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Operações de unidades da OTAN, no âmbito de manobras nas proximidades de La Algameca, em Cartagena
Operações de unidades da OTAN, no âmbito de manobras nas proximidades de La Algameca, em Cartagena| Foto: EFE/Marcial Guillén

Nesta semana, a Organização do Tratado Atlântico Norte (OTAN) deu início ao maior treinamento militar em décadas na Europa, reunindo mais de 90 mil soldados de todos os países que integram a aliança militar, além de 50 navios, 80 aeronaves e mais de 1.100 veículos blindados.

O recente investimento em exercícios, ligado à aquisição bilionária de armas pelo bloco ocidental, mobiliza a atenção internacional para um momento em que as investidas de Moscou contra a Ucrânia ganham novo fôlego, gerando uma série de especulações sobre uma iminente terceira grande guerra no mundo.

Em outubro do ano passado, o ex-presidente russo Dmitry Medvedev, que agora é vice-presidente do Conselho de Segurança do país, já havia alertado que Moscou consideraria qualquer ajuda militar do Reino Unido à Ucrânia como uma declaração de guerra, medida que foi efetivada pelo premiê britânico, Rishi Sunak, durante uma visita a Kiev, neste mês, ocasião na qual anunciou um novo acordo de segurança entre os países.

As tensões aumentaram ainda mais nos últimos dias após a declaração do chefe do comitê militar da OTAN, o almirante holandês Rob Bauer, afirmando na segunda-feira (22) que os países que compõem a aliança estão se preparando para um enfrentamento em larga escala contra possíveis inimigos, incluindo o Exército de Vladimir Putin.

O ministro de Defesa da Alemanha, Boris Pistorius, também manifestou preocupação com um futuro alargamento do conflito nos próximos anos, principalmente depois das ameaças do Kremlin aos Estados Bálticos - Estônia, Letônia e Lituânia - e a outras nações, como a Finlândia, que tem uma fronteira de mais de 1.300 quilômetros de extensão com o país e aderiu recentemente ao Tratado. "Os nossos especialistas acreditam que, em um período de cinco a oito anos, isso poderá ser possível", disse durante uma coletiva.

O doutor em Relações Internacionais e professor da Universidade de São Paulo (USP), Kai Lehmann, observa que o panorama geopolítico ainda é de muitas incertezas nesse sentido.

"Os dois anos da guerra na Ucrânia ainda indicam muitas incertezas. Eu vejo que uma escalada regional no conflito dependeria principalmente de uma vitória definitiva da Rússia sobre Kiev, uma vez que isso abriria uma porta para futuras conquistas de territórios em outros Estados por parte de Putin, inclusive sobre os países fronteiriços que já demonstraram preocupação com esse cenário de expansão territorial, como a Letônia".

Contudo, lembra Lehmann, "Moscou tinha expectativa da guerra durar apenas um mês e já concluímos o segundo ano da invasão", o que corrobora com a ideia de que "seria uma estratégia arriscada para o chefe do Kremlin abrir mais uma frente de confronto", em especial contra a OTAN, que conta com 31 países membros.

Para o especialista em Relações Internacionais, existem muitos fatores que reduzem a probabilidade de um confronto direto entre os dois lados.

"Não vejo um risco iminente da Rússia invadir algum país integrante da OTAN, porque um conflito desse porte não se resolveria em um curto prazo. Em muitos momentos, desde o início da guerra do leste europeu, Putin declarou que, caso a Europa apoiasse Kiev, eles atacariam a Alemanha, a França e qualquer outro país que criticasse sua investida militar, no entanto eles não conseguiram nem mesmo vencer a Ucrânia. Por isso, vejo que é difícil haver uma escalada do conflito agora, ao menos enquanto Joe Biden estiver à frente da Casa Branca".

O professor da USP pontua ainda que a atuação da OTAN nos próximos anos dependerá invariavelmente das eleições presidenciais dos EUA, marcadas para novembro. "Evidentemente, as eleições americanas têm um peso importante numa possível entrada da OTAN na guerra contra a Rússia. Caso Donald Trump seja eleito presidente, certamente as dinâmicas dos EUA e da Europa vão mudar, o apoio à Ucrânia vai mudar, com isso temos obviamente também o futuro da OTAN em jogo, já que o país lidera a frente militar hoje", explica.

Lehmann relembra que o ex-mandatário republicano já manifestou seu desejo de retirar os EUA da organização militar, posicionamento contrário ao do democrata Joe Biden, que atualmente enfrenta uma batalha no Congresso americano para manter a ajuda financeira a Kiev.

Segundo dados do Departamento de Estado americano, a Casa Branca é a maior fornecedora de ajuda militar à Ucrânia, desde o início da invasão russa, auxiliando o país nos últimos dois anos com US$ 44,2 bilhões (R$ 214 bilhões). "Trump é um aliado russo dentro da OTAN, portanto uma nova vitória dele pode levar a um teste da Rússia para provocar a vontade dos EUA de defender um estado membro da aliança, como algum país báltico".

Outros impeditivos para um confronto direto da OTAN são os desentendimentos entre os próprios países que integram a aliança. "Hoje, temos governos dentro da OTAN, como a Hungria e Eslováquia, que não estão 100% comprometidos com a defesa da Ucrânia. Isso também precisa ser levado em conta na hora de avaliar uma nova frente na guerra que acontece na Europa", disse Lehmann, citando o artigo 5º da organização, que obriga os países integrantes a entrarem em um confronto, caso um membro seja atacado.

O professor analisa ainda que o Exército de Putin dá sinais de enfraquecimento com a guerra contra Kiev. "Um dos maiores exemplos disso é a série de acordos do país com a Coreia do Norte, isso mostra fraqueza do lado do Putin, apesar de parecer o contrário. Vejo essa mobilização mais como um pedido de ajuda, um sinal de que nem tudo está indo bem em Moscou, já que fez aliança política e militar com o país mais recluso do mundo", pontuou.

Mesmo sem ter controle definitivo sobre a guerra, os novos ataques em grande escala da Rússia contra Kiev mostram que o país permanece focado nos objetivos expansionistas sobre a nação vizinha, que vive uma escassez de recursos em meio à interrupção da ajuda externa.

Para além do conflito no leste europeu, Vladimir Putin tem investido seus esforços em batalhas pontuais, como no Oriente Médio, onde Israel busca eliminar o grupo terrorista Hamas com apoio dos EUA, desde outubro.

O chefe do Kremlin tem culpado o Ocidente pela continuidade do confronto e recebeu uma delegação com lideranças da milícia palestina no ano passado para uma reunião, que também contou com representantes do grupo xiita libanês Hezbollah.

Mais recentemente, uma análise da agência Associated Press (AP) apontou que o Hamas tem usado um arsenal diversificado de armas provenientes de países como a Coreia do Norte, China, Irã e a própria Rússia na guerra. No ano passado, o presidente da Microsoft, Brad Smith, também fez um alerta contundente sobre a disseminação de desinformação a partir de Moscou sobre o atual conflito no Oriente Médio.

O foco da desinformação russa, segundo Smith, é direcionado especialmente para países do Ocidente, buscando atribuir a culpa do conflito aos Estados Unidos e direcionando essas narrativas às audiências ocidentais. O presidente da Microsoft revelou que atores baseados na Rússia estão utilizando Inteligência Artificial (IA) generativa para criar conteúdo multimídia mais sofisticado, a fim de manipular a percepção do público ocidental sobre o conflito.

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