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Felipe Lima

A turbulência não tem fim. A ciranda dos brasileiros parece ser embalada pelo ritmo dos noticiários que a cada momento trazem à luz o que fazem, sorrateiros, muitos políticos, empreiteiros, fiscais, frigoríficos e outros mais. O assunto é de dar náuseas em qualquer cidadão de bem, mas não podemos deixar de questionar: a que nível de depravação moral uma sociedade precisa chegar para realizar absurdos como estes que estamos acompanhando? Qual a ética que orienta a conduta de sujeitos que sentem-se no direito (quase legítimo, em suas mentes) de subornar, extorquir e adulterar para conseguir satisfazer seus desejos insaciáveis de poder? Certamente, ética nenhuma.

O problema é que todo ser racional – dito, portanto, humano – tem como característica de sua própria natureza esta capacidade peculiar de avaliar as situações e julgá-las entre correta ou incorreta, boa ou má. O que leva um sujeito que, no exercício de sua função, se desvia de qualquer finalidade honesta e envereda por caminhos tortuosos, operando atos escusos? Em algum momento da formação humana e social desse sujeito houve uma falha, acarretando em um prejudicial desvio de caráter. Só isso pode explicar tamanha incongruência.

Há uma onda crescente de desconfiança entre os indivíduos e as instituições, privadas ou não

Mas o problema não para por aí. Ao identificar condutas patológicas como uma característica endêmica em nossa sociedade, um dos principais pilares que dá suporte e possibilita a vida social acaba por ser comprometido: a confiança. As recentes descobertas realizadas por investigações protagonizadas pela PF e pelo MPF têm ocasionado um tipo de “mal-estar na civilização”, gerando, inevitavelmente, uma onda crescente de desconfiança entre os indivíduos e as instituições, privadas ou não.

A confiança, na análise sociológica, é o elemento preponderante que garante a vida em grupo. Foi graças à confiança estabelecida entre os indivíduos que a raça humana deixou aquele terreno insólito de barbárie e ingressou em uma vida coletiva e organizada politicamente. Hoje, cercados por escândalos e mais escândalos, a confiança corre sério risco de se tornar um fenômeno cada vez menos presente no âmbito social. As consequências podem ser inimagináveis.

Quando aceitamos a violência como fatalidade; quando não punimos os corruptos com penas mais duras – afinal, a corrupção gera miséria e, não raras vezes, a morte –; quando aceitamos o argumento de quem não tem argumento, o famoso “bandido bom é bandido morto”; quando cruzamos os braços e pensamos que não podemos alterar este quadro, estamos sendo coniventes com a situação.

Agonizantes em um mar de lama, pessoas comuns tentam entender como a banalidade tomou conta da conduta humana. Por certo, o espírito (intelecto, psique) pode estar preparado, mas a carne é fraca. O sujeito pode ser dotado de racionalidade, mas desenvolver um tipo de racionalidade instrumental que põe os interesses de ordem econômica acima dos interesses humanos. Uma racionalidade instrumental é típica da cultura moderna, capitalista e industrial, que ignora o ser humano em proveito do mercado. A lógica cruel que alimenta a corrupção é reforçada por uma educação que muitas vezes prepara o aluno apenas para o mercado de trabalho e não para a vida em sociedade. Como bem vimos, a carne é fraca, mas ainda há quem procure ser melhor.

Edimar Brígido é filósofo e professor de Ética no Unicuritiba.
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