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Antes mesmo de empossado na pasta da Educação, Renato Janine Ribeiro já se transformara no ministro mais aplaudido do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff. Unanimidade que até superou o anúncio de Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda, recebido como salvador da pátria pelo empresariado e oposições, embora visto com enorme desconfiança pelas agremiações da esquerda governista, sobretudo o PT.

Este observador teve o privilégio de participar de uma entrevista com o ministro indicado uma semana antes da sua posse e verificar o acerto da escolha. Trazer um filósofo e professor de Ética para o primeiro escalão é sempre temerário, ainda mais num momento de incrível acirramento politico, transgressões retóricas, descontentamento popular com a incrível sucessão de escândalos, estresse econômico e um saldo de mágoas que o fim da temporada eleitoral ainda não cicatrizou.

Pois é justamente em momentos de desnorteamento e intranquilidade que os filósofos tornam-se indispensáveis e o simples ato de convocá-los, tão simbólico. Com isso não se pretende colocar em segundo plano os gestores e “operadores”, milagreiros da ação, solucionadores emergenciais. Um dos primeiros tópicos levantados na entrevista foi uma observação do próprio Janine Ribeiro num artigo seu da semana anterior na Folha de S.Paulo em que aponta uma situação clássica na administração pública brasileira, quando o chefe determina: “resolva o problema, não quero saber como”.

É justamente em momentos de desnorteamento e intranquilidade que os filósofos tornam-se indispensáveis e o simples ato de convocá-los, tão simbólico

Neste “não quero saber como” reside a traiçoeira armadilha em que uma solução apropriada perverte-se e, dramaticamente, se transforma em problema ainda mais angustiante. O modo de operar – o fazer funcionar – não pode confrontar o teor da solução. Entre nós é o que geralmente acontece.

Um filósofo – e, sobretudo, um filósofo imbuído das ideias e concepções socráticas – é capaz de identificar essa aberração mandonista que despreza as virtudes dialogais. Isso não impede que cientistas sociais oriundos de outras esferas do conhecimento tenham insights tão reveladores sobre os subtextos que comandam nossas ações. Mas um pensador treinado para continuamente questionar-se tem sobre aqueles algumas vantagens, sobretudo quando também é professor, um estimulador de aprendizados.

Com simplicidade, bonomia e extrema lucidez, o encarregado de dar forma ao projeto da “pátria educadora” foi desfiando outras percepções, aparentemente corriqueiras, mas essenciais para desativar a atual crispação política. Entre elas, a adoção do delay como forma de reagir. Assim como admitimos como perfeitamente naturais as demoras entre perguntas e respostas nas transmissões digitais (inclusive e/ou principalmente na tevê), assim também deveríamos aceitar o delay como método de interlocução – em vez de reagir sem pensar, por que não pensar antes de reagir furiosamente?

Num momento em que políticos e autoridades imitam técnicos de futebol e atletas, obrigando-se a cobrir a boca com a mão para impedir que suas palavras sejam captadas a distância pelos especialistas em comunicação labial, a transparente e cândida exposição do futuro encarregado de tocar o país para o futuro descortina um novo momento humanista. Merecemos.

Alberto Dines é jornalista.
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