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Mico-leão-da-cara-preta ameaçado | Divulgação
Mico-leão-da-cara-preta ameaçado| Foto: Divulgação

Os holofotes do público e dos conservacionistas estão quase sempre voltados para o mico-leão-dourado, mas quem mais precisa de atenção talvez seja um primo menos famoso, mas tão belo quanto ele, o mico-leão-da-cara-preta (Leontopithecus caissara). Com apenas 400 exemplares remanescentes em São Paulo e no Paraná, o pequeno primata é o mais ameaçado dos micos-leões, e um dos macacos brasileiros mais próximos da extinção. Para tentar salvar o bicho desse destino, pesquisadores estão tentando entender por que ele parece ser tão exigente em relação ao seu habitat e determinar se a espécie sempre teve uma população restrita.

Ao lado do mico-leão-preto, que é relativamente mais comum e ocupa uma categoria menos ameaçada, o mico-leão-da-cara-preta é o único de seu grupo a habitar a Mata Atlântica paulista. "E, ao contrário dos outros micos-leões, ele sofre bem menos com a redução de habitat, porque as florestas onde está equivalem a grandes extensões de mata relativamente bem-preservada", explica o biólogo Alexandre Túlio Amaral Nascimento, coordenador de projetos da ONG ambientalista IPÊ (Instituto de Pesquisas Ecológicas).

A equipe do IPÊ acompanha o bicho desde meados dos anos 1990, pouco depois de ele ter sido descoberto (apesar de viver num estado tão populoso quanto São Paulo, antes disso o animal era desconhecido da ciência). Uma coisa continua inalterada, apesar de mais de uma década de trabalho. "Desde que a gente começou a trabalhar com a espécie, a distribuição dela continua restrita. Houve alguns alarmes falsos sobre a presença de novas populações, mas a área que ela ocupa continua a ser basicamente a mesma", diz Nascimento.

Cada família da espécie -- formada por um casal e seus filhotes -- habita cerca de 300 hectares numa pequena região da Mata Atlântica do extremo sul de São Paulo e o extremo norte do Paraná. Na natureza, os primatas comem principalmente invertebrados, pequenos anfíbios e frutas. Os bichos se dividem entre a floresta do litoral continental e a que existe na ilha de Superagui. Mais uma vez, a situação é única entre os micos-leões, porque só a espécie paulista-paranaense conta com grandes pedaços de mata para chamar de lar.

Exigente?

A grande questão é saber se o bicho é realmente mais exigente que seus parentes, precisando de mais espaço vital. "Por um lado, a gente sabe que ele prefere a faixa mais litorânea de mata, inclusive algumas áreas de brejo, que apresentam transição com restinga [vegetação costeira]", conta Amaral. "Nas áreas em que o habitat dele começa a ter mais elevações, vemos que ele utiliza muito pouco os trechos mais altos de mata, mesmo quando o terreno elevado responde pela maior parte de habitat disponível", explica o biólogo.

Uma das possíveis explicações para isso é o fato de que a planície litorânea do sul de São Paulo e norte do Paraná é estreita demais, enquanto nos outros locais habitados por micos-leões, como o Rio de Janeiro e a Bahia, ela se estende bem mais para o interior. Como a transição é mais abrupta no território do mico-leão sulista, pode ser que ele não tenha conseguido acompanhar o ritmo da mudança e tenha ficado "espremido" nas áreas baixas do litoral.

Outra dúvida que os pesquisadores esperam responder logo, com a ajuda de dados genéticos, é o que Nascimento chama de "grande mistério" sobre a espécie: afinal, será que o bicho sempre viveu na área relativamente minúscula onde se encontra hoje? "Em tese, se há pouca diversidade genética na espécie, isso significa que ela passou por uma contração populacional que pode ser perigosa", diz ele, lembrando que espécies com DNA pouco diverso estão mais sujeitos a parasitas, doenças e outros problemas, porque diminuem as chances de ao menos alguns indivíduos serem resistentes. Por outro lado, se a diversidade genética presente for razoável, a preocupação diminui.

De qualquer maneira, mesmo que a área ocupada pelos bichos originalmente tenha sido bem maior, há espaço de sempre para a população da espécie crescer. "Fizemos um levantamento extenso dos tipos de vegetação e das altitudes da região e vimos que daria para o número de indivíduos quase triplicar sem problemas de falta de habitat", afirma Nascimento.

O esforço dos especialistas do IPÊ já conseguiu tirar o bicho da lista dos 25 primatas mais ameaçados do mundo, mas algumas ameaças sérias continuam. As principais são a extração de palmito e de caxeta (uma madeira de lei leve, muito apreciada), que colocam em risco a Mata Atlântica da região. Para contonar esses problemas, é fundamental trabalhar com a população da área, diz Nascimento.

"Eles já enfrentam uma série de restrições por viver numa área de interesse ambiental. Então, é fundamental que a gente os ajude a encontrar alternativas econômicas, como a exploração sustentável do palmito ou o artesanato", ressalta o biólogo. Como os micos-leões são bichos um bocado bonitos, o turismo de observação talvez possa ser uma opção para o futuro. "Mas é importante só investir nisso quando a comunidade estiver preparada. Do contrário, a gente pode até acabar ajudando o tráfico de animais sem querer", diz ele.

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