Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
Artigo

Como seria o Brasil de esquerda sem Lula em 2026

Lula e Trump
O presidente Lula. (Foto: EFE/Andre Borges)

Ouça este conteúdo

Vamos falar sério: como seria o Brasil sem Lula disputando eleições em 2026? Para a esquerda, isso é quase como perder o chão. O campo político que há décadas se organiza em torno de uma figura quase messiânica parece estar diante de um abismo. E não é exagero. Os números e o desempenho recente estão aí para comprovar. O PT pode até manter uma base fiel, mas está cada vez mais claro que ela é insuficiente para vencer sem o "Lulinha rei da picanha" segurando as pontas. 

Historicamente, o PT sofre sem Lula e isso é um risco em 2026. Um exemplo evidente é a eleição de 2018, quando Fernando Haddad, escolhido às pressas após a impugnação da candidatura de Lula, enfrentou Jair Bolsonaro. Apesar de ter alcançado o segundo turno com 47 milhões de votos (44,87% dos votos válidos), Haddad não conseguiu romper o teto eleitoral do partido. O mapa das urnas revelou um cenário de retração fora do Nordeste: no Sudeste e no Sul, regiões com o maior peso demográfico, o desempenho foi fraco. No Nordeste, embora o apoio tenha sido expressivo, ele não foi suficiente para compensar as perdas nas demais regiões.

Se o PT quiser emplacar um novo “messias” como Lula em 2026, é bom que ele seja muito convincente, porque o eleitor brasileiro já não se impressiona com salvadores da pátria que não entregam o prometido

Esse padrão reforça uma dependência crítica de Lula como o grande catalisador de votos do PT. Sem ele, o partido enfrenta dificuldades de se articular como força competitiva em nível nacional. E o futuro? Por fora, o discurso do PT é de unidade. Por dentro, o partido é um caldeirão de correntes, disputas internas e egos inflados. O que ainda mantém a sigla minimamente coesa é Lula e a expectativa de poder que ele representa - inclusive para 2026. Sem ele, a fragmentação parece inevitável. A dependência é tamanha que nenhum outro nome na esquerda possui sequer um terço do recall de Lula.

Agora, olhemos para os “planos B”, caso Lula não dispute a reeleição em 2026. Fernando Haddad, mesmo sendo uma figura central na hierarquia do partido, enfrenta um desgaste severo como ministro da Fazenda. Sua prioridade tem sido equilibrar as contas públicas – com avanços pífios –, e isso o distancia de construir um discurso eleitoral convincente. Além disso, Haddad carrega a marca de ser um eterno substituto, o que compromete sua capacidade de atrair apoio como protagonista.

Outro nome frequentemente citado é Guilherme Boulos. Apesar de ser uma liderança articulada com alguns movimentos sociais, Boulos ainda é um fenômeno regional. Sua força se concentra em São Paulo, onde vem consolidando sua presença, mas ele carece de apelo suficiente para mobilizar o eleitorado em escala nacional. 

Outras figuras, como Érika Hilton e João Campos, tentam trazer renovação ao campo chamado de progressista com pautas jovens e identitárias. Contudo, o eleitorado brasileiro, em sua maioria, não abraça essas agendas em pleitos presidenciais. Flávio Dino, atual Ministro do Supremo Tribunal Federal, e Wellington Dias, ex-governador do Piauí, são opções mais tradicionais. Tanto Dino quanto Wellington tem experiência, mas carecem do elemento fundamental: a memória afetiva das gestões de Lula, que é crucial para engajar as bases populares.

VEJA TAMBÉM:

E enquanto o PT e seus aliados tentam encontrar um sucessor para Lula, o contexto político de 2026 apresenta outro desafio: o Brasil mudou. Hoje, a tendência do eleitorado aponta para uma inclinação maior ao centro e à direita. Dados das eleições de 2022 mostram que o campo conservador não apenas ampliou sua base em várias regiões, mas também consolidou sua força em grandes centros urbanos. Fato é que mesmo com Lula a esquerda enfrentou uma eleição apertada. Sem ele? A viabilidade eleitoral despenca ainda mais.

O cenário para o PT e o campo progressista é desafiador. Sem Lula, o partido perde coesão e enfrenta uma crise de identidade. A direita e o centro-direita, por outro lado, têm tudo para dominar o cenário político. Se o PT quiser emplacar um novo “messias” como Lula em 2026, é bom que ele seja muito convincente, porque o eleitor brasileiro já não se impressiona com salvadores da pátria que não entregam o prometido.

O futuro da esquerda depende de sua capacidade de se reinventar – ou corre o risco de se tornar apenas uma força regional.

Jeulliano Pedroso é sociólogo, especialista em Ciência Política e mestre em Antropologia Social. Estudou economia e estratégia na London School of Economics and Political Science (LSE).

Conteúdo editado por: Jocelaine Santos

Principais Manchetes

Receba nossas notícias NO CELULAR

WhatsappTelegram

WHATSAPP: As regras de privacidade dos grupos são definidas pelo WhatsApp. Ao entrar, seu número pode ser visto por outros integrantes do grupo.