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Copa do Mundo é cartão de visitas para o presidente da Rússia, Vladimir Putin | ALEXEY DRUZHININ/AFP
Copa do Mundo é cartão de visitas para o presidente da Rússia, Vladimir Putin| Foto: ALEXEY DRUZHININ/AFP

Durante uma coletiva de imprensa organizada pela Fifa (Federação Internacional de Futebol) em Zurique, Vladimir Putin anunciou que seu país havia vencido a disputa para sediar a Copa do Mundo de 2018. Era dezembro de 2010.

Embora a tão esperada votação tenha sido denunciada por acusações de corrupção e prisões de oficiais do alto comando da organização de futebol cinco anos depois da coletiva, Putin, naquele dia, estava em clima de comemoração ao responder perguntas de repórteres internacionais, compartilhando histórias sobre sua infância e falando sobre suas esperanças sobre o que o grande campeonato significaria para a Rússia aos olhos do mundo. 

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"Antes de mais nada, precisamos mostrar que a Rússia é um país aberto, que está aberto para todo o mundo", disse ele. "As pessoas vão entender o que a Rússia é quando elas vierem aqui. Ainda há muitos estereótipos do passado, mas quanto mais contatos estabelecermos, mais rapidamente esses estereótipos se dissipam", disse ele naquela ocasião. 

Desde então uma série de ações e alegações abalaram a política internacional, deixando a Rússia cada vez mais isolada. A anexação da Crimeia, a suspeita de interferência nas eleições dos EUA e da Europa, o envenenamento de um ex-espião russo na Inglaterra (pelo qual o Kremlin foi acusado) e a intervenção militar na Síria estremeceram as relações com o Ocidente - e ainda há dúvidas sobre a extensão da corrupção na candidatura bem-sucedida da Rússia à Copa do Mundo. 

O campeonato mundial começou nesta quinta-feira (14), atraindo centenas de milhares de fãs de futebol ao país e uma inigualável atenção da mídia internacional, mas o que a Copa significa para as relações da Rússia com o mundo ocidental?

Vitória de Putin

Especialistas em geopolítica observam que o Mundial ainda representa um triunfo de Putin no cenário mundial.  "Ele precisava da Copa do Mundo principalmente para fins domésticos, e acho que isso o ajudará nesse sentido", disse o analista político Dmitry Oreshkin, de Moscou, à Associated Press. "A Copa do Mundo eleva sua [de Putin] taxa de aprovação, porque a maioria das pessoas gosta de assistir ao futebol. Apesar de ser de curta duração, o evento não deixa de ser uma distração da realidade pós-soviética". 

Embora o país tenha sido alvo de sanções do Ocidente - que supostamente complicaram o financiamento da construção de estádios -, a atração magnética da Copa do Mundo proporcionou uma oportunidade para o país demonstrar que as sanções não tiveram o efeito pretendido. 

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"Para Putin, sediar a Copa do Mundo significa o fracasso das sanções e o fracasso dos esforços ocidentais para isolá-lo", disse o professor Sergei Medvedev, da Escola Superior de Economia de Moscou, à Reuters. "Apesar de tudo isso, [sua mentalidade é de que] ainda temos a Crimeia, estamos avançando em nossa agenda e, mesmo assim, parece que todos vieram para a Copa do Mundo". 

"Quanto mais forte for a campanha anti-russa antes da Copa do Mundo, mais as pessoas ficarão genuinamente admiradas quando virem que não há arame farpado nos estádios", disse a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Maria Zakharova, no mês passado. 

"Se isso é isolamento, então estamos gostando", disse à Reuters uma importante autoridade do governo russo.

Política na Copa

Mas a política continua a espreitar no cenário do mundial, ameaçando sempre entrar em primeiro plano. As conversas de Putin com o príncipe da Arábia Saudita, Mohammed bin Salman, no jogo de estreia entre as duas seleções, atraíram mais atenção ao acordo global de produção de petróleo que ambos os países lideram, em meio à alta nos preços globais.

A lista de convidados do Kremlin para o evento é composta por "autocratas da Ásia central, líderes das repúblicas separatistas Abkhazia e Ossétia do Sul e um punhado de líderes estrangeiros da África e da América do Sul", como observou o britânico The Guardian. A primeira-ministra britânica, Theresa May, retaliou o episódio de envenenamento de Skripal ao impedir que seus ministros participem da Copa do Mundo. 

Além disso, o ativista LGBT britânico Peter Tatchell foi brevemente detido em Moscou na quinta-feira, depois de ter empunhado uma bandeira que criticava o presidente: "Putin não age contra a tortura na Chechênia de gays", dizia o texto. E o racismo, um persistente flagelo em estádios de futebol ao redor do mundo, continua sendo uma preocupação tão importante na Rússia que a FIFA deu aos árbitros a possibilidade de interromper ou até mesmo cancelar um jogo se cantos ou insultos racistas emergirem da multidão. 

Racismo

A chefe do comitê sobre mulheres, família e crianças para a Duma, a câmara baixa do Parlamento da Rússia, deu uma entrevista a uma estação de rádio de Moscou nesta semana em que ela parecia criticar crianças mestiças ao pedir que as mulheres russas evitassem dormir com estrangeiros durante a Copa do Mundo. 

"Seus filhos sofrerão por isso. Eles sofreram no passado, desde o período soviético", disse a parlamentar, Tamara Pletnyova, segundo o The Guardian, que disse estar se referindo a crianças mestiças nascidas como resultado os Jogos Olímpicos de Moscou em 1980. "É bom se eles forem de uma raça só, mas se eles são de uma raça diferente, então é pior. Devemos ter nossos próprios filhos." 

Talvez possa haver uma reviravolta. Putin encerrou sua palestra em 2010 com uma nota positiva, esperando que a experiência de tantas pessoas visitando a Rússia pudesse conquistar corações e mentes. 

"Você sabe, muitos clichês sobrevivem desde a Guerra Fria. Eles vagam pela Europa como muitas moscas, zumbindo acima da cabeça para assustar as pessoas", disse ele. "As coisas são realmente muito diferentes. Venha e veja como estamos nos preparando para a Copa do Mundo e vejamos seus jogos. Você obterá conhecimento em primeira mão da Rússia, visitará suas cidades, conversará com as pessoas e entenderá melhor este país".

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