivo de incluir o sigilo corporativo na constituição nacional, alertando sobre os terríveis efeitos para a Suíça das exigências internacionais por informações fiscais.
Enquanto isso, as pessoas que estão sendo pressionadas para revelar seus segredos fazem o possível para manter o código de silêncio frente a autoridades estrangeiras que investigam a evasão fiscal e outros crimes. Para os banqueiros cujos cargos fizeram com que fossem processados em outros países, isso significa evitar a extradição ficando dentro da Suíça e vivendo a vida em um limbo pessoal e legal.
"Se você delatar, estará social e financeiramente morto", afirmou Rudolf M. Elmer, chefe das operações caribenhas do banco suíço Julius Baer até 2002, sob investigação há nove anos por revelar informações secretas de uma filial nas Ilhas Cayman a autoridades fiscais na Suíça e em outros países. "Aqui você sofre a ameaça de ir para a prisão e sua carreira bancária está arruinada".
Os banqueiros afirmam que continuam pressionados a assumir a culpa em nome de superiores poderosos em um setor que se resguarda escondendo sua hierarquia.
Eles afirmam que uma das práticas que estão sendo mais investigadas o recrutamento clandestino de clientes nos EUA era parte de um modelo de negócios. Os banqueiros viajavam pelos EUA com instruções de recrutar clientes ricos em um circuito de hotéis cinco estrelas e exposições de arte. Segundo eles, os bônus dependiam dos negócios que eram capazes de cultivar.
Um banqueiro veterano, que não quis se identificar com medo de ser processado na Suíça por violações de sigilo, afirmou que todos os funcionários que trabalhavam com clientes americanos seguiam normas de segurança muito rígidas.
Ele afirmou que os banqueiros andavam com um laptop especial adaptado para que as informações pudessem ser apagadas instantaneamente. Além disso, disse que cortava os nomes dos recibos bancários e que os clientes ligavam de telefones públicos utilizando codinomes.
Contou também que carregava listas separadas, uma com códigos numéricos e outra com os nomes correspondentes. Esses nomes não apareciam nos registros bancários porque eram protegidos por um labirinto de instituições e fundações estrangeiras, afirmou. O verdadeiro valor dos banqueiros suíços para as autoridades americanas, segundo ele, é que os banqueiros conhecem a identidade dos clientes, uma vez que já se encontraram com eles em grandes eventos.
"Todo mundo sabia", afirmou o banqueiro. "Eu me lembro de uma festa há alguns anos com velhos banqueiros, e eu disse que todos estávamos com um pé na cadeia. Todo mundo riu".
A cultura continua a mesma em meio a banqueiros, entidades regulatórias e outros, afirmam especialistas.
Os bancos fazem a gestão de mais de seis trilhões de dólares em ativos, mais da metade vindo de outros países e um total que tem se mantido relativamente estável, de acordo com Daniela Fluckiger, da Associação de Banqueiros Suíços.
O Departamento de Justiça dos EUA processou mais de 35 banqueiros suíços e 25 conselheiros financeiros por facilitação de evasão fiscal. Alguns que estão sendo investigados afirmam que seus bancos se negaram a oferecer hipotecas ou cancelaram suas contas pessoais com medo de que sua reputação pudesse ser afetada.
Para muitos banqueiros, o caso de Elmer serve de aviso. Desempregado, ele passou mais de 200 dias na prisão. Elmer e seu antigo banco tiveram problemas legais com detetives que acompanhavam sua família. Outros ex-colegas enfrentarem escolhas igualmente difíceis sobre romper o código de silêncio absoluto. Segundo ele, nenhum deles abriu a boca. Elmer completou: "Eles têm o poder para destruir a sua vida".



