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O princípio que rege em geral a atividade do advogado é o da liberdade de pensamento. O advogado é livre por definição, mas só o será se tiver personalidade para tanto. Este é o carro-chefe, do qual se originam explicitamente e em paralelo o da liberdade de imprensa, o da liberdade de ir e vir, no caso dos advogados, além dos princípios gerais de direito que lhes socorrem, o princípio do sigilo profissional, consagrado até na Constituição da República. Os princípios, como o da igualdade perante a lei, o da inviolabilidade do lar e o da legalidade (ninguém poderá ser obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei), se ajustam também ao da liberdade; é paralelo e reiterado que um existe não em função do outro, mas pode reafirmá-lo, porque aplicado em condições diversas – mais aberto, portanto.

Por ignorância ou má-fé, ou por ignorância e má-fé juntas, a advogada Beatriz Catta Preta está sendo pressionada

O sigilo tem a natureza de proteger o advogado em face de sua representação e o envolve totalmente, até o ponto em que, se houver descumprimento pelo próprio advogado, este poderá ser denunciado à OAB por infração profissional. O sigilo revela-se cláusula pétrea da Constituição, tal como está ali expresso; não pode ser mudado por emenda constitucional, muito menos por leis comuns. Trata-se de conquistas históricas, como na Declaração de Independência dos Estados Unidos (redigida pelo fantástico Thomas Jefferson), com maior clareza nas primeiras 12 emendas à sua Constituição; e na Revolução Francesa, na Declaração Universal dos Direitos do Homem, inclusive adotada na Constituição Brasileira.

Como se vê, por ignorância ou má-fé, ou por ignorância e má-fé juntas, a advogada Beatriz Catta Preta está sendo pressionada – ou melhor, intimidada – a revelar fatos ou comportamentos resguardados em toda a sua extensão pelo sigilo profissional, que protege a sua identidade, a sua dignidade pessoal como profissional. Ela denunciou que deixará a advocacia e a defesa de seus clientes da Lava Jato, por motivos que incluem o fato de ela e sua família estarem sendo perseguidas e ameaçadas – ela desconfia de que as ameaças se originam em personagens da Comissão Parlamentar de Inquérito sobre os escândalos da Petrobras.

A maior ameaça está precisamente no fato de ela ter sido convocada para depor na CPI sobre tudo o que está envolto pela sua posição de advogada. Este fato já demonstra claramente a vontade de humilhá-la, de perquirir sobre sua conduta pessoal, ligada perfeitamente a suas atitudes como advogada. A CPI não tem o direito de exigir que ela venha denunciar quem supostamente esteja encabeçando as ameaças que ela e sua família estão sofrendo. As ameaças e intimidações são surdas, veladas.

Não é segredo, nem de desconhecimento de ninguém, que a falta de escrúpulos ronda, infelizmente, o Congresso Nacional, e é capitaneada pelas atrozes presidências das duas casas. E a Ordem dos Advogados do Brasil não acompanhará a advogada acuada em sua compulsória visita à CPI? Os bons tempos da OAB estão a se encerrar, pela notória candidatura do atual presidente a uma das vagas nos tribunais superiores? Bons tempos de Raymundo Faoro, que recusou ser ministro da Justiça depois de ter terminado seu mandato como presidente da Ordem simplesmente para não conspurcar sua imagem e sua biografia. Presidente da OAB é livre, é mais importante que ministro, porque este está subordinado a uma porção de gente, de dentro e de fora do governo – como sucede mais que nunca agora.

Eduardo Rocha Virmond é ex-presidente do Instituto dos Advogados do Paraná e da Ordem dos Advogados do Brasil/seção Paraná (OAB-PR), e foi vice-presidente e coordenador da 7ª Conferência Nacional da OAB (Curitiba, 1978).
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