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Acondroplasia: desafios e barreiras na vida com baixa estatura

Nanismo exige mais que cuidados médicos: é preciso acessibilidade, inclusão e respeito para garantir autonomia, dignidade e oportunidades. (Foto: Ron Lach/Pexels)

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A acondroplasia, a forma mais comum de nanismo, impacta profundamente a vida das pessoas que convivem com essa condição. Para além das questões médicas, os desafios sociais e estruturais impostos pela falta de acessibilidade representam um obstáculo diário para a inclusão e a qualidade de vida dessas pessoas.

Embora a sociedade tenha avançado em muitos aspectos da inclusão, ainda há um longo caminho a percorrer para garantir direitos básicos e eliminar barreiras que dificultam o cotidiano das pessoas com nanismo.

Historicamente, pessoas com nanismo foram retratadas como figuras cômicas – os bobos da corte, os palhaços, os personagens caricatos. Tivemos que entender nossas próprias lutas para, então, começar a lutar de fato.

Minha própria experiência reflete essas dificuldades. Até os 17 anos, eu nunca tinha conhecido outra pessoa com nanismo. Minha mãe, a única da família que era como eu, faleceu quando eu tinha apenas quatro anos.

Cresci sem referências próximas, sem ver outras pessoas que enfrentassem os mesmos desafios que eu. E isso me fez perceber o quanto a falta de representatividade e informação pode impactar a construção da identidade e a autoestima.

Quando descobri um desfile de pessoas com nanismo no bairro do Bexiga, eu tive um verdadeiro choque de realidade. Ao ver outros como eu, questionei minha própria imagem e forma de andar.

Aquele momento foi um divisor de águas: ali, fiz amizades que me ajudaram a entender a importância de falar sobre acessibilidade, representatividade e outras questões que hoje utilizo como ferramentas para levar informação e desmistificar o nanismo.

De lá para cá, a acessibilidade continua sendo um dos maiores desafios enfrentados por essa comunidade. Atividades simples para a maioria das pessoas, como usar um elevador, acessar bancos e caixas eletrônicos, utilizar meios de transporte público ou até mesmo frequentar banheiros públicos, tornam-se tarefas extremamente difíceis ou até impossíveis para alguém com nanismo.

Muitos espaços não são projetados para atender às necessidades de pessoas de baixa estatura, o que resulta em um ambiente excludente e limitador.

No transporte público, por exemplo, a ausência de estruturas adaptadas dificulta o embarque e desembarque, tornando o deslocamento uma experiência desgastante e, muitas vezes, perigosa.

Balcões de atendimento, distribuidores de senhas e até prateleiras em estabelecimentos comerciais raramente são pensados para a acessibilidade, reforçando um modelo urbano que desconsidera a diversidade dos corpos humanos.

Além das barreiras físicas, também não posso deixar de falar dos desafios sociais e culturais.

O preconceito e a falta de informação sobre a acondroplasia fazem com que muitas pessoas com nanismo enfrentem dificuldades na inserção no mercado de trabalho e no acesso a oportunidades educacionais.

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Muitas vezes, somos vistos de maneira estereotipada e infantilizados, o que compromete nossa autonomia e participação plena na sociedade

Eu sei disso porque já vivi essa luta. E hoje, com propriedade, transformo tudo o que aprendi em estímulo para ajudar outras pessoas. Sou tudo o que posso ser – e todos nós merecemos essa mesma chance.

Diante desse cenário, é fundamental que haja uma maior conscientização e implementação de políticas públicas voltadas à acessibilidade e inclusão das pessoas com nanismo.

Isso inclui adaptações estruturais em espaços públicos e privados, regulamentações que garantam acessibilidade nos transportes e campanhas educativas para combater o preconceito e promover a igualdade de oportunidades.

A inclusão não pode ser vista como caridade. Quando a sociedade entende que se trata de potencialidade e não de favor, todos saem ganhando. Empresas, escolas, hospitais e organizações que valorizam a diversidade ampliam suas perspectivas e fortalecem sua cultura. A presença de pessoas com diferentes experiências traz visões novas, enriquece as discussões e impacta positivamente os resultados.

Além disso, contamos com tecnologias e soluções que facilitam a inclusão e garantem que pessoas com deficiência possam desempenhar suas funções plenamente. Portanto, não há mais desculpas.

Essa luta não pode ser responsabilidade apenas das pessoas com nanismo, mas sim de toda a sociedade. É necessário que governos, empresas e cidadãos compreendam a importância de um ambiente acessível e inclusivo para todos. Garantir que pessoas com nanismo tenham autonomia e dignidade em seu dia a dia não é um favor, mas sim uma obrigação de uma sociedade que busca equidade e respeito às diferenças.

É fundamental que a sociedade entenda que o nanismo não define quem somos. Somos pessoas com sonhos, vontades e capacidades, que, apesar dos obstáculos, buscam o direito de viver plenamente. Para nós – pais, filhos e familiares –, lutar por inclusão e respeito é uma necessidade urgente. 

Promover a conscientização é um compromisso de todos. Romper estigmas, apoiar a inclusão e reconhecer a diversidade como valor essencial são passos fundamentais para construir uma sociedade mais justa e empática. Caminhar juntos nessa direção é garantir que cada pessoa com nanismo tenha seu espaço, dignidade e respeito.

Fernando Vigui é ator, arte educador, palestrante e líder do movimento Nanismo Brasil.

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