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Fidel fala aos cubanos pouco antes de seu afastamento, em 2006: irmão assumiu | Claudia Daut/ Reuters
Fidel fala aos cubanos pouco antes de seu afastamento, em 2006: irmão assumiu| Foto: Claudia Daut/ Reuters

A ilha de fidel

Fidel Castro ainda influencia a política cubana, mesmo fora do poder. Veja os principais momentos de sua relação com a ilha:

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Mesmo que se converta em distensão política o ensaio de abertura econômica promovido ao longo de 2008 por Raúl Castro – que assumiu definitivamente o governo de Cuba com a renúncia do irmão Fidel, em fevereiro, e autorizou a compra de computador e celular –, uma geração terá de transcorrer para que a população saia sem medo às ruas para manifestar opinião. A avaliação é de Estevão Martins, professor de História Contemporânea e Relações Internacionais da Universidade de Brasília.

Na próxima quinta-feira, completa-se 50 anos da tomada de Havana por Fidel Castro e seus companheiros, que substituíram um regime ditatorial tutelado pelos EUA por um governo unipartidário marcado pelo rompimento com os norte-americanos e a aproximação com a União Soviética.

Desde 1962, os EUA impuseram um duro embargo econômico contra a ilha, que somou-se à prática comunista de nivelamento social (em que todos são iguais, mas uns são mais iguais que os outros) para erigir uma situação contraditória: não há desnutrição na ilha, de acordo com a Organização Mundial da Saúde. Mas também não se come à vontade num país em que um litro de leite custa US$ 2,50. Para além das questões materias, o professor Martins identifica a principal carência dos cubanos como reaprender a participar de um regime democrático de pensamento. "Há uma forte infantilidade política", diz.

Entre as exceções está a blogueira Yoani Sánchez, para quem o contexto revolucionário cubano morreu há muito tempo, deixando no poder um cadáver. "As revoluções não duram meio século. Terminam por devorar a si mesmas e excretar autoritarismo, controle e imobilidade", escreveu dia 13 de dezembro em seu blog "Generación Y".

Uma das estratégias do centro de poder da ilha – militares ligados aos irmãos Castro – para se perpetuar é o controle da informação. A pós-doutoranda do departamento de História da USP Mariana Villaça destaca a falta de liberdade na educação, com aulas tendenciosas e a influência do regime até na escolha profissional. "O filho de uma amiga cubana que emigrou para o Brasil não havia aprendido nada sobre absolutismo na escola, pois o tema suscita reflexões sobre autoritarismo e permanência no poder", exemplifica. Mais uma contradição num país com taxas altíssimas de jovens que terminam o estudo secundário.

O jornalista Roger Cohen dá outro exemplo em "O fim do fim da revolução", artigo publicado na revista do New York Times dia 5 de dezembro. Ele cita um outdoor eletrônico instalado dentro do escritório de interesses norte-americano para veicular informações consideradas inacessíveis aos cubanos. A idéia fracassou porque o governo instalou mastros com bandeiras bem em frente, impedindo a visão.

Por enquanto, nada indica que haja abertura ideológica. No ano passado, os 200 atletas cubanos que participaram dos Jogos Panamericanos no Rio de Janeiro foram levados embora às pressas antes das premiações para evitar mais fugas, após a deserção de quatro esportistas. Não faz tempo que três fugitivos foram executados e 75 dissidentes presos, em 2003.

O médico cubano Abel Borroto, que saiu de Cuba com autorização para trabalhar na Argentina e no Brasil há 11 anos, ressalva que o regime tem seus pontos positivos. "Em 1991, todo o país estava alfabetizado", destaca. "No começo a revolução foi boa. Fidel proibiu a prostituição e tirou a pobreza das ruas." Ele tinha 12 anos quanto o poder foi tomado pelos guerrilheiros.

Futuro

A expectativa de analistas é que, no longo prazo, forme-se uma nova ordem política na ilha. Existem movimentos dissidentes, como o "Projeto Varela" e o "Todos Unidos". Entre os exilados em Miami ("gusanos") há aqueles organizados em partidos, ONGs e fundações que desejam reaver as propriedades confiscadas durante a revolução e chegar ao poder.

Eles vêm pressionando o presidente eleito dos EUA, Barack Obama, para ampliar sua promessa de campanha – de aliviar restrições como viagens de cubano-americanos à ilha e relacionadas ao envio de dinheiro – e incluir o fim do embargo.

"Tenho a esperança de que, numa possível abertura democrática, ainda que tardia, esses setores cresçam com apoio da população", diz a professora Mariana Villaça. Quem sabe daqui a uma geração.

Abertura econômica parcial frustra expectativa de cubanos

Ao mesmo tempo em que a permissão de comprar telefones e celulares e se hospedar em hotéis no país, instituída por Raúl Castro pouco depois da renúncia de Fidel, em fevereiro, estimulou a esperança de abertura econômica na ilha comunista, ela trouxe mais uma frustração à população. "Ninguém tem dinheiro para comprar essas coisas", diz o professor de história contemporânea da UnB Estevão Martins.

Entre as outras carências, ele destaca a falta de infra-estrutura, eletricidade estável, meios de transporte... e a lista segue adiante.

A falta de medicamentos e equipamentos médicos prejudica o bom sistema de saúde.

Metade do que se come na ilha é importado, o que explica a restrição alimentar. A maior parte da população recebe em pesos cubanos, enquanto turistas trazem os preciosos dólares. "O país precisa da abertura comercial para sua própria sobrevivência", diz a professora Villaça.

"O caminho seria recuperar a indústria da cana-de-açúcar (até os anos 80 o açúcar era a maior fonte de renda do país), mas sem o mito de que o etanol substitui as lavouras de alimento", diz Martins.

O papel de tutor exercido pela União Soviética até seu colapso em 1991 hoje é parcialmente suprido pela Venezuela, parceira ideológica no que tange ao autoritarismo latino. "Vejo a possibilidade de que se estabeleça algo parecido com a China (uma economia de mercado num regime unipartidário), mas sem os recursos de que a China dispõe e dependendo ainda durante um bom tempo de parceiros econômicos", diz a professora Villaça.

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