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Em 2016, a então candidata democrata à Presidência dos EUA, Hillary Clinton, era investigada pelo FBI por usar servidor de e-mail privado enquanto era secretária de Estado.  James Comey, na época, era diretor do FBI | BRENDAN SMIALOWSKIAFP
Em 2016, a então candidata democrata à Presidência dos EUA, Hillary Clinton, era investigada pelo FBI por usar servidor de e-mail privado enquanto era secretária de Estado.  James Comey, na época, era diretor do FBI| Foto: BRENDAN SMIALOWSKIAFP

Imagine um investigador da polícia federal, à frente de um dos inquéritos mais controversos do país, enviar uma mensagem a outro colega, às vésperas de uma eleição, dizendo que um determinado candidato à Presidência "não pode ganhar". 

"Não, ele não irá. Nós vamos impedi-lo", comenta outro.

E, depois da vitória deste mesmo candidato, um lamento: "Não consigo parar de chorar. O que poderíamos ter feito de diferente?".

Foi isso que aconteceu nos Estados Unidos, durante a eleição presidencial de Donald Trump, em 2016. Uma situação que, segundo um relatório divulgado nesta quinta-feira (14) pelo Departamento de Justiça, configura falta de profissionalismo e discernimento, e coloca em risco a reputação do FBI, a polícia federal americana.

"A conduta desses empregados lança uma nuvem sobre a investigação e semeia dúvidas sobre o trabalho do FBI a respeito dela", afirma o relatório, assinado pelo inspetor-geral do Departamento de Justiça, Michael Horowitz -uma espécie de corregedor do órgão. 

"Além disso, os danos causados por essas ações se estendem [...] e atingem o coração da reputação do FBI de independência política e neutralidade de apuração." 

O alvo do relatório, que tem pouco mais de 500 páginas e levou quase um ano e meio para ser concluído, era o inquérito do FBI sobre os e-mails da ex-secretária de Estado, e então candidata à Presidência, Hillary Clinton. O objetivo da investigação era verificar se a democrata usou um servidor privado para debater assuntos classificados do governo americano, o que configuraria crime contra a defesa nacional.

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O FBI acabou arquivando a investigação, pouco antes das eleições presidenciais de 2016, numa decisão que levantou controvérsias e suscitou a investigação do inspetor-geral, Michael Horowitz.

Conclusão sobre o arquivamento

Não havia nada de errado no arquivamento, segundo Horowitz. O inspetor disse que a decisão era "consistente com o histórico do Departamento de Justiça" em casos semelhantes, e que ela foi "baseada nos fatos e na lei".

De acordo com o relatório, o desfecho do inquérito foi técnico, e não foi influenciado por eventuais inclinações políticas dos investigadores.

Mas o inspetor levanta o alerta contra o que chama de "falta de profissionalismo" e um "estado de espírito tendencioso" dos investigadores.

As mensagens de texto citadas no documento foram enviadas pelos servidores a partir de celulares oficiais, e demonstram aberta hostilidade a Trump e uma torcida por Hillary, em meio a discussões sobre a própria investigação.

"Terminei de interrogar o presidente", diz um dos agentes, em julho de 2016. "Você entrevistou o presidente?", responde seu interlocutor, um outro empregado do FBI. "Você sabe... HRC [Hillary Rodham Clinton]. Futura presidente."

Um outro agente comenta notícias sobre a investigação dos emails e a repercussão na imprensa de uma crítica de Trump a respeito. "Trump [emoji de nojo]. Americano médio [emoji de nojo]", afirma.

Na troca de mensagens mais controversa, o agente do FBI Peter Strzok, então à frente da investigação sobre a influência da Rússia nas eleições (ainda em andamento), conversa com uma colega inconsolável, que escreve: "[Trump] nunca irá ser presidente, certo? Certo?!"

"Não. Não será. Nós iremos impedi-lo", afirma, em agosto de 2016.

O relatório reforça que não foi encontrado nenhum indicativo de que os agentes tenham sido motivados por preferências políticas ao conduzir suas investigações no FBI, e referenda as conclusões relativas ao inquérito de Hillary.

Horowitz também ressalta que não se impede que os policiais tenham um posicionamento político, ou que manifestem suas opiniões, conforme os princípios de liberdade de expressão nos EUA.

Mas o inspetor afirma que o FBI pode impor certas restrições aos seus servidores "no interesse de um governo efetivo e eficiente", em especial quando são fatos que envolvem indivíduos ligados a uma investigação em andamento.

O que diz o FBI

O relatório faz algumas recomendações ao FBI, como a de monitorar mensagens trocadas no âmbito do departamento e orientar os agentes sobre comentários e anúncios a respeito de investigações que podem impactar uma eleição.

Em resposta, o ex-diretor do FBI, James Comey, que estava à frente do inquérito, afirmou que respeita as conclusões do inspetor-geral, embora discorde de algumas. 

A atual direção do FBI admitiu os erros, mas ressaltou que eles não resultaram em conclusões impróprias durante as investigações.

O órgão informou que irá abrir processos administrativos contra os agentes mencionados no relatório e que irá reforçar sua política de objetividade. "Esses erros nunca serão repetidos", declarou Christopher Wray, atual diretor do FBI.

O agente Strzok, que escreveu que iria "impedir" Trump de vencer, foi removido das investigações no ano passado, depois que parte de suas mensagens veio a público. Os outros agentes não foram identificados no relatório.

Já o governo Trump, que protagoniza uma queda-de-braço contra o FBI e as investigações que podem respingar na campanha do republicano, informou que o relatório "reforça as suspeitas de viés político de alguns membros do FBI".

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Comey é o pior do FBI, diz Trump

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, usou sua conta no Twitter na manhã desta sexta-feira para criticar James Comey, ex-diretor do FBI demitido por ele em maio de 2017. "Comey agora será oficialmente rebaixado como o pior líder, de longe, do FBI", afirmou Trump. "Eu fiz um grande serviço ao demiti-lo."

Trump se refere ao relatório do inspetor-geral. De acordo com o relatório, Comey "desrespeitou" normas ao lidar com uma apuração sobre e-mails da ex-secretária de Estado Hillary Clinton, que disputou a presidência com Trump. Hillary costuma citar a condução do caso pelo FBI como uma das razões de sua derrota. 

Segundo o presidente, o atual diretor do FBI, Christopher Wray, é a pessoa certa para retomar a credibilidade da instituição. Ele ainda comentou outro ponto do relatório do inspetor-geral, que diz que um agente do FBI, Peter Strzok, fez críticas ao então candidato republicano em conversas com a advogada do FBI Lisa Page. Strzok afirmou, segundo o relatório, que "nós iremos barrá-lo", sugerindo que trabalharia pela derrota de Trump na disputa nas urnas. "Não dá para ser mais baixo que isso!", lamentou.

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