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Depois de dar um passo para trás por causa da rejeição popular à proposta de adoção de uma Constituição, em 2005, a União Europeia vai voltar a avançar em sua integração a partir do próximo mês, com a implementação do Tratado de Lisboa.

Por mais que este projeto não traga nenhuma mudança drástica na estrutura e organização do grupo dos 27 países do continente, ele pode ser visto como um avanço quase equivalente ao revés de quatro anos atrás, segundo analistas ouvidos pelo G1, pois o tratado repete pelo menos 90% da proposta da Constituição. E a maior mudança é simplesmente o nome.

"A constituição soava como um documento nacional, não como algo de uma organização intergovernamental. O Tratado de Lisboa traz quase todas as mesmas mudanças da constituição, mas com um nome diferente. Pode parecer uma questão trivial, mas é claramente um dos principais problemas", explicou, em entrevista ao G1, o professor da Universidade Creighton, nos EUA, Stephen C. Sieberson, que pesquisou o tratado e é autor do livro "Dividing lines between the European Union and Its member states: The impact of the treaty of Lisbon" (Linhas divisórias entre a União Europeia e seus estados membros: O impacto do Tratado de Lisboa).

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Segundo ele, a substância do tratado é 99% igual à da constituição. O problema é que a União Europeia está dividida em dois grupos: os federalistas, que preferem ter um governo mais central, um "superestado", com modelo semelhante ao dos Estados Unidos; e os intergovernamentalistas, palavra complexa para designar o grupo que insiste que as nações continuem totalmente soberanas, mantendo a UE como uma organização intergovernamental. Este segundo grupo, capitaneado pelo Reino Unido, fez forte oposição ao termo constituição. Para Sieberson, os que buscam uma maior integração, mesmo que não necessariamente uma "federação", saíram-se vencedores com o Tratado de Lisboa. "Ele traz as mudanças necessárias para que a EU não fique estagnada, mas possa evoluir.

Especialista em integração europeia, o professor David Phinnemore, da Universidade de Belfast, na Irlanda do Norte, discorda. Para ele, os intergovernamentalistas se saíram muito bem com o tratado, pois ele reitera a centralidade dos países membros na UE.

"Ele nos lembra que se trata de uma organização internacional com base nos Estados, que podem dar e tirar o poder da UE. Pode parecer que a Europa está se aproximando de um formato mais federalista, mas o poder, especialmente em relações internacionais, continua nas mãos dos países individualmente", disse, em entrevista por telefone. Para Phinnemore, o Tratado de Lisboa é "apenas" 90% igual à constituição, e houve uma mudança na linguagem que vai além do nome.

Os dois concordam, entretanto, na ausência de efeitos práticos e imediatos advindos da implementação. "O tratado cria oportunidades para uma maior integração, mas não garante que essas oportunidades serão aproveitadas, pois isso vai depender das negociações que vão surgir a partir dele. A aproximação recente entre os países da UE foi maior e mais rápida do que se esperava, mas não é possível saber como vão evoluir a partir de agora", disse Pinnemore.Exemplo de integração

Os pesquisadores explicaram que, no curto prazo, nada vai mudar nas relações da Europa com o resto do mundo, pois o tratado é apenas uma moldura para conduzir políticas. O tratado não muda nada na política, mas apenas o processo de aplicação das políticas, disseram.

Mais adiante, entretanto, a União Europeia pode ter fortes implicações para o hemisfério ocidental, incentivando o fortalecimento de outros grupos entre nações. "Mercosul e Nafta podem olhar para a Uniao Europeia como exemplo do seu futuro", disse Sieberson. "Não é nada que vai acontecer rapidamente, mas A UE mostra como um grupo de países pode se reunir e dividir sua soberania, tornando-se mais bem sucedidos. Isso vai ajudar a Argentina, o Brasil, oChile e toda a America do Sul a ver o que é possível no futuro. Estamos aprendendo com a UE."

O que vai interessar diretamente e de forma mais rápida a países como o Brasil é a escolha do alto representante da União Europeia, detalhou o pesquisador irlandês. "Se Javier Solana for escolhido para liderar a política externa do grupo, sua influência ibérica pode aproximar a Europa da América Latina mais de que alguém que venha de outras áreas do continente", disse Phinnemore.

Na prática, as mudanças do Tratado de Lisboa são mais institucionais e estruturais, sem mudar completamente a UE e sua força e influência internacionais. "Não vai mudar nada na relação com o Brasil nem ter uma política externa central. O Brasil vai continuar negociando suas relações internacionais individualmente com países como França e Espanha, por exemplo", explicou Sieberson.

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