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| Foto: Nelson Almeida/AFP

Nestes primeiros dias da corrida pelo Planalto, algo que muito se escuta é “eu votaria no candidato tal, mas, como ele não tem chance, eu vou votar no Bolsonaro”.

Como é possível que depois de tanto sofrimento, de dois presidentes apeados do poder através de processo de impeachment, um ex-presidente na cadeia, uma Operação Lava Jato que já envolve quase uma centena de políticos, nós, brasileiros, ainda tenhamos uma sociedade civil que cogite o voto funcional?

O voto funcional ou por exclusão não vem de hoje, mas, francamente, fazendo um paralelo comparativo, não votar é como dizer que o cidadão não vai reciclar seu lixo porque as ruas já estão sujas. É como não ter a necessária educação do dia a dia para simplesmente não furar fila usando a desculpa de que algum fulano o fará de qualquer maneira, então deixa pra lá.

O brasileiro é um povo maravilhoso, mas tem essa dificuldade de exercer sua pequena e poderosa arma de civilidade, seu pequeno mandato para ajudar a mudar tudo a partir da assunção de suas posturas culturais, seus credos políticos, suas vontades sociais na hora da decisão. Quer votar no candidato tal, mas diz que vai votar no Bolsonaro porque o outro candidato não tem chance.

Mas existe algo que vai ainda mais além nestas eleições. Um fenômeno que se percebe além da questão da decisão consciente e que é inerente ao crescimento, nas pesquisas de intenção de voto entre os períodos de maio a julho de 2018, do candidato conservador Jair Bolsonaro.

Bolsonaro poderia representar o estado de inconsciente das massas, um antídoto antiestablishment

Este fenômeno poderia ser justificado ou pelo efeito manada do voto funcional – “daquele candidato que não vai ganhar mesmo então eu voto no que está liderando as pesquisas” – ou, então, por aqueles que simplesmente insurgem a partir do estado do inconsciente social.

O inconsciente social é uma tese formulada pelo psicanalista marxista alemão Erich Fromm, que discorre da experiência de cada indivíduo pertencente a uma sociedade, que, sendo esta repressiva em suas relações, não permite que o mesmo individuo acesse sua própria consciência.

Trocando em miúdos, considerando parte da origem dos eleitores que agora afirmam que votarão no candidato conservador, Bolsonaro poderia representar o estado de inconsciente das massas, um antídoto antiestablishment, e a busca do livramento de tudo que aí está, mas que ninguém quer falar porque ele, de certa forma, é a antítese do que entendemos ser o candidato padrão. Ele é produto do repressivo social e, portanto, caímos automaticamente em uma contradição na qual quem queremos para presidente entendemos não ser adequado. Não obstante, sentimo-nos carentes exatamente do oposto – ou seja, ele.

Sente-se ao mesmo tempo que vivemos o estado de negação da mudança, porque tudo que é novo traz desordem e, consequentemente, medo do que hoje está ruim, mas que, se mexer, pode ficar pior.

Como resultado disso, considerando os eleitores que começam a se manifestar por justa certeza do que querem, ou pelos eleitores que têm o firme propósito de quebrar o paradigma do inconsciente social, deduz-se existir mesmo a possibilidade de que Bolsonaro cause essa perturbação no consciente social para um novo ambiente político, pois ele, ao que parece, tem dito o que muitos querem ouvir. Confronta a covardia da inércia sem o fisiologismo do trueque que domina o Congresso há décadas – e a razão é muito simples.

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Setenta por cento do dinheiro arrecadado nos municípios vai para a União, que por sua vez define seus gastos através da Lei de Diretrizes Orçamentárias e, desta maneira, redistribui este mesmo dinheiro que percorre o caminho contrário até os estados e municípios. Muito deste dinheiro nunca chega em sua totalidade ao destino pela falta de eficiência e pela corrupção dos órgãos públicos. O que falta para o atendimento das necessidades do gestor público, a partir disso, é pleiteado pelo escambo entre prefeitos de 5.570 municípios, governadores e a base parlamentar formada por deputados no Congresso. A partir daí, as falcatruas que ali acontecem a custo do erário ninguém jamais saberá. What happens in Brasília stays in Brasília. É daí que sai o aparelhamento estatal e o fisiologismo, que, bem sabemos, nem o Centrão recém-formado para concorrer às eleições, nem a viciada situação do MDB e agregados, nem a combalida e desregrada esquerda corrigirão.

Muitos brasileiros já entenderam este cenário quando Bolsonaro se apresentou como um exército de um homem só, quando não fez as antigas alianças com as velhas raposas, quando não vendeu a alma a quem não devia e não tomou o dinheiro do Fundo Partidário, ao mesmo tempo em que assumiu a postura de falar absolutamente tudo o que pensava até aqui. Jair Bolsonaro também não flerta com o politicamente correto que já cansou a beleza de todos. Ao que parece, é o único que pode pôr de cabeça para baixo os paradigmas da política brasileira.

O cidadão Bolsonaro parece mesmo ser uma pedra no sapato dos políticos da velha guarda quando, ao contrário do que dele dizem ao acusá-lo de não possuir proposta de política econômica, emerge com a ideia de um pacto federativo, um Estado menor, menos estatizado e mais eficiente. Não é santo, não é perfeito, mas quem não tem pecados que atire a primeira pedra! No dia 7 de outubro, lembremos de reciclar o nosso lixo, mesmo que a sujeira esteja pelas ruas.

Alexandre Nigri é CEO do Grupo Maxinvest.
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