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Opinião

Suicídios pelo coronavírus na Itália: eis aonde leva a disseminação do pânico

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Mais de oito mil pessoas morreram em decorrência do coronavírus na Itália (Foto: Piero CRUCIATTI/AFP)

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A Covid-19 mata, seguramente, mas encontrou um grande aliado no medo, no terror que agora oprime milhões de pessoas. Nos últimos dias, na Itália, estamos assistindo a um trágico fenômeno ao qual não foi dado até agora o suficiente destaque: os suicídios pelo coronavírus. Todo dia aumenta o número de pessoas que tiram suas vidas para não ter de enfrentar a doença.

Aconteceu em Crema; aconteceu em Pávia, onde um homem de 65 anos, hospitalizado por broncopneumonia, ainda aguardando o resultado do teste, jogou-se da janela do hospital onde estava sendo tratado. Tentativas de suicídio e homicídios também em Milão, onde um centro-americano que sofria de sintomas pulmonares tentou matar a companheira e depois cortou sua própria garganta. Uma outra tentativa em Lecce, onde um idoso, aterrorizado pela ideia de adoentar-se, tentou se matar e foi salvo in extremis.

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Ademais, despertou uma impressão forte os suicídios de duas enfermeiras. Uma trabalhava no hospital San Gerardo de Monza, uma jovem profissional que estava com coronavírus. O estresse, o cansaço e o temor de ter infectado outras pessoas devastaram-na e levaram-na a tirar sua vida. Fez o mesmo uma enfermeira que trabalhava no hospital de Jesolo, no Vêneto: uma enfermeira de 49 anos, que estava em isolamento domiciliar havia dois dias, ainda esperando o resultado do teste e assintomática, não foi capaz de lidar com a tensão extrema e se suicidou ao lançar-se no rio Piave. Os colegas e as pessoas que a conheciam descreveram-na como uma pessoa dedicada ao trabalho e muito atenta às exigências dos outros. No hospital se esforçou para tratar os pacientes, expondo-se a um mal que não a matou, senão indiretamente. Quem tirou-lhe a vida foi o medo, junto ao cansaço, à solidão, ao isolamento, à dor por aquilo que via em torno de si.

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Todos esses episódios pedem de nós uma reflexão. Antes de tudo, sobre as condições dramáticas de estresse em que os funcionários da saúde estão trabalhando. Em segundo lugar, e isso é elemento de grande importância, foi criado um clima de medo, de pânico, de insegurança que está comprometendo seriamente a saúde mental de muitas pessoas.

Já dissemos nos dias anteriores sobre os graves erros de comunicação do governo italiano. A população do país não foi preparada para afrontar a epidemia, não foi adequadamente formada e informada. Assim, quando já era tarde demais, preferiu-se disseminar o terror. As imagens dos pacientes entubados nas unidades de terapia intensiva, as imagens dos caixões empilhados e caminhões militares foram e são funcionais para um objetivo específico: assustar da maior forma possível as pessoas para constrangê-las à obedecer às ordens do governo. Mas esse medo tem consequências tremendas: leva em primeiro lugar à depressão, que é uma condição psicológica que – como demonstraram numerosos estudos – tem um efeito nocivo sobre o sistema imunológico e sobre as defesas do organismo no confronto de infecções.

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Um estudo da Universidade de Trondheim, na Noruega, demonstrou a conexão entre depressão e diversas outras patologias, com as inflamações como o denominador comum. Em particular, os autores demonstraram que doenças graves, como as infecções crônicas, os distúrbios autoimunes, muitos tipos de câncer, o mal de Alzheimer e a esclerose múltipla, se encontram muitas vezes associados à depressão. Todos os importantes elementos da resposta imunológica são amplificados tanto na depressão quanto em suas comorbidades. A incidência de depressão é três vezes maior em quem tem doença cardíaca coronariana do que na população em geral, e 20-50% das mortes por infarto do miocárdio ocorrem no paciente deprimido. Reconheceu-se a presença de atividades nas respostas imunitárias, confirmadas pelos biomarcadores de inflamação.

Se queremos, portanto, combater mais eficazmente a Covid-19, devemos absolutamente aumentar as defesas psicológicas além das imunológicas das pessoas. Uma ótima forma de prevenção seria a cessação da pressão mediática que está causando pânico e incerteza, substituindo-a com uma comunicação positiva, convidando a enfrentar com serenidade e fortaleza a eventual doença.

É evidente que se está revelando um quadro de humanidade frágil, débil, facilmente tomada de depressão, mas exatamente por isso é preciso da uma mensagem diversa, que não pode ser a de um flash mob, de vídeos patrióticos, contando com um humanitarismo vago (vai ficar tudo bem) ou com um orgulho nacionalista. Deve-se dizer que as pessoas se curam do coronavírus, na grande maioria dos casos. É preciso dar sentido à dor, ao sofrimento, ao luto. É preciso dar as razões pelas quais não devemos ter medo.

*Paolo Gulisano é um médico e escritor italiano.

© 2020 La Nuova Bussola Quotidiana. Publicado com permissão. Original em italiano.

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