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Após a festança dos últimos anos e sua consequente gastança, a ressaca. E esta vem da pior maneira possível, na forma de um desespero desarticulado das várias esferas de governo em arrumar o caixa da pior forma: aumentando a tributação. Prefeituras desfecham o golpe com o IPTU e outras taxas. Governos estaduais açoitam o cidadão com mais ICMS, IPVA, cartórios e repasses judiciários, e também outras taxas. O governo federal segue na mesma toada com a tabela do Imposto de Renda, alíquotas de contribuições, IPI etc.

No desespero individual da arrumação do caixa pós-eleições, as ações desarticuladas dos vários níveis de governo terão um impacto negativo cumulativo sobre a economia muito maior do que se imagina. Agindo sozinhas, pensando estreitamente de dentro de suas viseiras, cada esfera do governo não percebe, no todo, as consequências nefastas de mais um episódio de derrama, agora não circunscrito às Minas Gerais de 1751, mas disseminado no país todo. Somadas, as três esferas irão transferir considerável montante adicional de renda das famílias para os cofres públicos. Algo como R$ 50 bilhões a R$ 60 bilhões a menos no bolso das famílias, para que estas satisfaçam suas necessidades.

Re-equilibrar as contas públicas é uma necessidade, não se discute. O problema é a fórmula dos governos todos, quaisquer que sejam suas cores. Não se cogitou em nenhum momento reestruturar a administração, reduzir o número de secretarias e ministérios, acabar com a farra dos cargos em comissão, eliminar os nababescos privilégios do poder Legislativo e Judiciário, pensões e aposentadorias indevidas etc. etc. etc.

Mais uma vez o cidadão comum, e mais ainda o que depende de salário e que por isso desconta aprioristicamente o imposto na fonte, vai ter de arcar com os remédios da ressaca. Prefeitos, governadores e presidente, agora com seus novos coletores de impostos nomeados, salpicam a imprensa com um velho discurso requentado de novo e enfeitado com áurea de racionalidade.

De racional não há nada. A única coisa boa que a LDO 2015 federal anuncia é a redução da dívida líquida como proporção do PIB em 2016 e 2017, após o ajuste (tarifaço) de 2015. Mas projeta também um crescimento do PIB de 3% em 2015 e 4% para os demais anos. Os "caras" estão loucos! Se com todo o estímulo de 2013 e 2014 o país cresceu menos de 1% ao ano, por que vai crescer tanto em 2015, 2016 e 2017? O consumidor está endividado, a indústria tem altos níveis de estoque e em contração, os juros voltaram a ser os maiores do mundo, o investimento está em queda, a corrupção em alta, o desemprego começando a aumentar, o setor externo em crise. Não bastasse isso, adicione-se à receita o tarifaço caótico do cada um por si.

A economia vai se precipitar numa recessão em 2015 mais forte do que se imagina. Se crescer 0,5%, será um feito a ser estudado na academia. Espero estar errado, e que os dados ao fim de 2015 me desmintam, mas a lógica econômica dos governos não fecha. Seria a primeira vez na teoria e práxis econômica que um aumento de imposto geraria crescimento. Quem vai ter dinheiro para comprar esta produção de 3% a 4% maior? E quem vai investir sabendo que haverá menos renda para o consumo?

Parte da culpa pelo pífio desempenho futuro da economia é dos descalabros passados, sem dúvida, mas parte deverá ser computada ao recente aumento de tributos, exatamente num momento em que a economia está estagnada e caminhando para recessão e a sociedade já está asfixiada de tanto imposto que paga. Ao aumentar o imposto para arrecadar mais, o tiro pode sair pela culatra. A recessão que isso causará poderá anular os ganhos do aumento e o sofrimento adicional da população será em vão. Será que os coletores de impostos sabem o que estão fazendo?

Sem projeto estruturante, sem visão de longo prazo, sem noção de aonde ir, prefeituras, estados e União agem como Luís XVI, o último, da França, que tinha como solução permanente às sucessivas crises financeiras que acometia seu suntuoso reinado trocar seus ministros de Finanças e anunciar novos impostos, mas mantendo sempre a luxúria da corte. A cada solução como se fosse a última. Os tempos eram outros e a coisa lá em 1788/9 terminou em guilhotina, sangue e fim da monarquia. Aqui nos trópicos, século 21 adentro, a fúria civil se dissolve em inofensivos posts nas redes sociais, mas se acumula silenciosamente em cidadãos crescentemente mais indignados. Por ora, o caos tributário vai engolfando subrepticiamente suas vítimas.

Senhor prefeito, senhor governador, senhora presidente: chega de impostos. Deixem-nos tocar as nossas vidas com dignidade e conforto financeiro. Ademais, não foi para isso que os senhores e senhoras foram eleitos recentemente.

João Basilio Pereima é professor e chefe do Departamento de Economia da Universidade Federal do Paraná

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