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Celso Amorim: quando a diplomacia tropeça na própria língua

Ao confundir Holocausto com antissemitismo, Celso Amorim transforma a diplomacia brasileira a espetáculo retórico e relativiza a história. (Foto: Wilson Dias/Agência Brasil)

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Celso Amorim, assessor para Assuntos Internacionais de Lula, conseguiu um feito raro: confundir antissemitismo com Holocausto e, de quebra, transformar a política externa brasileira em um malabarismo retórico digno de palanque estudantil.

No dia 11 de agosto de 2025, durante participação no programa Roda Viva, Amorim tentou justificar a saída do Brasil da Aliança Internacional para a Memória do Holocausto dizendo que havia “manipulação do conceito de antissemitismo” e que “ninguém nega o Holocausto no Brasil”.

É aqui que começa a tragédia: o Holocausto foi um evento histórico específico – a tentativa nazista de exterminar o povo judeu. O antissemitismo, por sua vez, é o veneno que o alimentou e que continua circulando livremente no mundo, inclusive no Brasil. Confundir os dois é como dizer que a escravidão acabou, logo não existe mais racismo. É burrice histórica com pretensões acadêmicas.

A tal Aliança Internacional existe justamente para evitar que o preconceito contra judeus continue encontrando terreno fértil, educando, prevenindo e desarmando discursos de ódio. Ao sair dela, o governo brasileiro manda um recado cristalino: a proteção contra o antissemitismo é negociável, desde que o jogo político peça.

Não é a primeira vez que Amorim demonstra a vocação de manter o Brasil na condição de “anão diplomático” — apelido cunhado por um chanceler israelense para descrever a irrelevância geopolítica cultivada por certas posturas da nossa diplomacia. E a confusão entre Holocausto e antissemitismo, além de reforçar essa imagem, desrespeita tanto os mortos quanto os sobreviventes da tragédia.

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É vestir a fantasia de defensor dos direitos humanos, mas deixar a porta aberta para o ódio passar.

A cereja do bolo é a incoerência: o governo quer o direito de ser antissemita sem ser chamado de antissemita. Quer transformar uma questão histórica e humanitária em mais um braço da sua guerrinha ideológica. E assim, enquanto Amorim mistura conceitos e Lula posa de justiceiro em Gaza, o Brasil se afasta de um pacto civilizatório básico: o de que preconceito não se negocia.

Porque, se a memória do Holocausto serve para alguma coisa, é para lembrar que banalizar o ódio é sempre o primeiro passo para repetir a tragédia. E nisso, Celso Amorim foi um aluno aplicado.

José Maurício de Lima é advogado, mestre em Filosofia pela UnB e professor do IDP-Brasília.

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