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A praça de “alimentarização” do mundo corporativo
| Foto: Pixabay

“Diversidade” é uma das palavras de ordem do mundo corporativo moderno. “Quanto mais diversa é uma empresa, melhor!”, dizem. Alguns críticos retrucam que isso não passa de sinalização de virtude, uma aderência ao espírito do tempo, visando atender às últimas modas ideológicas, mas eu diria que vai um pouco além.

O argumento teórico pró-diversidade é o de que, se uma empresa quer ser grande e ter muitos clientes, ela precisa ter uma grande diversidade interna; afinal, o perfil dos clientes é diverso. Assim, a diversidade traria um enriquecimento dos pontos de vista de dentro da empresa, tornando-a mais capaz de se adaptar às demandas (diversas) dos clientes.

Apesar de fazer sentido, na prática o que vemos é uma homogeneização (e não diversificação) das ideias. As empresas contratam funcionários de etnias, gêneros e religiões diferentes que, no fim do dia, repetem exatamente as mesmas ideias e mantras. Mais do que isso, os departamentos de diversidade de empresas brasileiras, americanas, europeias etc. também repetem exatamente os mesmos clichês sobre o assunto. Os mercados brasileiro, americano e europeu são iguais? Ou diferentes exatamente na mesma medida?

Apesar de a diversidade ser pregada no nível das ideias, ela não vai além das aparências: as capas podem ser diferentes, nunca o conteúdo. É como uma praça de alimentação de shopping center. Nela, há várias opções: chinês, francês, italiano, mexicano, mas não importa o produto, se rolo primavera, crepe, ravioli ou taco, todas as opções são fast-food de massa recheada.

Peguemos o caso mais recente do Nubank. O investimento em “diversidade” da empresa não é simplesmente para ganhar mais clientes, o que já vinha acontecendo em ritmo acelerado: cumpre uma função mais próxima do jurídico ou do marketing da empresa, defendendo o banco das críticas de grupos identitários ou promovendo anúncios nas redes sociais. Se o Nubank for acusado de alguma nova heresia, poderá se defender alegando que investe zilhões em diversidade, mesmo que o impacto dessas ações seja apenas na capa, não no conteúdo. Afinal, não importa qual é o departamento de diversidade, eles falam exatamente as mesmas coisas, independentemente da empresa, setor ou país.

Por que isso ocorre e ninguém parece nadar contra a corrente? A resposta completa talvez exigisse outro texto, ainda mais “cancelável” que esse, mas o livro As 48 Leis do Poder, de Robert Greene, nos ajuda a começar a responder a questão. Na obra, o autor traz 48 leis a serem seguidas, baseadas em lições tiradas de grandes líderes e personagens históricos. É uma espécie de manual do neomaquiavelismo. Seguem, então, algumas leis que nos ajudam a compreender os movimentos de homogeneização do mundo corporativo.

A lei 38 diz: “Pense como quiser, mas se comporte como os outros”. Nesta lei, o autor destaca que não vale a pena se colocar contra o status quo. Isso só atrai desconfiança, e as pessoas acham que você se acha superior ou só quer chamar atenção. Assim, não é que todos concordem com as evidentes contradições do mundo corporativo, mas apenas que não valeria a pena se colocar contra o espírito do tempo, de modo que os identitários podem falar livremente, sem oposição. Seria uma vitória por WO, quando os adversários não dão as caras.

Assim, não é que todos concordem com as evidentes contradições do mundo corporativo, mas apenas que não valeria a pena se colocar contra o espírito do tempo

A lei 43 afirma: “Trabalhe com o coração e a mente dos outros”. Nesta lei, o autor aponta que é preciso seduzir as pessoas para fazê-las trabalhar para sua causa. Hoje, nenhuma empresa diz vender um produto, mas sim experiências, valores etc. A ideia é fazer com que o “colaborador” (empregado) não trabalhe apenas pelo salário no fim do mês, mas que se sinta motivado e identificado com a “experiência” e os “valores” da empresa. O mesmo vale para o cliente, que também não consome apenas um produto, mas também “experiências” e “valores”.

Nesse ponto, a “diversidade” é um dos principais valores a serem exaltados. Afinal, uma empresa “diversa” é uma empresa de todos, não? A essa altura, já está bem claro o porquê de essa diversidade estar mais próxima de homogeneidade que da heterogeneidade de pensamento, mas essa lei traz algo a mais.

A pessoa que entra de cabeça em grupos de militância identitária coloca a sua característica coletiva como a coisa mais importante da sua vida. Tudo vira um reflexo dessa categoria, elevada artificialmente a uma categoria definidora. Se a pessoa eleva sua altura, por exemplo, a essa categoria, tudo que acontece na vida dela, seja de bom ou de ruim, advêm da altura (ou de qualquer outra característica, física ou não, que seja elevada à categoria de atributo definidor do indivíduo). Se ela faz um processo seletivo e é contratada, é porque a empresa se importa com a inclusão de pessoas baixinhas. Se não for, a empresa discrimina pessoas baixas. Além disso, esses valores motivam ataques de grupos identitários aos que não se conformam e fazem com que empresas como o Nubank criem departamentos de diversidade para prevenir esses ataques ou servir como argumento de defesa caso eles ocorram.

Assim, apesar de as empresas se preocuparem cada vez mais em sinalizar que são diversas, o movimento real é no sentido contrário, em direção à “praça de alimentarização” do mundo corporativo, na medida em que as pessoas parecem diferentes, mas sempre falam exatamente a mesma massa recheada de clichês.

Maurício F. Bento é graduado e mestre em Economia, com passagens pelo Cato Institute e pelo Charles Koch Institute em Washington, DC, atua no Tribunal de Contas do Estado de São Paulo e na Property Rights Alliance, e é filiado ao IFL-SP.

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