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Direito tático: tecnicamente, o Brasil vive em um “Estado de exceção”
| Foto: Unsplash

Esqueçam a Constituição Federal. Esqueçam as leis. Tecnicamente, estamos em um “Estado de exceção”. Aliás, esqueçam também a técnica – na sua concepção vernácula de conjunto de métodos e processos próprios de uma arte, ciência ou profissão. Sai a técnica e entra a tática. A pura tática.

O direito não é mais uma técnica, nem, muito menos, o justo. O direito contemporâneo é só poder. O que conta agora é a tática para alcançar e manter o poder. Só isso. É difícil identificar com precisão quando isto começou. Thomas Kuhn, em A Estrutura das Revoluções Científicas, já falava que as revoluções científicas começam com “borrões” e que nunca sabemos ao certo quando a “mudança de paradigma” de fato ocorreu. Se isto vale para as ciências duras, com muito mais razão parece valer também para as ciências sociais, incluindo a ciência do direito – agora não mais “ciência”, mas “tática do direito”. A ciência do direito se transformou em “tática do direito”. Este é o novo “paradigma” do direito, na expressão de Thomas Kuhn.

O direito não é mais uma técnica, nem, muito menos, o justo. O direito contemporâneo é só poder. O que conta agora é a tática para alcançar e manter o poder.

O cenário agora é o seguinte: de um lado, assistimos juristas se esforçando para falar uma linguagem, a velha linguagem da ciência do direito. E, de outro lado, assistimos juristas falando outra linguagem, a nova linguagem da tática do direito. Estas duas linguagens não se comunicam, são “incomensuráveis”, como dizia Thomas Kuhn. Uns falam grego e outros troiano.

E o cidadão comum, como fica nesta história? Em qual narrativa ele vai acreditar? Lembram da expressão “fulano deve construir a sua narrativa”? Então, não é mera coincidência. Já faz parte da nova linguagem da tática do direito.

O que quero dizer com isso? Os juristas que falam a linguagem da ciência do direito devem urgentemente tomar consciência de que a linguagem da tática do direito existe na vida real e é o novo paradigma. Eles também precisam aprendam essa nova linguagem direto da fonte. Sugiro começar Fragmentos Constitucionais, de Gunther Teubner. Por fim, é preciso depurar e usar a nova linguagem como instrumento de autodefesa e defesa daquilo que é bom, justo e verdadeiro.

Se os juristas da linguagem da “ciência do direito” não fizerem isto, os juristas da linguagem da tática do direito vão triturá-los. Deltan Dallagnol foi o primeiro a ser triturado. E, infelizmente, não tem volta. Deltan não conseguirá reverter a sua cassação, mesmo tendo toda a razão do mundo. A juíza Ludmila Grillo foi a segunda e talvez, inconscientemente, já tenha percebido tudo isso, a ponto de sequer tentar recorrer da sua punição administrativa.

Juristas do velho paradigma, com todo o respeito, devem parar de invocar a legalidade e tentar interpretar a Constituição com base na linguagem da ciência do direito. Esqueçam os manuais de direito constitucional. Eles não vão funcionar. Aqueles juristas que se utilizam da linguagem da tática do direito estão no poder e agora são soberanos. E soberano, já dizia Carl Schmitt, “é aquele que decide no Estado de exceção”.

Em suma, não existe mais normalidade constitucional. Não existe mais legalidade. Tecnicamente, ou melhor, taticamente, estamos em “Estado de exceção”. Aliás, sem querer dar spoiler, esqueçam também Carl Schmitt, agora é Nietzsche.

Rafael Augusto S. Domingues é advogado e doutor em Direito do Estado.

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