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Opinião 1

Código Florestal em tempos de mudanças climáticas

Espera-se, para os próximos dias, a avaliação da presidente Dilma Rousseff sobre as reformas no Código Florestal. Tal avaliação, que pode se dar pelo veto ou sanção, total ou parcial, vem sendo alvo de diversas manifestações, das redes sociais às aparições públicas da Presidenta.

O atual Código Florestal Brasileiro (CFB) é um instrumento jurídico que beira a metade de um século. Não resta dúvida quanto à necessidade de discussão de alguns de seus artigos, mas não pelos argumentos brandidos pela bancada ruralista. Essa reforma é, em essência, uma tentativa de ajustar parcela dos produtores do país que, por décadas, se mantiveram a margem da lei. Aqueles outros que assim não agiram podem, agora, se sentir lesados diante da afronta de uma "semi-anistia", mascarada por compensações ou isenções.

É falacioso o argumento da necessidade do país de aumento das áreas de cultivo. A limitação para o crescimento da produção de alimentos se dá pela exiguidade na oferta de crédito e não na insuficiência de áreas agricultáveis. Ou seja, é possível produzir mais sem novos desmatamentos. Afinal, a agricultura como atividade produtiva ocupa somente 23% das áreas desmatadas. Não se pode perder de vista que o CFB é uma importante ferramenta que disciplina o uso dos solos, nos meios urbano e rural. Mesmo nas cidades nas quais existe o imperativo da existência do Plano Diretor, os Executivos e Legislativos municipais têm enorme dificuldade em tornar efetivos os códigos que normatizam o uso e ocupação dos solos. Se os poderes locais, que têm essa prerrogativa, não o fazem, seria temerário descuidar de tal tarefa pela não observância desse preceito no CFB.

A todas essas questões vem se somar outra: a inserção de estudos sobre mudanças globais (não somente climáticas) com impactos sobre os ambientes naturais. Fato que foi, inclusive, matéria de denúncia do eminente geógrafo Aziz Ab´Saber, falecido recentemente. Espera-se, para o próximo ano, a divulgação de mais um relatório do IPCC, órgão dedicado ao estudo das mudanças no clima, seus impactos e estratégias de adaptação. Apesar das incertezas relacionadas ao estudo das ciências atmosféricas, esse relatório mostrará aumentos na frequência de ocorrência de eventos extremos, em especial secas, tempestades, granizos. A intensidade desses eventos será regionalmente diferenciada, o que vale dizer que algumas áreas serão mais severamente afetadas do que outras.

Assim, conclui-se que uma legislação ambiental como materializada no CFB deveria levar em conta uma abrangente discussão sobre limites e potencialidades de uso dos solos, os impactos das atividades neles desenvolvidas e uma acurada avaliação do clima. O grau de abrangência da aplicação da legislação ambiental seria, portanto, questão de escala.

A poucos dias da avaliação da presidente Dilma, espera-se que sua decisão seja pelo veto. Afinal, mais do que um embate entre ideias divergentes, o que está em jogo é a decisão por uma legislação ambiental que nos remete à dúvida sobre que tipo de futuro iremos legar aos brasileiros.

Marco Aurélio de Mello Machado é professor de Climatologia Agrícola do Departamento de Solos e Engenharia da UFPR.

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