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As providências de austeridade monetária e fiscal lançadas pelo Ministério da Fazenda, que devem resultar em economia de R$ 43 bilhões, ou 0,7% do Produto Interno Bruto (PIB), diante de compromisso de 1,2% do PIB para o exercício de 2015, em paralelo ao panorama de contração dos níveis de atividade, delineiam o arrefecimento do eixo dinâmico da economia brasileira, sustentado durante 11 anos pelo consumo do governo e das famílias.

O boom de consumo, instaurado pelo atendimento da demanda reprimida, com a desinflação provocada pelo plano real, ganhou contornos de mobilidade social a partir de 2004, com o reforço do acréscimo do poder de compra do salário mínimo, da proliferação das ações institucionais de transferência de renda e do crédito consignado descontado na folha de salários dos tomadores.

Contudo, a viga mestra desse processo esteve assentada na poupança externa, proveniente da valorização dos termos de troca, com a impulsão da demanda e dos preços das commodities agrícolas, minerais e metálicas, entre 2004 e 2008, em função da escalada da China, hoje o maior mercado consumidor do mundo, e em crescentes déficits na conta de transações correntes depois da eclosão da crise financeira internacional.

Pela ótica fiscal, o roteiro oficial sugere a busca de reparação dos erros cometidos entre 2010 e 2014, sem qualquer aceno acerca do aproveitamento de oportunidades ou da descoberta de elementos de transformações. De fato, o pacote anunciado pelo ministro Levy, que estava pronto há algum tempo aguardando apenas o desfecho favorável da disputa eleitoral, não conseguiu escapar da aplicação da terapia ortodoxa tupiniquim na gestão das finanças públicas.

O receituário brasileiro é tradicionalmente mais inclinado à elevação da arrecadação pela via fácil da retirada de haveres da órbita privada, com novos aumentos de impostos, e menos sensível à necessidade de contenção e racionalização dos gastos governamentais, limitada presentemente às alterações de regras de alguns benefícios sociais.

Na área de tributos, na sequência do fim do incentivo da redução do IPI na compra de bens de consumo duráveis, busca-se receita adicional de R$ 20,6 bilhões com a duplicação do IOF – de 1,5% para 3% –, a cobrança do PIS/Cofins e da Cide sobre combustíveis, a elevação de 9,25% para 11,75%, da alíquota do PIS/Cofins para as importações, o provável reajuste superior a 30% nas tarifas de energia elétrica, e a correção em 4,5% (e não 6,5%, conforme determinava o Congresso Nacional) da tabela do IRPF.

O pedaço monetário do conjunto de deliberações contém a majoração da TJLP, dos juros praticados pela Caixa Econômica Federal no financiamento habitacional e da Selic (para 12,25% ao ano, em janeiro de 2015). Esta última medida, adotada a pretexto de sufocar as tensões inflacionárias, serve prioritariamente para viabilizar a rolagem da dívida pública e segurar a depreciação do real, diante da ampliação da entrada de capitais estrangeiros de curto prazo, à procura de ganhos com as operações de arbitragem.

Nessas circunstâncias, parece lícito supor a interrupção do ciclo expansivo movido a consumo no Brasil em detrimento do investimento, que seria preponderante na recuperação da eficiência da indústria e da infraestrutura e o atestado exclusivo de garantia do giro da roda em médio e longo prazo.

Gilmar Mendes Lourenço, economista, professor e editor da revista Vitrine da Conjuntura da FAE.

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