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 | H. Ballarini/Fotos Públicas
| Foto: H. Ballarini/Fotos Públicas

Dia desses encontrei meu representante eleito passeando pelas ruas da minha cidade pedindo votos para sua “promoção” a um cargo político em disputa nas eleições 2018. Como eu, você também deve ter visto seu candidato da eleição passada desfilando por aí e pedindo votos para outro cargo, apesar de estar exercendo um mandato atualmente.

São duas as possibilidades de encontrá-lo em algum santinho: se ele exercia mandato no Poder Executivo e não está concorrendo à reeleição, ele deve ter renunciado ao cargo que ocupava até seis meses atrás, e agora clama por votos – caso do ex-governador Beto Richa; ou era representante no Poder Legislativo e agora pleiteia novo cargo, como o senador Alvaro Dias; ou concorre à reeleição, caso do senador Roberto Requião.

A lei eleitoral faz pequenas restrições para aqueles que disputam um cargo eletivo, como filiação partidária; idade mínima para disputa do cargo; o não impedimento por inelegibilidade; e a renúncia para aquele que exerce cargo executivo. Não acho que devam existir muitas restrições para as disputas de candidatos que exerçam cargos; esse papel é do eleitor. É ele que deve se conscientizar sobre os movimentos políticos de seus candidatos.

O cidadão deve observar que o candidato, mesmo que de forma indireta, se vale do mandato eletivo que exerce para disputar cargo diverso

O cidadão deve observar que o candidato, mesmo que de forma indireta, se vale do mandato eletivo que exerce para disputar cargo diverso; afinal, é difícil separar o agente político do candidato em período eleitoral, apesar da extensa legislação sobre o tema. O movimento é de proteção à sua condição de poder, de conquista eleitoral, ou até mesmo de avanço na carreira política.

Dessa forma, o questionamento não é sobre ilegalidade, mas sim se o candidato que exerce cargos políticos merece sua confiança na disputa por outro cargo eletivo, mesmo tendo pleiteado seu voto pouco tempo atrás.

Um exemplo claro disso é do ex-prefeito de São Paulo João Dória. Mesmo professando a “nova política”, fez como seus antecessores e renunciou a seu mandato de prefeito para pleitear o cargo de governador, apenas 15 meses após ter sido eleito. A mensagem que o candidato passa é de que a prefeitura foi apenas um trampolim para seu interesse inicialmente oculto. Ele diz, de forma enfática, que surgiu uma nova oportunidade e tudo aquilo que foi prometido não será cumprido.

Convenhamos, é uma atitude pouco transparente. Se na campanha para a prefeitura ele tivesse sido claro e dito que seu sonho era ser governador, não teria conquistado a confiança do eleitor. Muitas análises políticas estabelecem uma associação entre a renúncia de Dória e o não deslanchar de sua campanha no estado – ponto para a população de São Paulo, que teve maturidade política para perceber o movimento do candidato.

Leia também: Compromisso com a democracia (editorial de 2 de outubro de 2018)

Leia também: Os desafios do próximo governante (artigo de João Eloi Olenike, publicado em 2 de outubro de 2018)

Sou absolutamente contrário à utilização de cargos eletivos como trampolim para os anseios de candidatos. Acredito que o eleitor deve ser respeitado na sua escolha política; o candidato que usa a prefeitura de sua cidade, a Câmara de Vereadores, o Senado Federal, o governo do estado ou qualquer outro cargo para ser eleito deve ser visto com certo receio – afinal, ele não cumpriu a principal promessa feita no período eleitoral, a de terminar seu mandato e honrar o voto do eleitor.

Sou adepto de poucas restrições aos candidatos para participarem de disputas eleitorais. Acho justo que o eleitor possa escolher livremente seus interesses e o candidato que mais lhe agrade, sem interferências da Justiça Eleitoral. Acho absolutamente inoportuno que a Justiça Eleitoral diga o que eleitor pode ou não fazer no exercício de sua liberdade política, um direito individual sagrado em democracias estabilizadas.

Não vejo problema que o político em questão peça votos para sua candidatura, mas também não vejo problema algum que esse mesmo político termine seu mandato como inicialmente combinado com o eleitor. A sede de poder dos políticos em alcançar cargos políticos de maior relevância ou envergadura nacional é algo que pode mudar sensivelmente a vida do cidadão, substituindo um político desejável por um vice ou suplente que nem sempre atende aos interesses originais. Além disso, está na hora de olharmos para nossos representantes e exigirmos mais respeito com nosso bem mais precioso: o voto.

Francis Augusto Goes Ricken, mestre em Ciência Política e advogado, é professor do curso de Direito da Universidade Positivo.
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