A Suprema Corte dos Estados Unidos ouviu, na quarta-feira, os argumentos do processo Dobbs v. Jackson Women’s Health Organization, um caso que desafia a constitucionalidade da Lei da Idade Gestacional do Mississippi. A lei estadual proíbe a maioria dos abortos após 15 semanas de gestação.
O tempo alocado para cada lado foi estendido para que a recém-nomeada procuradora geral dos Estados Unidos, Elizabeth Prelogar, pudesse participar e incluir a oposição do governo do presidente Joe Biden às leis de proteção aos nascituros.
A maior parte do tempo para discussões foi gasta para debater se as decisões do tribunal nos casos Roe v. Wade e Planned Parenthood v. Casey deveriam ser anuladas.
A validade desses precedentes está em jogo porque o tribunal, em ambas as decisões, determinou que qualquer proibição de aborto antes da "viabilidade" (quando o feto pode viver fora do útero) é inconstitucional. A proibição do Mississippi estabelece um limite bem anterior à viabilidade, geralmente considerada em cerca de 24 semanas.
Um artigo que publicamos recentemente descreveu três resultados possíveis: A Corte mantém a proibição do aborto no Mississippi ao anular os precedentes dos casos Roe e Casey; os juízes alcançam o mesmo resultado estreitando ou modificando - em vez de anular - esses precedentes; ou o tribunal anula a proibição do Mississippi reafirmando Roe e Casey.
Embora prever o resultado final com base nos argumentos orais possa ser arriscado, os dois lados na quarta-feira despejaram um balde de água fria na segunda opção. Eles rejeitaram quaisquer "meias medidas" que possam substituir o padrão Roe-Casey por outra coisa, considerando-as impraticáveis. Em outras palavras, eles argumentaram, Roe e Casey devem ou permanecer ou ser eliminados.
A Corte estabeleceu um processo de duas etapas para determinar se um precedente deve ser anulado. O primeiro passo é determinar se esse precedente foi decidido erroneamente. Sobre isso, as palavras de abertura do procurador-geral do Mississippi, Scott Stewart, foram que Roe e Casey "assombram nosso país" e não têm nenhum fundamento no texto, estrutura ou história da Constituição.
Significativamente, nem Julie Rikelman, a advogada da clínica de aborto que desafia a lei, nem Prelogar tentaram defender qualquer um dos casos quanto aos seus méritos.
A segunda questão é se um precedente decidido erroneamente deve ser anulado, e o tribunal identificou vários fatores ou critérios para ajudar a responder a essa questão. O juiz Stephen Breyer argumentou que o tribunal deveria estar "mais relutante" em anular o que ele chamou de precedentes "divisores de águas", para que o público não pense que os juízes estão simplesmente respondendo à pressão política.
Ele pode ter admitido implicitamente que Roe e Casey não sobreviveriam à aplicação da análise tradicional do tribunal. E, como observou o presidente da corte John Roberts, a posição de Breyer na verdade sugere que quanto mais flagrantemente errado é um precedente, mais o tribunal deve resistir a rejeitá-lo.
O juiz Brett Kavanaugh explicou que algumas das decisões mais importantes da Corte haviam anulado precedentes, citando uma extensa lista de decisões que incluía Miranda v. Arizona, Lawrence v. Texas e Obergefell v. Hodges.
As citações dele também incluíam Brown v. Board of Education, que efetivamente anulou o princípio "separado, mas igual" - que dispunha sobre a segregação racial - estabelecido em Plessy v. Ferguson.
Se a Corte tivesse simplesmente se recusado a reconsiderar seus precedentes, disse Kavanaugh, "este país seria um lugar muito diferente". Ele acrescentou que "se pensarmos que os precedentes anteriores estão seriamente errados… por que então a história da prática deste tribunal com relação a esses casos não nos diz que a resposta certa é, na verdade, um retorno à posição de neutralidade… e não aderir com esses precedentes da mesma forma que todos os outros casos não o fizeram?"
Vários juízes perguntaram se as circunstâncias legais ou outras mudaram desde Casey, que foi decidido em 1992. A juíza Amy Coney Barrett observou que os estados agora têm leis de "refúgio seguro" que permitem que as mães entreguem bebês recém-nascidos a hospitais ou outros refúgios seguros designados sem processo criminal dentro de alguns dias após o parto, em vez de abandoná-los.
Barrett sugeriu que, ao separar a gravidez da paternidade, as leis de refúgio podem diminuir o que a Suprema Corte no caso Roe chamou de "prejuízo" enfrentado pelas mulheres por levar uma gravidez indesejada até o fim.
Barrett também questionou se sustentar a proibição do aborto no Mississippi levantaria necessariamente questões sobre a validade de outros precedentes da Suprema Corte.
Stewart respondeu que nenhum dos precedentes envolvendo decisões privadas ou pessoais envolveu "o fim proposital de uma vida humana". Na verdade, até o própria Roe v. Wade reconheceu que a presença do nascituro torna o aborto "inerentemente diferente" de outros direitos de privacidade.
Na linha de questionamento talvez mais chocante, a juíza Sonia Sotomayor tentou argumentar que é impossível saber se a reação da criança não nascida a estímulos físicos mostra que ele ou ela sente dor. Sotomayor alegou que "cerca de 40% das pessoas mortas, quando têm os pés tocados, o pé recua. Existem atos espontâneos de pessoas com morte cerebral. Então, eu não acho que uma resposta, por um feto, necessariamente prova que há uma sensação de dor ou que há consciência."
Ela pode não ter conhecimento da pesquisa atual sobre o assunto, que mostra que os bebês em gestação podem de fato sentir dor a partir da 12ª semana.
A questão mais importante neste caso diz respeito ao cenário adequado para todas essas questões, debates, valores e argumentos: Seria o legislativo ou o judiciário?
A menos que a Constituição diga claramente o contrário, a resposta é clara. O povo americano e seus representantes eleitos têm autoridade para lidar com essas questões e decidir sobre as respostas.
Quando a Suprema Corte as retira do povo sem autorização da Constituição, o tribunal mina sua própria credibilidade e legitimidade.
Sotomayor fez uma pergunta sobre o caso atual que na verdade se aplica melhor aos casos Roe e Casey: Como a Suprema Corte pode "sobreviver ao mau cheiro que isso cria na percepção pública, de que a Constituição e sua leitura são apenas atos?"
A resposta é: como o tribunal superior pode sobreviver sem anular Roe e Casey - decisões que criaram um direito constitucional ao aborto quase do nada?
O tribunal deve corrigir seu grave erro constitucional e anular os precedentes de Roe e Casey para que os americanos possam governar a si próprios em questões de aborto.
*Thomas Jipping é vice-diretor do Edwin Meese III Center for Legal and Judicial Studies e pesquisador sênior na Heritage Foundation. Sarah Parshall Perry é pesquisadora na área de legislação na Edwin Meese III Center for Legal and Judicial Studies na Heritage Foundation.
© 2021 The Daily Signal. Publicado com permissão. Original em inglês
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