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Opinião 1

A verdade histórica

Sou contra a Comissão da Verdade. Considero, no entanto, que a verdade histórica deve ser pesquisada e apresentada à sociedade, de forma íntegra, para que os cidadãos se ilustrem e escolham a explicação que mais os satisfizer.

A verdade histórica é patrimônio da Nação e não pode ser sonegada. Somente os regimes totalitários se arrogam o direito de reescrever a história e repassar aos cidadãos tutelados a versão que convenha aos donos do poder. Isso foi o que Stalin e Hitler fizeram. Isso é o que, em menor escala, mas sempre tentando esconder os fatos incômodos para o regime, o governo da Argentina fez quando regulamentou a forma em que poderia a história nacional ser pesquisada, ou quando pôs em prática uma "Lei de Meios" que visa a aniquilar a imprensa livre, identificada com o Grupo Clarín. Isso é o que o PT tenta fazer com o famoso chavão de que "nunca antes na história deste país", como se petistas e coligados fossem os primeiros a se preocuparem com a questão social.

Uma Comissão da Verdade instaurada pelo governo, com figuras nomeadas por ele, não é a melhor forma de indagar acerca da verdade histórica. Os que melhor podem fazer isso são os historiadores, e, nessa área, o Brasil conta com intelectuais de grande valor, em todos os quadrantes ideológicos. O governo poderia propor que os historiadores apresentassem a sua versão sobre um determinado período histórico, abrindo um concurso, por exemplo, ou incentivando o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro a coordenar esse trabalho, junto com os departamentos de História das nossas universidades. Como a verdade histórica não é algo que possa ser auferido matematicamente, sendo o critério de aceitação a "credibilidade", cabe aos historiadores oferecer aos cidadãos as suas diferentes versões dos fatos pesquisados, a fim de que eles escolham a que lhes pareça mais crível.

Acho difícil uma Comissão da Verdade, nomeada pelo governo, chegar ao resultado almejado, de reforçar a reconciliação nacional. Muito mais o PT faria para contribuir a essa reconciliação, se baixasse o tom da sua retórica que, ao longo dos nove anos de governo, tentou colocar negros contra brancos, pobres contra ricos, elites contra povão etc. O populismo sempre traz consigo essa cilada, de dividir a nação entre os que adoram incondicionalmente o líder populista e os que se contrapõem a ele. A presidente Dilma, nesse item, tem sido, certamente, muito mais moderada do que o Lula, que em oito anos de governo não conseguiu descer do palanque.

Se o que se pretende com a Comissão da Verdade é dar um passo em direção à abolição da Lei de Anistia, considero que a iniciativa constitui um desserviço à nação. Essa Lei foi, sem dúvida, o passo inicial para a nossa redemocratização. A anistia permitiu que os exilados regressassem, que fundassem partidos de oposição, que elegessem os seus candidatos e que líderes de esquerda (Itamar, Fernando Henrique, Lula e Dilma) chegassem à Presidência da República. Ignorar a Lei de Anistia é querer fazer regredir o relógio da história, ignorando todos os progressos que foram conseguidos.

Ricardo Vélez Rodríguez, coordenador do Centro de Pesquisas Estratégicas "Paulino Soares de Sousa", da UFJF.

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