Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
Artigo

Coragem de educar em tempos de pandemia

(Foto: Jonathan Campos/Gazeta do Povo)

Ouça este conteúdo

Em novembro de 2021, enquanto visitava uma escola no Litoral do Paraná, conversei com alguns estudantes sobre a retomada das aulas presenciais. A escola fica numa área pobre. Muitas crianças e adolescentes são filhos e filhas de pessoas desempregadas, que foram para a região em busca de oportunidades no Porto de Paranaguá ou no turismo. Aquelas conversas foram reveladoras, muito mais do que eu tinha pressentido quando defendi a volta às aulas presenciais o quanto antes na rede estadual do Paraná.

A educação não parou no estado. Criamos um sistema de aulas on-line que, durante o auge da pandemia, transmitia 200 mil aulas on-line, síncronas, para todos os estudantes da nossa rede, pela internet. Compramos planos de dados para professores e alunos, para não deixar ninguém para trás. Além disso, fizemos parcerias com uma tevê aberta. Ainda hoje, quando você está no Paraná, pode assistir a aulas de Química, Matemática ou Português, por exemplo, a qualquer momento do dia. A educação fazia parte da rotina dos nossos estudantes. Isso exigiu um esforço hercúleo dos nossos professores e diretores, técnicos de tecnologia e pedagogos.

Apesar disso tudo, o direito à educação dos nossos alunos e alunas foi ferido. Os nossos dados preliminares mostram que houve uma pequena perda de aprendizagem em Português, mas um retrocesso muito grande em Matemática.

VEJA TAMBÉM:

Quando cheguei ao Litoral, esses dados estavam na minha cabeça. Mas a conversa com os alunos trouxe outros elementos à mesa.

Muitas crianças e adolescentes dependem da merenda escolar para comer. Conseguimos alimentá-las durante a pandemia, claro. Porém, não conseguimos identificar casos extremos de desnutrição – isso só é possível pela convivência em sala de aula.

As escolas fechadas também representam uma quebra de vínculos afetivos entre os estudantes e seus professores. Educar não é mera transmissão de conhecimento. Embora eu zele por planos de aula claros, por currículos detalhados, sei que isso é o mínimo para garantirmos uma educação de qualidade. Mas a educação também é uma comunidade de aprendizagem na qual estudantes se incentivam mutuamente, em que professores provocam os alunos e promovem uma educação ativa, com estudantes protagonistas. Lá, no Litoral, encontrei alunos tímidos, fechados, que interagiam pouco entre si e com seus professores.

Mas a educação também é uma comunidade de aprendizagem na qual estudantes se incentivam mutuamente, em que professores provocam os alunos e promovem uma educação ativa, com estudantes protagonistas

E esses foram os alunos que eu encontrei, que voltaram à escola. Muitos abandonaram as salas e aula e foram trabalhar, para ajudar as famílias a sobreviver. Estamos fazendo um grande esforço para trazê-los de volta à escola, inclusive fazendo parcerias com empresas e pagando parte do salário de adolescentes em primeiro emprego. Mas é muito difícil trazer todos de volta.

Por isso, é preciso ter coragem para educar e manter as escolas abertas. O cenário da pandemia ainda é incerto e os casos de Covid crescem exponencialmente. Mas as ciências já reuniram evidências suficientes para manter as escolas abertas. As biológicas mostram que vacinação e protocolos diminuem drasticamente o contágio. As humanas mostram o tamanho do desastre ao fechar as escolas por tanto tempo, como relata um recente relatório da Unicef sobre a falta de educação na pandemia.

Sou um otimista. Acredito que podemos recuperar a aprendizagem perdida durante os anos da pandemia. E também acredito que, em 2022, amadurecemos como país. Lugar de criança é na escola. Temos uma responsabilidade enorme e não podemos fugir dela.

Renato Feder é secretário de Estado da Educação do Paraná. 

Principais Manchetes

Receba nossas notícias NO CELULAR

WhatsappTelegram

WHATSAPP: As regras de privacidade dos grupos são definidas pelo WhatsApp. Ao entrar, seu número pode ser visto por outros integrantes do grupo.