Depois de anos de gestões catastróficas, a Venezuela está entrando em colapso, deixando milhões de pessoas famintas e doentes. Todos sabem que o governo repressor e incompetente de Nicolás Maduro precisa ser substituído urgentemente – mas são os cidadãos que contam essa história melhor que ninguém. Leia a seguir os depoimentos de alguns venezuelanos que conheci ao longo da fronteira com a Colômbia, ligeiramente resumidos por questão de espaço.
Manuel González, 42 anos
Estou dormindo neste parque (em Riohacha, na Colômbia) com meu filho, Edi, de três anos. Ele tem lábio leporino, mas nunca conseguiria fazer uma cirurgia na Venezuela. Estou torcendo para que dê certo aqui. Não posso trabalhar porque preciso cuidar dele, por isso tenho de pedir comida. Bom, pelo menos aqui tem o que comer. Posso estar dormindo no chão, na rua, mas estou melhor aqui do que na Venezuela.
Eu apoiava (o ex-presidente Hugo) Chávez, mas depois que entrou Maduro, a coisa degringolou de vez.
Caroline, 28 anos
Nunca pensei em um dia trabalhar em bordel, mas aqui tenho um lugar para dormir e me dão comida. É a melhor maneira de uma garota venezuelana ganhar dinheiro para a família. Mando o que ganho para meus pais e é graças a isso que eles estão conseguindo viver. Minha mãe sabe o que faço e me ajuda a esconder do resto do pessoal. Ela não gosta, morre de medo pela minha saúde e minha segurança. É o desespero que está fazendo a gente aceitar qualquer coisa que apareça para sobreviver.
Maduro é o maior pecador de todos; tem muito mais a confessar para o padre do que eu.
Liliana Boscan Marin, 37 anos
Meu filho nasceu há cinco meses, em Maracaibo. Não tinha nada no hospital, nem uma agulha. Aliás, não tinha nem energia enquanto fiquei lá. Meu marido teve de vir à Colômbia comprar tudo: luvas, máscara, agulhas, fio de sutura, anestesia, fralda, e deixar tudo lá antes do parto.
Então o bebê pegou pneumonia e não podia ser tratado, por isso acabamos vindo também para a Colômbia. Todo mundo em Maracaibo quer ir embora. Somos 14 pessoas vivendo na mesma casa: em um quarto dormem quatro em uma cama e cinco na outra; no outro, quatro dormem no colchão e uma na rede.
A solução é tirar aquele asno de lá – quer dizer, Maduro. Se ele saísse, eu voltaria correndo para a Venezuela. Não quero morar aqui, não.
Héctor Crespo Valero, 40 anos
Eu trabalhava no necrotério de um hospital em Valencia, por isso via tudo. Tem muito mais mortes agora, principalmente de idosos e crianças. As câmaras refrigeradas já não estavam funcionando antes dos apagões, por causa da falta de manutenção; depois de uma semana, não dava mais para aguentar o cheiro. A gente tinha de se livrar dos cadáveres. Corpos que ninguém vinha reclamar eram enterrados em valas comuns.
O hospital não tem suprimentos, portanto só está fazendo cirurgias extremamente urgentes, e entre elas, às vezes, nem a apendicectomia está incluída. É só cesariana de emergência, e mesmo assim se a paciente leva tudo – luva, fio de sutura, avental, seringa. Se não tiver condições de dar o material, acaba até morrendo. Todo dia você vê mortes desnecessárias.
Saí do hospital porque não estava recebendo o suficiente nem para comprar comida. Então vim parar aqui. Eu e meu filho vendemos remédios; estamos conseguindo mandar uns US$ 60 por semana para a família.
Génesis Gutiérrez Padilla, 27 anos
Os blecautes estavam durando cinco, seis dias; foi por isso que saímos da Venezuela. Imagina, tem de comprar comida com cartão de débito (a inflação come tudo, o dinheiro não vale mais nada) e aí não passa porque não tem energia para a máquina. Não dá para comprar. Cheguei a ficar mais de uma vez o dia inteirinho sem comer nada. Meu filho de sete anos também. Graças a Deus que o pequeno não passou fome porque eu estava amamentando.
Sabe por que tive esse filho? Durante seis anos tomei a pílula, mas aí ela praticamente desapareceu. Ou eu comia ou comprava contraceptivo, não dava para fazer os dois. E uma camisinha custa o mesmo que um quilo de arroz.
Meu sonho é ir para os EUA. Estou morrendo de vontade de ir para lá.
Yuliana Rocha, 16 anos
Meu filho, Diogel, está com dois meses, e só nasceu porque os anticoncepcionais desapareceram. Até tentamos, mas mesmo a camisinha era cara demais. Diogel nasceu em Maracaibo e depois viemos para cá (Riohacha). Lá não tem nada – nem comida, nem água, nem energia. Se tivesse ficado na Venezuela, teria morrido de fome. E aqui dormimos no parque.
The New York Times Licensing Group – Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times.
Deixe sua opinião