Quando vi a histórica foto de Paulo Maluf exultante, de mãos entrelaçadas com o ex-presidente Lula (em outra, está dando tapinhas afetuosos no rosto do candidato Fernando Haddad, ao lado de seu padrinho, ambos com caras patibulares e sorrisos amarelo-gema), lembrei-me de outra foto inesquecível, a do deputado Barreto Pinto, correligionário e amigo de Getúlio Vargas, na revista O Cruzeiro.
Serviço de utilidade pública para os que não sabem de quem estou falando ou não se lembram mais: entre 1940 e 1960, o Brasil era um vasto arquipélago de regiões isoladas, unidas apenas por duas coisas: o Correio Aéreo Nacional da FAB e a revista O Cruzeiro, de Assis Chateaubriand, que tinha naquela época, 70 anos atrás, uma circulação quase igual à das revistas semanais de hoje. O Cruzeiro fazia a cabeça do país e não deixava barato, nem no sentido figurado nem no literal. A foto do presidente Juscelino Kubitschek se dirigindo ao secretário de Estado norte-americano John Foster Dulles com ar súplice quase destruiu a reputação de JK; um crime bizarro como o assassinato do diretor da Yoki, por exemplo, seria um prato cheio para a revista.
Um dia, milhões de leitores escandalizados depararam com uma foto de página inteira do deputado federal Barreto Pinto, em pose de imperador romano, vestido com a parte de cima de um fraque complementada por uma gigantesca cueca samba-canção e um sapato sem meia. O escândalo foi tão grande que Barreto Pinto foi cassado por falta de decoro. O deputado, furibundo, revelou ter sido enganado pelo jornalista David Nasser e pelo fotógrafo Jean Manzon, a quem havia recebido em sua casa para uma entrevista vestido apenas com camiseta e cueca... Estes pediram uma foto solene para ilustrar a matéria, mas sugeriram que ele colocasse apenas a parte superior do fraque para evitar ter de se vestir completamente, pois a foto seria apenas da cintura para cima...
A foto de Lula, Maluf e Haddad tem o mesmo conteúdo farsesco; só que, no caso, os visitantes, o ex-presidente e seu candidato a prefeito de São Paulo, é que posaram em trajes menores, enquanto seu anfitrião ria eufórico, deslumbrado pelo presente que lhe caía do céu um exagero de linguagem, pois imagina-se que o céu tenha presentes mais puros a oferecer do que esse.
O caso de agora é mais patético, porque o ex-presidente jogou fora a criança com a água suja do banho. O PT supostamente tinha um programa partidário coerente; não tem mais. Tinha mecanismos democráticos de solução de divergências internas e de escolha de candidatos, fazia consultas internas às diversas facções, colocava uma contra outra e buscava extrair um consenso mínimo que todos acabavam aceitando; não tem mais, depois que Lula decretou que quem manda é ele, quem escolhe é ele também, e que quem "desescolhe" (como aconteceu no Recife) é ele também. Ou seja, aquilo que poderia ter sido uma inovação na política brasileira mostrou-se tão antiquado como a foto de Barreto Pinto, 76 anos atrás.
Quanto a Maluf, as imagens que me vieram à mente foram a de Ronaldinho Gaúcho vestindo a camisa do Atlético Mineiro e a de Adriano envergando a do Corinthians. Todo mundo os conhece, sabe exatamente do que eles são capazes e do tipo de "contribuição" que irão dar ao time em que estiverem jogando. No entanto, sempre aparecerá um padrinho novo para tirá-los do caminho do merecido anonimato para lhes oferecer uma sobrevida. É por essas e outras que nem o futebol nem a política vão para a frente por estas bandas.
Belmiro Valverde Jobim Castor é professor do doutorado em Administração da PUCPR.



