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O arcabouço jurídico e o papel controlador do Estado são instrumentos indispensáveis para que uma sociedade prospere e direcione suas prioridades de maneira minimamente equilibrada e voltada à obtenção de resultados de interesse público. Encontram-se, neste contexto, as ações de fiscalização ambiental e as discussões sobre prioridades e condicionantes para obras de infraestrutura e novos empreendimentos econômicos. Também fazem parte desta agenda de responsabilidades os investimentos de cunho social, dentre eles a garantia de um meio ambiente equilibrado, como sustenta a Constituição Federal.

No Brasil, um conjunto de leis mais evoluído e moderno a partir da década de 80 abre novas perspectivas de regramento e estabelecimento de parâmetros para a condução adequada de empreendimentos geradores de impactos ambientais. Somos um dos países que mais conquistaram avanços nesta área nas décadas passadas. Por outro lado, o estabelecimento de parâmetros ambientais para regrar empreendimentos é visto por parte da sociedade como uma barreira para o alcance de metas de desenvolvimento. A extrapolação das ações de influência no arranjo jurídico e na condução da gestão pública, a partir de setores interessados em agendas mais específicas, representa um enorme risco de desvio de conduta, gerando perdas econômicas e sociais coletivizadas, que não poderiam ser admitidas em nenhuma hipótese.

É preciso que haja um correto entendimento entre a enorme disparidade entre a delegação de responsabilidades para a criação de um Estado mais leve e focado no estratégico e a perpetuação de uma condição de incapacidade, que permite a conivência com o atendimento de interesses que deveriam ser submetidos a criteriosos processos de avaliação. Da mesma maneira, fiscalizar o cumprimento das leis não pode ser subvertido como uma prática acusada de dificultar os negócios daqueles que não as respeitam.

Essas inversões de valores nos arrastam para uma situação de degradação crescente do patrimônio natural e da própria sociedade.

Aqui no Paraná, observamos um cenário de extremas dificuldades, em que representantes de interesses da iniciativa privada ditam as prioridades do governo e a condução das decisões dos órgãos ambientais, hoje destituídos de estrutura, identidade e independência -- qualidades absolutamente necessárias para uma agenda coerente de atuação. Um capital humano experiente é impedido de desempenhar suas atividades, pautadas por desmandos continuados, de gestão em gestão. Em vez de garantir processos transparentes para atingir objetivos de desenvolvimento, a escolha do governo pelo desmonte das estruturas de licenciamento e de controle é caminho típico de visões viciadas e de curto alcance. Ano que vem, após as aposentadorias vindouras, o Instituto Ambiental do Paraná (IAP) deve contar com o máximo de 300 servidores. Há 22 anos não são integrados novos colaboradores à instituição.

Não fiscalizamos os nossos remanescentes naturais, que continuam a ser destruídos ilegalmente. Não criamos ferramentas para estimular a conservação dessas áreas, apesar de compromisso formal assumido pela gestão atual. Processos de licenciamento de obras de infraestrutura e novos empreendimentos são praticamente impostos a um acatamento régio dos órgãos de meio ambiente, hoje pressionados no limite em sua capacidade de isenção.

Se este é o modelo de desenvolvimento e progresso que desejamos, como uma vontade soberana de toda a sociedade, então não deverá acontecer qualquer mudança de rumo. As práticas de séculos passados darão o tom de nossas gerações atuais, cada vez mais endividadas com os que nos sucederão por estas terras maltratadas, de gente que precisa, urgentemente, repensar seus valores.

Clóvis Borges é diretor-executivo da Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS).

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