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O ano de 2015 foi marcado por grandes acontecimentos bons e alguns lamentáveis. Entre os lamentáveis, temos a crise econômica mundial iniciada em 2008, com recessão, desemprego e elevação da inflação, que o Brasil parecia ter driblado com as políticas de incentivo ao consumo, com a redução do IPI para a indústria, desoneração da folha de pagamento das empresas, ampliação do financiamento ao consumo com juros baixos e políticas públicas de distribuição de renda via bolsas.

Tudo isso não barrou a crise da economia brasileira, que chegou pesada, levando à adoção sem critérios de medidas drásticas com o ajuste fiscal e cortes de financiamento público para as áreas sociais como saúde, educação e saneamento. Os mais atingidos foram os pobres, com a elevação da inflação e o desemprego crescente. Junto com a crise econômica veio a crise política, com a ameaça de impeachment da presidente Dilma Rousseff e a cassação do deputado federal Eduardo Cunha, que, mesmo tendo uma forte base de apoio na Câmara, tem sofrido sucessivas derrotas. A presidente, com a vitória obtida no STF, revertendo o voto do ministro Luiz Edson Fachin, teve um alívio na pressão institucional e política que estava sofrendo, tendo inclusive melhorado seu índice de rejeição nas últimas pesquisas de opinião pública.

A crise econômica se estende para os estados e municípios, levando a cortes de investimentos públicos em infraestrutura e a atrasos no pagamento de salários e 13.º do funcionalismo público, agravando o quadro de recessão e desemprego.

A sociedade começa a entender que ela é responsável por esse estado de coisas

As denúncias de corrupção por parte das empreiteiras de obras públicas, com maior destaque na Operação Lava Jato, atingiram a Petrobras com o envolvimento de funcionários graduados. As investigações levaram às delações premiadas e às prisões de corruptos de colarinho branco, inicialmente atingindo figuras de destaque do PT em plano nacional e regional, mas estendendo-se recentemente a partidos da base aliada, como o PMDB, e da oposição, como PSDB e Democratas.

A crise se manifestou também em crimes ambientais, tendo como principal cenário o desastre ambiental em Mariana, envolvendo grandes empresas internacionais como a Vale e a Samarco, responsabilizadas pelo Ministério Público pelo desastre ambiental à medida que não fizeram investimentos para evitá-la. Até o momento, apesar de os crimes ambientais serem legalmente considerados como inafiançáveis, nenhum grande executivo dessas empresas foi preso.

Os conflitos na Síria e em outros países da África têm levado a um intenso processo de emigração, levando milhares de imigrantes para a Europa, onde são duplamente penalizados pelos conflitos em seus países e pela discriminação como exilados.

O ano recém-encerrado também apresenta seu lado positivo, que se manifesta pela exigência da sociedade pela punição dos responsáveis pelos atos de corrupção e impunidade. Os vários crimes até então impunes envolvendo figuras públicas e partidos políticos fazem, lentamente , surgir uma autocrítica na sociedade: a corrupção e os preconceitos são culturais, estruturais. A sociedade começa a entender que ela é responsável por esse estado de coisas, à medida que não existe corrupto sem corruptor e que políticos corruptos são eleitos pela compra de votos financiados pela venda de seus mandatos aos financiadores das campanhas eleitorais. Começa a entender que pequenos comportamentos de corrupção pessoal frente aos filhos, aos agentes públicos e no emprego geram uma sociedade e uma cultura corrupta.

Vemos uma sociedade mais atuante, que busca intervir para melhorar as condições e a qualidade do transporte público, o quadro da saúde pública deteriorada com a volta de doenças endêmicas antes extirpadas, exigindo dos poderes públicos uma resposta mais célere. No campo da educação, vimos a bela lição dos jovens secundaristas em São Paulo, que ocuparam escolas públicas contra a política do governo estadual de restruturação, visando fechar escolas sem discutir com a comunidade tal decisão. A ação ganhou tal dimensão que o governo estadual foi obrigado a recuar e suspender tal medida. No Paraná , vimos a bela lição dos professores que, duramente reprimidos pelo governo estadual, enfrentaram a repressão e desmascaram o Executivo e o Legislativo estadual, incluindo aí o vexame do camburão.

Fatos como esses fazem renascer a esperança de um ano novo melhor que este que terminou. Em 2016, teremos eleições municipais e poderemos verificar se de fato a sociedade está evoluindo no seu senso de cidadania.

Lafaiete Neves, professor aposentado da UFPR e doutor em Desenvolvimento Econômico pela UFPR, é autor de “Movimento popular e transporte coletivo em Curitiba”.
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