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 | Felipe Lima
| Foto: Felipe Lima

Esta crise sem precedentes no Brasil é a mãe de todas elas. Isso nos leva a refletir se nós, brasileiros, somos mais corruptos ou mais tolerantes com a corrupção que outras nacionalidades. Ou seja, como explicar o drama de termos chegado até este extremo em que uma parcela muito importante da classe política e do empresariado brasileiro está envolvida?

Em primeiro lugar, seria ingênuo imaginarmos que a corrupção só existe por aqui. Ela está presente em todos os países do globo. Em todos, e sem exceção. Também não acho que o brasileiro seja mais corrupto que o americano, o alemão ou o japonês.

Dito isso, o que temos aqui – e que talvez nos diferencie dos outros – é aquilo que eu chamo de “corrupção das pequenas coisas”. Ou seja, são atos menores e deliberados de corrupção presentes no nosso cotidiano, e que fogem do nosso tribunal de consciência. São atos cuja percepção de dano em consequência deles é mínima ou inexistente. Dizem que, se nós agíssemos como se estivéssemos constantemente sendo observados, eles deixariam de existir. Talvez por isso o debate ético, no início, tenha sido mais desenvolvido no âmbito religioso, com um Deus onipresente e vigilante sobre nós.

O PT e seu macunaíma são o fruto podre de uma sociedade que tolera muito as corrupções das pequenas coisas

Eu sou médico. Dia desses, entrei no elevador de serviço de um hospital em Curitiba. Fiquei surpreso ao perceber que entraram no mesmo elevador de serviço cinco pessoas de uma mesma família que tinham ido visitar um paciente internado. O elevador parou, então, no primeiro andar e – surpresa – havia uma maca com um paciente que precisava ir para a UTI e que não teve como entrar por falta de espaço! Ultrapassar os limites de velocidade, estacionar em local exclusivo para idosos, não devolver o troco, pedir atestados falsos, não dar recibos, colar na prova... Afinal, quem não tem pecados que atire a primeira pedra!

Claro, todos esses “pecadilhos” cotidianos não estão presentes apenas no Brasil. Mas aqui temos um tribunal de consciência que talvez seja menos rígido que em outras sociedades. As razões para isso podem estar na nossa colonização predatória ou na baixa autoestima crônica do brasileiro, que sempre acha que o que vem de fora é melhor? Precisaríamos, assim, de uma forma de compensação? Darwin ou Freud podem explicar isso? As nossas reconhecidas virtudes de tolerância com as diferenças, receptividade e alegria nos fizeram menos combativos também com aquilo que está errado? Estou exagerando? Sendo ingênuo? Então vamos lá...

Em um jantar em uma casa de amigos, um desconhecido nos diz que está com dificuldades, porque agora está tendo de dar recibos. Antes era mais fácil. Algo corriqueiro. Corriqueiro? Morei durante anos na Itália. Na Itália da Máfia e da Operação Mãos Limpas! E nunca escutei isso por lá. Os italianos queixavam-se, sim, de ter de pagar muitos impostos, mas colocarem abertamente formas de não os pagarem, de burlar as regras, isso eu sinceramente não vi. Se buzinarmos no trânsito para alguém que está errado, qual é a sua reação? Na maioria das vezes, responder com uma agressão verbal (ou mesmo física!).

Não quero com isso eximir a culpa do PT ou do seu macunaíma. E de tantos outros em todos os outros partidos. Eles são o fruto podre de uma sociedade que tolera muito as corrupções das pequenas coisas e que hoje se vê atônita, envergonhada e indignada com as grandes corrupções que hoje também estão no nosso cotidiano. Elas afetam nossa autoestima e comprometem a esperança de um país melhor. Raul Seixas, em um dos seus momentos de genialidade, dizia que quem não tem presente se conforma com o futuro.

As novas gerações podem mudar isso. Aos meus alunos eu sempre digo que reduzam sua tolerância com a corrupção das pequenas coisas. A banalidade do mal começa com elas. Macunaíma e sua criatura, mais cedo ou mais tarde, se vão. Deixarão, infelizmente, um dos capítulos mais tristes e vergonhosos da história republicana brasileira. Mas a história tem o mau hábito de se repetir onde não se aprende com ela. Afinal, a grande mudança é moral!

Cicero Urban, médico oncologista e mastologista, é professor de Bioética e de Metologia Científica na Universidade Positivo e vice-presidente do Instituto Ciência e Fé em Curitiba.
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